[roberto bolaño]
Minha rotina consistia em levantar cedo, tomar o café da manhã com minha mãe, meu pai e meu irmão, fingir que ia para o colégio e pegar um ônibus que me deixava no centro, onde dedicava a primeira parte da manhã aos livros e a passear e a segunda a ir ao cinema e, de uma maneira menos explícita, ao sexo.
Os livros, costumava comprar na Librería de Cristal e na Librería del Sótano. Se tinha pouco dinheiro, na primeira, onde sempre havia uma mesa de saldos, se tinha dinheiro bastante, na última, que era a que tinha novidades. Se não tinha dinheiro, como acontecia com frequência, costumava roubá-los indistintamente numa ou noutra. Fosse como fosse, no entanto, minha passagem pela Librería de Cristal e pela Librería del Sótano era obrigatória. Às vezes chegava antes do comércio abrir e então o que fazia era procurar um ambulante, comprar um sanduíche de presunto e um suco de manga e esperar. Às vezes sentava num banco da Alameda, um que fica escondido no meio da vegetação, e escrevia. Isso tudo durava aproximadamente até as dez da manhã, hora em que começavam em alguns cinemas do centro as primeiras sessões matinais. Procurava filmes europeus, mas em algumas manhãs de inspiração não discriminava o novo cinema erótico mexicano ou o novo cinema de terror mexicano, o que no caso era a mesma coisa.
[Trecho do conto O verme, em Chamadas Telefônicas, de Roberto Bolaño]