Mês: maio 2008

Longe dela ***

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Entrei no cinema cheio de preconceitos e saí tomado por uma sensação de tristeza fora do comum. O longa-metragem de estréia da atriz Sarah Polley não passa sem problemas, mas não há como desprezar a forma intensa como cria uma atmosfera de melancolia ao redor de protagonistas – a mulher com Alzheimer e o marido, atordoado pela perspectiva de ter que se afastar da esposa, com quem vive por 44 anos. Ao final da sessão, demorei ainda algumas horas para conseguir me distanciar um pouco do drama desses personagens e lidar com o filme de uma forma menos passional (e sei que a culpa é mais do tema, o processo degenerativo da velhice, que do longa em si).

O mérito das interpretações é até óbvio. Tanto Julie Christie (já muito elogiada, e com justiça) quanto Gordon Pinsent encarnam o casal de apaixonados com tanta expressividade que por vezes me peguei lembrando de Erland Josephson e Liv Ullmann em Saraband, do Bergman. Os momentos mais fortes de Longe dela são aqueles que, com muita simplicidade, acompanham a rotina daquele homem com aquela mulher. Aí quase não se percebe, mas trata-se de um primeiro filme.

A estrutura fragmentada da narrativa quebra a história em saltos no tempo que lembram a estética de Atom Egoyan (produtor do filme) – mas às vezes parecem assumir função quase decorativa. O roteiro, escrito pela própria diretora, se revela um tanto imaturo na tentativa de dar verniz poético aos diálogos (algumas cenas, com lições do tamanho de um “nunca é tarde para amar”, são flores de plástico), mas ganha estatura quando traduzido em imagens. Polley é uma cineasta que dá espaço aos atores e tempo para que os personagens, fortes, sobrevivam às artimanhas do roteiro. Sem esse grau de sensibilidade – respaldado pelo elenco – este seria um mero telefilme, chantagem sentimental. Por enquanto, me parece algo mais consistente e duradouro que isso. Para este coração de manteiga aqui, um poeminha perturbador.

‘Velocifero’ Ladytron **

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O quarto álbum do Ladytron abre com uma faixa cantada em búlgaro, é co-produzido pelo tecladista dos shows do Nine Inch Nails (Alessandro Cortini) e por um novo queridinho da eletrônica francesa (Vicarious Bliss, da Ed Banger Records, casa do Justice), tem influências de Mutantes e Ennio Morricone. Como esses elementos transformam a estética do quarteto? Incrivelmente, em quase nada. Velocifero não faz muito além de sublinhar a guinada de Witching hour (2005), um trabalho mais próximo do shoegaze e do rock industrial, um pouco mais afastado do electroclash – rótulo que a banda faz questão de negar radicalmente.

Agora dá para dividir a discografia do grupo em dois momentos. O primeiro, mais sacana e doce, de 604 (de 2001) e Light and magic (2002). O segundo, a partir de Witching hour (o meu preferido), com influências mais claras de My Bloody Valentine e Stereolab, mas ainda assim sem abandonar a pista de dança. Em comparação ao anterior, Velocifero é um set mais caótico, mais aventureiro, ainda que essa falta de direção não conte muito a favor da banda (o que os Mutantes faziam com leveza e naturalidade, para eles soa como um parto). Dá para notar alguns ótimos momentos, principalmente quando eles se dedicam a mantras de rock (I’m not scared, Tomorrow e Versus são ótimas). Mas, entre um e outro, acabamos topando em faixas de impacto nulo como Deep blue (que parece Madonna de caso com Depeche Mode) e uma outra canção em búlgaro que não diverte, não perturba, e parece não fazer muito sentido.

Ainda Hold Steady

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Eu não havia pescado a referência, mas Slapped actress, a maravilhosa faixa que encerra o álbum novo do Hold Steady, parece ter sido inspirada em Opening night, do John Cassavetes. O que só faz complicar ainda mais a história toda.

Na Uncut, saiu um belo texto sobre o disco.

‘Lie down in the light’ Bonnie ‘Prince’ Billy ***

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Dizem que este é o melhor de Will Oldham desde o excelente I see a darkness (1999), e ainda não sei se concordo ou discordo. Seria bonito concordar, já que isso renderia um parágrafo bem chamativo, que provavelmente atiçaria a curiosidade de três ou quatro visitantes deste blog. Mas a discografia deste homem da caverna é tão consistente que ainda me parece absurdo subestimar álbuns emocionantes como Ease down the road (2001) ou até o ártico The letting go (2006), que muitos fãs se apressaram a dispensar.

