Os porralokinhas *

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Com minha prima Thainá, de 11 anos, fui ver Os porralokinhas.

Eu ainda estava contaminado pelo espírito natalino. Minha prima também. Aparentemente, só nós dois estávamos contaminados pelo espírito natalino, já que a sala de cinema estava completamente vazia. Foi aí quando descobrimos que nem as crianças em período de férias querem saber de filme brasileiro.

Minha prima estava tão animada com a boa ação do “tio” (é assim que ela me chama) que soltou urros de animação logo nos créditos iniciais. Eu reparei que a pipoca estava salgada demais. Os urros da menina fizeram eco, multiplicados pela sala completamente vazia. Os créditos iniciais são tosquíssimos. Pensei que, naquele momento, eu poderia estar fazendo algo mais produtivo. Poderia estar comendo omelete para ganhar proteínas e aumentar minha massa muscular.

A história de Os porralokinhas é uma porralokice: um grupinho de crianças de classe média alta se mete numa floresta, encontra o Tio Maneco, enfrenta um homem-jacaré e é salvo da natureza selvagem por uma trambiqueira de Copacabana. Pronto, estraguei a surpresa.

Minha prima não ligou para os efeitos especiais meio bizarros nem para uma cena em que dois garotos quase caem de uma ribanceira, mas são capturados por uma bola verde voadora que parece saída de um clipe antigo do Black Sabbath. Minha prima delirava de emoção. Eu imaginava: como aquela cena estaria descrita no roteiro? “E então os garotos são salvos por uma bola verde gigante voadora, e fazem gracinhas dentro da bola”.

Os pirralhos aventureiros falam tanto a palavra “caraca” que eu já estava me arrepiando todo, aí vi um índio com sotaque carioca e desisti de entender. Minha prima explicou que o desafio dos meninos era entrar no olho de um jacaré de pedra e resgatar um sapo de cerâmica que hipnotiza as pessoas. Ã-hã. Acordei do sono profundo numa cena em que as crianças flutuam em bóias coloridas numa espécie de mangue daqueles que a gente encontra no caminho para Pedra de Guaratiba (N.E.: Tiago Superoito, carioca, está contaminado pelo espírito natalino, e por isso escreve como um débil mental).

O Tio Maneco já está bem velhinho, e entra e sai da trama alegremente como um daqueles coadjuvantes insignificantes de Robert Altman. Há vezes em que ele aparece bem mais novo, em imagens rabiscadas meio Grindhouse de um filme antigo cujo nome não sei e estou com preguiça de procurar no Google.

Uma cambada de crianças pula de pára-quedas – minha prima, nesse trecho aí, gritou ‘caraca!’ – e, logo depois, muitas delas desaparecem da história. “O que aconteceu com as outras crianças?”, minha prima perguntou. “Pode ser que tenham morrido”, o “tio” respondeu. “Elas vão voltar?”, a prima perguntou. “Não, provavelmente morreram.” A vida não aceita artimanhas de roteiro, e é bom aprender isso desde cedo.

Minha prima gostou do filme. Perguntei a ela qual seria a cotação para o que acabara de ver e, depois de eu ter explicado o significado da palavra cotação, respondeu três estrelas. Por mim, não levaria uma estrelinha sequer, sou adulto e não tenho coração. Ficamos na média, e agora ela me fez prometer que irei acompanhá-la de novo no cinema “ano que vem” (e eu caí nessa charada ridícula). Semana que vem, talvez eu pegue uma sessão de Bee movie ou de Encantada ou de outro enlatado qualquer.

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