40. Hissing fauna, are you the destroyer? – Of Montreal (2007)
O oitavo álbum do Of Montreal soa como uma anomalia — para a banda, no underground desde 1996, e para o indie rock americano da geração 2000, que encontrou um ídolo ambíguo onde menos esperava. Mas, acima de tudo, o disco conta uma história extraordinária: depois de uma década inteira de psicodelia, Kevin Barnes chegou ao topo exatamente num dos momentos mais trágicos da vida. Transformar os dramas pessoais num cabaré multicolorido e afetado é, sim, um tipo de arte.
39. Fever to tell – Yeah Yeah Yeahs (2003)
A estreia do Yeah Yeah Yeahs pode ter decepcionado quem esperava a crueza do primeiro EP — ainda, na onda pós-punk do início da década, poucos outros discos soaram tão ásperos —, mas já deixava clara a inclinação pop do trio, que (ironicamente) acabou fazendo sucesso com a faixa mais delicada do álbum (Maps). Apesar das mutações que viriam a seguir, ainda soa como a síntese das ambições da banda: o diabo na carne de Karen O.
38. Twin cinema – The New Pornographers (2005)
Culpem o Canadá: o “novo rock” viu uma interessantíssima queda de braço entre Nova York e Vancouver, sem vencedores. A liga dos super-heróis canadense atendeu por New Pornographers, uma superbanda de power pop liderada por Carl Newman e fortalecida pelos golpes de Neko Case e Dan Bejar. Qualquer disco vale a pena, mas em Twin cinema a coletividade fala mais alto. E são tantas as pérolas que fica difícil escolher uma (The bleeding heart show?).
37. The Marshall Mathers LP – Eminem (2000)
Por alguns minutos, esqueça o Eminem entediado e oportunista que você conhece desde meados de 2005. No início da década, o rapper soava como um Andy Kaufman do hip hop (ou um Sacha Baron Cohen pré-Brüno). Depois de criar um curto-circuito entre a própria biografia e a ficção mais doentia (nessa brincadeira, acbaou processado pela própria mãe). O tempo maltratou Eminem, mas The Marshall Mathers LP fica: é um slasher movie narrado em primeira pessoa, hilariante e perturbador.
36. The woods – Sleater-Kinney (2005)
Um dos discos subestimados da década merece ser redescoberto o quanto antes: o canto de cisne do Sleater-Kinney é um cataclisma — e, de bônus, contém um dos grandes trabalhos de Dave Fridmann na produção (antes de diluir os próprios truques no disquinho superestimado do MGMT). O trio trata as influências de rock clássico com a falta de cerimônias com que encarava o punk rock. O resultado é tão furioso quanto enxuto: nenhum ruído é usado em vão — e haja ruído.
35. And then nothing turned itself inside-out – Yo La Tengo (2000)
Os discos mais acessíveis do Yo La Tengo são os mais diversificados, que soam como coletâneas de rock psicodélico do final dos anos 60. Não é o caso desta pequena e silenciosa obra-prima. que parece ter sido gravada à meia-luz numa noite de inverno. Uma coleção de baladas sobre amor e casamento, trata-se de um dos álbuns mais maduros e delicados gravados por uma banda de indie rock. Provavelmente soou como uma surpresa até para o próprio trio, que não fez nada igual depois.
34. Nixon – Lambchop (2000)
Quem tratava o Lambchop como uma banda de country alternativo foi obrigado a rever os conceitos depois de ouvir este Nixon, um álbum de soul music made in Nashville. Com arranjos cuidadosos de cordas e melodias etéreas que remetem a Van Dyke Parks, a banda cria sinfonias que revelam novos detalhes a cada audição. O clímax vem precocemente, com o coro gospel de Up with people — mas a maior revelação do disco é a voz de Kurt Wagner — o homem em queda.