O disco novo de Oldham me deixa bobo, antes e acima de tudo, por prolongar tão dignamente uma bela trajetória. Difícil identificar um auge na carreira de Oldham – parece até que, o tempo todo, ele consegue se manter lá em cima.

Sabe disso quem o acompanha. Não são muitos, admito. A melhor forma de se aproximar do personagem Bonnie “Prince” Billy é o filme Antiga alegria, de Kelly Reichardt. Ele ainda é o homem calvo da barba loura e espessa, que caminha sozinho no calçamento de cidadezinhas tão limpas quanto entediantes. Mas, em Lie down in the light, ele não se incomoda tanto quanto antes com dilemas existenciais, com o vazio do mundo. Ainda sofre com amores fracassados (repare a briga de casal de You want that picture, narrada com ranço amargo à Dylan), mas tenta encontrar consolo na companhia de amigos (A letra de Easy does it é quase ensolarada), da família (You remind me of something é uma das canções mais simples e bonitas que já escreveu).

Há quem identifique nesse discurso menos sombrio uma nova fase para Oldham, mas não vejo exatamente isso. Seria simplificar a história toda. O álbum está longe da leveza e a serenidade de um Nashville skyline (de Dylan), e não quer soar definitivo como um After the gold rush (de Young). Não provoca o susto nem desperta as revelações de I see a darkness, apesar do esmero da produção de Mark Nevers, do Lambchop. Em comparação a The letting go, pode soar até como um retrocesso, já que o compositor deixa a aventura européia para retornar a um playground bem particular, interiorano, tingido de country e folk. Há duas, três obras-primas que nos levam às lágrimas logo nos primeiros acordes – mas é o que costumamos encontrar em discos de Bonnie “Prince” Billy, não é?

Eis um anti-ídolo que nos mimou e continua nos mimando demais.

Ranking anos 2000

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Em breve, a Liga dos blogues cinematográficos vai divulgar o ranking dos melhores filmes produzidos desde o ano 2000. Eu, que participo da confraria e tenho compulsão por listas (apesar das tentativas de não me deixar dominar pelo vício), estou na brincadeira. O ansioso aqui formatou o top 20 de uma tacada só, sem esquentar muito a cabeça para detalhes e pronto para lamentar as ausências mais sentidas (os Tenenbauns e o melhor filme de Steven Spielberg são apenas dois exemplos). Sem mais, aí vai o resultado desse balanço sentimental.

1. Elefante (2003), Gus Van Sant
2. Cidade dos sonhos (2001), David Lynch
3. As coisas simples da vida (2000), Edward Yang
4. Kill Bill, vol. 1 (2003), Quentin Tarantino
5. Plataforma (2000), Jia Zhang-ke
6. A última noite (2002), Spike Lee
7. Um filme falado (2003), Manoel de Oliveira
8. Antes do pôr-do-sol (2004), Richard Linklater
9. Não estou lá (2007), Todd Haynes
10. Amantes constantes (2005), Philippe Garrel
11. Império dos sonhos (2006), David Lynch
12. O quarto do filho (2001), Nanni Moretti
13. Amor à flor da pele (2000), Wong Kar-wai
14. A viagem de Chihiro (2001), Hayao Miyazaki
15. Sobre meninos e lobos (2003), Clint Eastwood
16. A esquiva (2003), Abdellatif Kechiche
17. Marcas da violência (2005), David Cronenberg
18. Dez (2002), Abbas Kiarostami
19. Onde os fracos não têm vez (2007), Joel e Ethan Coen
20. Lady Chatterley (2006), Pascale Ferran

Conceição – Autor bom é autor morto **

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Demorou uma eternidade e alguns dias, mas o filme nacional querido por nove entre dez blogs de cinema do Brasil finalmente estréia esta semana em Brasília. Para mim, fica a sensação de ter chegado por último na festa (o bolo foi cortado e os papéis vagabundos de docinhos estão espalhados por todo canto). O que posso dizer sobre Conceição?

Não vou ficar rasgando elogios, já que outros fizeram esse trabalho com muita elegância. Nem vou pegar no pé, já que os bonequinhos implacáveis estão aí para isso. Na verdade, tudo o que tenho a oferecer a esse debate (que já esfriou faz tempo, parece) é a impressão torta e sincera. Um textinho despretensioso e boboca, daqueles que você encontra em caixas de comentários de blog.

O problema todo, admito, é que eu já gostava muito do filme antes de tê-lo visto pela primeira vez. Isso acontece. Adoro o novo da Lucrécia Martel, por exemplo. O do Pablo Trapero acho muito bom, com algumas pequenas ressalvas. Só que o excesso de expectativa, nesse caso, me atrapalhou bastante. Meu caso com Conceição não é como antes. Não tem como ser. Na tela, este filme é só um filme. Não é a reencarnação universitária e hilariante do cinema de Rogério Sganzerla (mas está longe, muito longe das provocações autoritárias de um Sérgio Bianchi). É um primeiro filme. Uma experiência. Um surto criativo. Um pandemônio. Um ovo fritando. Quase (no bom sentido) uma gag. É esse transe de infinitas intenções, aliás, o que mais me agrada aqui. O filme se deixa levar pelo furacão que ele próprio desperta.

Mas sabe aqueles amores à distância, difíceis, tortuosos? Sabe quando você começa a escrever longas cartas para a pessoa que ama e, no primeiro encontro, se decepciona com a risada desengonçada, o tique inconveniente, a dificuldade de iniciar um diálogo banal? Conceição me deixou um pouco tímido, sem muita reação.

Não me deixou perturbado nem chocado nem nada. Me incomodou, já que os cinco cineastas parecem ter respostas enfáticas para todas as minhas irritações em relação ao filme. As sequências de inspiração trash são às vezes tão óbvias que nem chegam a provocar sorrisos? Era essa a idéia! As brincadeiras com citações cinematográficas são um tanto quanto exibicionistas? Era essa a idéia! Os diversos segmentos espalhados pela narrativa parecem um amontoado de curtas-metragens que não deram certo? Era essa a idéia!

Então tá. Não estou mais apaixonado por Conceição. Mas gosto muito dela. Gosto dela. Da idéia.

Na Paisá

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Esses dois sujeitos enfezados só vão ficar felizes se vocês lerem a atualização de música da Paisá, com comentários do Tiagão aqui para os álbuns do Gnarls Barkley (saiu um texto grandinho e bobinho, com um parágrafo dedicado ao disco anterior deles, St. Elsewhere) e da Santogold (quando escrevi esse, eu estava com sono e febre – suponho que não tenha saído algo muito decente). Recomendo a resenha do Filipe Furtado para The Virginia EP, do The National, que ainda não ganhou alguns parágrafos neste blog fantasmagórico por pura falta de tempo.

Dog day afternoon

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Depois de um dia infernal, dor de cabeça martelando insistentemente, quase 40 graus de febre, mau humor diabólico, birras de menino de quarta série, impulsos auto-destrutivos e impaciência, impaciência, impaciência para lidar com os menores problemas, chego em casa e minha mãe:

“Tiago, tem mel com própolis pra você”

Mães. Não entendem nada. Mas não têm preço.

‘Stay positive’ The Hold Steady ****

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Entenda o título deste belo, belo álbum como uma grande ironia.

É que, aqui, nada vai bem. Boys and girls in America (o outro disco quatro-estrelas do Hold Steady, quem não ouviu é mulher do padre) era sobre a juventude despedaçada, que bebe muito e dorme tarde. Este Stay positive narra o capítulo seguinte: a festa termina, os remédios não fazem mais efeito, a idade começa a pesar, os sonhos de adolescente evaporam e torna-se inevitável conviver com um batalhão de fantasmas. É um álbum difuso, menos controlado que o anterior e, por isso, menos convidativo. Até a galeria de personagens que costumavam habitar as canções de Craig Finn agora se escondem nas sombras, se perdem no matagal, não ousam revelar nomes.

Nesse contexto, a frase “stay positive” não deve ser interpretada como grito eufórico de guerra ou como filosofia reggae-power – é lema de desesperados, slogan para encontros de ex-dependentes químicos e conselho para gente em perigo (“Meus amigos que não morreram estão quase lá”, avisa a faixa de abertura, também ironicamente intitulada Constructive summer). O quarto trabalho do Hold Steady joga com opostos: as melodias às vezes se inspiram até em power pop (Navy sheets, aliás, poderia estar num álbum do Weezer ou do Fountains of Wayne) e os arranjos se adaptam alegremente a instrumentos pouco convencionais (em One for the cutters, há até cravo, à Joanna Newsom). Mas esse rock setentista e festivo embala tramas duras, de desilusão – não há mais leveza neste retrato da vida interiorana, de rotinas sem-futuro.