33. Give up – The Postal Service (2003)
O único álbum do Postal Service é um acidente brilhante: Ben Gibbard (Death Cab for Cutie) e Jimmy Tamborello (Dntel) trocaram pedaços de canções pelo correio (daí o nome do projeto) e, quase sem querer, criaram um modelo para toda uma nova geração do lo-fi americano. Em tese, parece bobagem (sussurros confessionais sob eletrônica sutil), mas a simplicidade dos arranjos e o clima de intimidade sugerido pelas canções o transformam num disco singular (e um que eu levaria para uma ilha deserta).
32. Up the bracket – The Libertines (2002)
Preto no branco: este é o álbum britânico mais influente da década. A estreia do Libertines inspirou dezenas de bandas de garage rock, foi usada pela imprensa inglesa como uma espécie de termômetro para novidades e (apesar das semelhanças com os primeiros singles do Strokes, muito notadas à época do lançamento) vale como lembrança de que a banda de Londres já soou verdadeiramente como um quarteto. Dos grandes.
31. Silent shout – The Knife (2006)
Há arrepios no terceiro álbum do Portishead, mas o trem-fantasma mais eficiente da década é este “disco de horror” da dupla sueca The Knife. Com vocais distorcidos que se aproximam do grotesco, Karin Drejer Andersson (Fever Ray) e Olof Dreijer fizeram um disco que explora ambiente sombrios e surrealistas como uma versão dark para Alice no país das maravilhas. Ame-o ou deixe-o, mas é complicado negar a sensação de estranheza que ele provoca.
Aos que até agora não entenderam que o Yeah Yeah Yeahs é uma banda pop, It’s blitz! encerrará o assunto de uma vez por todas. O álbum serve como uma explicação didática, em amarelo fosforescente e gel cor-de-rosa, de que Karen O sempre esteve mais para Debbie Harry que para alguma das meninas do Sleater-Kinney.
O que nunca me pareceu um problema – até agora. Em Show your bones (2006), o trio saiu do casulo indie-punk para se remodelar como uma banda de arena, colorida e vibrante, numa reviravolta auto-irônica que me lembrou a fase Celebrity skin do Hole. Uma jogada que decepcionou muita gente, mas que me pareceu uma forma digna de escapar de alguns clichês que dominavam o rock nova-iorquino do início da década.
It’s blitz! acrescenta neon e sintetizadores ao figurino do disco anterior. Soa como uma versão remixada de canções que já conhecíamos. Pior que isso: um passo para trás. Já que o grupo se contenta com uma pegada indie-dance que nos leva de volta ao electroclash de Miss Kittin, a House of jealous lovers, do Rapture e ao primeiro álbum do LCD Soundsystem. Ou seja: a 2002, ou um pouco antes disso.
Ao contrário do Franz Ferdinand, o Yeah Yeah Yeahs veste o modelito dançante dos pés à cabeça. Pelo menos não fugiram da raia. O álbum inteiro, com produção corretinha de Dave Sitek (TV on the Radio), tem climas de dance musica setentista, ora saltitante (Heads will roll e Zero, os dois melhores momentos), ora um tanto dark (Skeletons).
Joy Division é uma das influências declaradas. Donna Summer é outra. Ambas são tratadas de forma rasa, com doses moderadas de angústia ou catarse, na linha inofensiva do remix que o The Killers gravou para Shadowplay. E as letras são qualquer nota (e tem gente interpretando Zero como uma canção sobre soldados em guerra, mas também pode ser sobre qualquer outra coisa).
Mais que nunca, o Yeah Yeah Yeahs soa como uma banda fashion, de grife – daquelas que se adaptam confortavelmente às cores da estação. Trocar guitarras por sintetizadores (pobre Nick Zinner) pode ser uma boa sacada. Convidar Tunde Adebimpe para fazer backing vocals também. No caso, porém, faltou timing. Tanto que, aposto dez reais, o álbum será comparado ao pop camaleônico (e unidimensional) do MGMT.
Em Show your bones, o trio brincou com os artifícios do pop. It’s blitz! é o próprio artifício. Uma bala de festim, uma decepção.
Terceiro álbum do Yeah Yeah Yeahs. 10 faixas, com produção de Dave Sitek e Nick Launay. Interscope Records. 5/10