É por essas e outras que o Hold Steady continua uma banda de versos, de poesia. As letras são quase tudo. Só depois nos preocuparemos com melodias e ao trabalho de produção (este álbum tenta alguns caminhos novos para o quinteto, mas ainda soa no máximo como um disco do Bruce Springsteen). Não teria como ser diferente. Finn é um dos melhores letristas desta geração (talvez o melhor), com talento gigantesco para desenhar climas e descrever personagens. Em Lord I’m discouraged, ele assume com convicção o papel do homem que não tem mais forças para cuidar da mulher que ama (e escrever com sutileza sobre abuso de drogas é uma das tarefas mais difíceis no rock). Já One for the cutters é praticamente um conto policial dirigido por Gus Van Sant, com mortos na floresta e interrogatório na delegacia. Algo, no mínimo, raro de se ouvir.

Se não tem hinos perfeitos como Stuck between stations, este é um álbum que faz perfeito sentido na trajetória do Hold Steady. Poderia muito bem fechar um arco narrativo, uma saga em tom menor. “Nós fazemos nossos próprios filmes”, avisa a faixa de encerramento, Slapped actress. Sobem os créditos, mas a vida continua.

Clipe: ‘Flashing lights’ Kanye West

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A outra versão, dirigida pelo Spike Jonze, era mais sangrenta e inconseqüente. Esta aqui, sob comando de Bill Pollock, funciona como um book perverso para a modelo Charlotte Carter-Allen (aliás, desculpem o surto à cafajeste, mas mó gata a mina, meu). Façam o tira-teima por conta própria e, pra variar, desprezem a existência da caixa de comentários do blog. Lacônicos, vocês.

Bananada, primeiro e segundo dias

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Ou: a festa da Mallu.

Depois de muita resistência, tola resistência, dou o braço a torcer: a menina tem carisma. Muito carisma. Impressionante carisma. De longe, o (pocket) show da Mallu Magalhães foi a atração mais concorrida das duas primeiras noites de Bananada, festival de rock independente de Goiânia. Tinha gente se esbofetando para entrar no teatro do Martim Cererê, que esgotou a lotação e ainda deixou uma galera inconsolável do lado de fora (a foto acima, infelizmente, não é do show de sábado – esqueci minha câmera digital, foi mal).

Não era matinê nem nada. Sábado de madrugada, indies a sair pelo ladrão, um exército de bandas de rock setentista, uma inclassificável mistureba (nos palcos) de punk, noise, psicodelia, o diabo a quatro e (na praça de alimentação) de yakosoba com acarajé e churrasco grego. E quem abalou a concorrência? Quem? Quem? Uma menina que, como vocês, amava Dylan e Johnny Cash.

Não seria exagero notar que o Bananada, trincheira do novíssimo rock, gravitou em torno do folk de Mallu. Chamemos de bedroom folk, já que a musa adolescente apresenta canções como quem troca idéias com amiguinhos por Skype. “Essa aqui eu fiz ontem, está muito linda”, ela disse, para delírio dos trintões da platéia. “Olha a pedofilia!”, gritou uma moça bem-humorada, ao notar a aflição dos tiozinhos. No empurra-empurra para entrar no teatro, alguém lembrou até do Rock in Rio 3. Rock in Rio 3? Nem vou fazer esse tipo de comparação (eu não estava no Rock in Rio 3), mas teve garotinha chorando, com falta de ar, presa contra a parede. Mas ninguém saiu com outras feridas além da típica dor de coração partido.

A performance de Mallu durou 30 minutos e foi, oras, fofa. O que vocês esperam de uma guria que canta como uma Joanna Newsom teen e trata o público um tom nada forçado de informalidade? Em cinco minutos, somos todos amigos dela. “Não sei isso não. Deixa eu tocar as minhas músicas, eu preparei tudo”, respondeu ao sujeito espertinho que gritou “Toca Raul”. Mais tarde, no meio de uma das canções (e sejamos sinceros: as canções, por enquanto, pouco interessam), ela fez o som de um solo de guitarra, para deixar claro que “o guitarrista não veio”. Doce, isso.

Quando ela cantou a música do comercial de celular, foi metralhada por flashes de câmeras digitais. Quando se despediu e deixou o palco, os gritos de “mais um” seguiram por uns dez minutos. Em vão. E nem é um show perfeito (longe disso, meus amigos, longe disso). Mas imaginem aí o estrago que essa menina há de provocar em cinco ou seis anos, quando aprender a compôr em português e renovar a nossa caduca MPB com um álbum barroco produzido por Van Dyke Parks e com participação especial do Vanguart?

Eu quero estar aqui pra ver.

Nos primeiros dias de Bananada, não vi outras Mallus Magalhães, mas saí bem impressionado com os shows do Jonas Sá (que tem menos de metro e meio de altura, mas entra no palco e ganha o tamanho de jogador de basquete), a psicodelia sixties do Cérebro Eletrônico, o noise from hell do Abesta (passaria como furiosa instalação de arte contemporânea) e as (con)fusões de rock e axé music dos cariocas Do Amor. Com a proposta de destacar projetos quase sempre ainda verdes, o Bananada permite algo raro em festivais brasileiros: o prazer do primeiro olhar, a chance de acompanhar os passos iniciais de artistas cheios de idéias. O público de Goiânia, generosíssimo, facilita bastante esse processo. Eu recomendo.

Palma francesa

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Poxa, fiquei feliz com a vitória de Laurent Cantet em Cannes. Dizem que é lobby da França, que não levava a Palma de Ouro há duas décadas, mas não estou aí. Obviamente não vi o filme, mas ao contrário de quem se surpreendeu com a vitória, gosto muito de dois longas do diretor (A agenda e Recursos humanos, nem tanto de Em direção ao sul) e posso dizer que confiava nele desde o início. Agora é esperar o lançamento de Entre paredes aqui no Brasil – alguém sabe se o filme já foi comprado?

A brasileira Sandra Corveloni venceu o prêmio de atriz por Linha de passe. Veja todos os vencedores aqui.

Bananada

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Viajo daqui a pouquinho para o Bananada, um festival de Goiânia que dá destaque ao novíssimo rock independente brasileiro. Os shows seguem até domingo, mas devo ver apenas os de hoje à noite e amanhã (com gente bacana, bonita e cheirosa como Cérebro Eletrônico, Sweet Fanny Adams e Mallu Magalhães). Não sei se vou conseguir atualizar o blog de lá e mandar notícias. Tentarei. Quando eu retornar, escrevo alguns parágrafos sobre o que vi, ok? Bom fim de semana pra vocês.

Indiana Jones e o reino da caveira de cristal **

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O melhor Indiana desde Os caçadores da arca perdida? Ahn. Não.

Eu me esforcei, pessoal. Garanto que me esforcei. Para cair no choro com a trilha de John Williams, para lembrar dos bailes de carnaval da minha infância (a fantasia com chapéu-e-chicotinho era uma tendência), para retornar a uma era de arrasa-quarteirões ingênuos e aventureiros, para comprar o marketing da Universal Pictures e sentir muita saudade. Até fiz contatos imediatos com minha abobada criança interior. Ainda assim, para este espectador ranzinza aqui, o novo Indiana Jones deixou a impressão de ter se esforçado sobrenaturalmente para fechar um combo que inclui uma pipoca média sem manteiga, um copo de coca-cola quente, o espírito pulp desvairado de O templo da perdição, as lições de paternidade de A última cruzada e um punhado de guloseimas recicladas dos primeiros filmes de Steven Spielberg e George Lucas. Muito barulho por muito barulho.

E escrevo isso sem recorrer ao discurso de quem vê neste filme um repeteco automático das fórmulas dos longas anteriores. É e não é. Steven Spielberg tem 60 anos de idade. Harrison Ford, 65. George Lucas, 64. É inevitável que O reino da caveira de cristal acabe por refletir os quase 30 anos que se passaram desde Os caçadores da arca perdida. O que há de melhor nesta seqüência é como Spielberg, Ford e Lucas remetem ao passado do cinema de entretenimento com a consciência de que é possível brincar com a sensação de nostalgia que paira entre os fãs da série e os donos da franquia. Não é um filme ambientado em uma antiga Hollywood – é, até certo ponto, um filme sobre uma antiga Hollywood.

É com muito gosto e ao pé da letra, aliás, que o trio assume essa aparência “à moda antiga” (e é necessário falar em aparências num filme que é todo, todo assumidamente artificial). Numa ótima primeira metade, até a fotografia de Janusz Kaminski revela um punhado de referências a cada quadro. É como se Spielberg compilasse tresloucadamente símbolos da cultura pop do final dos anos 1950, época em que a trama se desenrola. Um belo exercício formal (e aí entra a caricatura de Cate Blanchett, que se enquadra muito bem a esse projeto). Até esse ponto, o filme chega a dialogar com Planeta terror, de Robert Rodriguez – só faltava Lucas usar efeitos visuais para simular imagens de negativos riscados. Toda a seqüência da explosão nuclear, que começa com Indiana Jones desnorteado numa cidade de bonecos de plástico, vale por cinco Guerra dos mundos.

Acontece que, exatamente na metade da trama, exatamente quando os personagens tomam um avião para a América do Sul, essa disposição auto-referencial começa a cansar Spielberg e o público. Perde o ânimo. São gritantes as diferenças entre a primeira parte do longa e a segunda, quando O reino da caveira de cristal tenta se alinhar ao tom aos longas anteriores da série e acaba soando como um episódio de empoeirada série de tevê. É aí que o filme exige do público um tipo de cumplicidade que só os fãs mais perserverantes de Spielberg serão capazes de oferecer. Serão eles, e apenas eles, que descontarão a redundante ode às relações familiares que o cineasta já transformou em marca, em tique, em cartão de visitas. E também serão eles que passarão por cima das desengonçadas cenas de ação na selva (que chegam a lembrar Roland Emmerich) e de um desfecho que parece até piada interna, viagem em torno do umbigo.

Para mim, que não sou fã de Spielberg, foi como assistir à lenta demolição de um lindo prédio empoeirado. Ou de uma monumental atração retrô da Disney, como preferir.

‘Smilers’ Aimee Mann *

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O sujeito que senta ao meu lado no trabalho viu Magnólia, gostou muito do filme, mas não lembra das canções de Aimee Mann. “Como assim, rapaz? As canções de Aimee Mann são o filme“, eu retruquei. Depois de ouvir umas tantas vezes este Smilers, entendi que o lapso de memória do meu colega é absolutamente digno: há quem mereça ficar nas nossas lembranças (Paul Thomas Anderson) e há quem não mereça (ahn, bem, hmm). O cérebro é uma máquina maravilhosa, mas não conheço quem dê conta de guardar tudo.

Infelizmente (e digo isso com dor no peito), Aimee Mann já não merece tanta atenção. Isso desde o momento em que abandonou a parceria com o produtor Jon Brion e decidiu escalar meros operários para ornamentar canções que precisam encarecidamente de interlocutores criativos que saibam cuidar delas com muito carinho. Sem um bom editor, a cartilha de Mann cai facilmente em redundâncias. Este Smilers soa como mais um álbum redundante dentro de uma carreira redundante. Triste escrever isso sobre uma compositora talentosa como poucas da geração 90.

Desde Lost in space (2002), os discos da cantora perderam em consistência e colorido. São polaróides desfocadas. O anterior, The forgotten arm (2005), ainda tinha algum charme (mas fracassou feio na tentativa de amarrar uma narrativa com início-meio-fim). Para os novatos, Smilers não incomodará, e possivelmente se sairá bem com a crítica: é mais um álbum inofensivo e agradável levado na valsa por uma musa atormentada. Para quem acompanha a carreira de Mann, guarda nas entrelinhas um grito de socorro. Ela precisa de ajuda, e aqui não falo de crises existenciais ou amorosas.

O desabafo poético que inspirava comoção nos personagens de Magnólia retorna em forma de chavão. São muitos. “Você me ama como uma nota de um dólar”, comenta a personagem de Phoenix. “Tudo o que faço é errado”, rebate a de Freeway. “Eu pensava que as coisas seriam diferentes de alguma forma”, lamenta a trintona de 31 today. “No dia em que você foi embora e me chamou de vaca, eu te chamei de egoísta”, confessa a vítima de Medicine wheel, com perfil para sentar no sofá de Oprah Winfrey.

Mann continua a contar essas histórias de gente à beira do abismo. Às vezes, ainda nos machuca. No caso, o método masoquista da compositora só rende dois momentos memoráveis: a baladona It’s over, sobre o difícil processo de se acostumar a uma separação, e a despretensiosa Balantines. Mas a falta de um bom produtor só faz ressaltar a magreza das canções. Torço para que, com urgência, Mann trate essa arte com algumas sessões de terapia. Jon Brion tem espaço na agenda?