Wavves

Mixtapes! | Duas vezes julho

Postado em Atualizado em

A mixtape de julho (e não encontro definição melhor) é uma mãe.

Sabe quando você vai num daqueles bares bacanas que oferecem dois drinks ao preço de um? Sabe quando você pede o hambúrguer e ganha um pacote de fritas? É mais ou menos isso.

Minto: é muito melhor do que isso. Você não paga absolutamente nada e ainda leva uma mixtape totalmente grátis. É uma transação incrível ou não é?

Daí vocês me perguntam: por que o surto de generosidade, ó bartender? Sinceramente: não foi intencional. Quando comecei a juntar as músicas da mixtape, acabei com um combo de 30 faixas. Tudo isso. Uma fartura. Daí me vi diante de duas opções: descartar a maior parte das faixas, pelo bem da coesão; ou montar duas mixtapes, uma ligeiramente diferente da outra.

Minha primeira decisão foi dar uma de Edward Mãos-de-Tesoura e cortar, cortar, cortar. Terminei com um disquinho de 12 faixas, esquizofrênico que só ele. Depois, já quase de madrugada, deitei (literalmente) a cabeça no travesseiro e decidi acolher todas as canções rejeitadas, deletadas, injustamente execradas. Terminei com duas mixtapes, 22 faixas, e assunto encerrado.

Eu sei, eu sei, eu sei que dá uma preguiiiiça danada fazer o download de duuuuas mixtaaaapes e depois ainda ter que escutaaaaar a baboseira toda (só de escrever essa frase, bateu um cansaaaaço). Nos poupe, Tiago! Mas (aí vai o aspecto gentil da história) você não precisa adquirir as duas mixtapes. Elas são bem grandinhas e sabem andar com as próprias pernas. Na verdade, elas têm muito pouco a ver uma com a outra. Não são irmãs nem nada. Talvez primas, mas nunca irmãs.

O esquema funciona assim:

A primeira parte da mixtape é (como dizer?) um filme da Sofia Coppola. Delicadeza com algo de malícia. Dream pop, power pop, odes a Brian Wilson, cantantes melancólicos, muita saudade e tristeza e doçura. É a mixtape mais tocante que você ouvirá na sua vida, eu garanto. Tem Department of Eagles, tem Foals, tem Avi Buffalo, tem Best Coast, tem Mystery Jets, tem Here We Go Magic (olha aí, Felipe!) e tem até Johnny Cash. Uma lindeza. 

Esta primeira parte é uma continuação da mixtape de abril, sentimental e siderada. E é dedicada a duas pessoas muito bacanas que costumam baixar as mixtapes e comentar com certa frequência aqui no blog: o Daniel, do Power Pop Station, e o Pedro Primo, do Ouvido Cego. Se vocês curtirem, ficarei bastante satisfeito.

A segunda parte da mixtape é (como dizer?) um filme do Robert Rodriguez. Com efeitos especiais toscos, dublês, mocinhas estridentes, passagens absurdas, muita emoção e sedução. É como que dividido em duas partes: na primeira, um balancê infernal. Na segunda, guitarras pegando fogo. Tem M.I.A., tem Gaslight Anthem, tem a nova do Kanye West, tem Big Boi, tem Wavves e fecha com Arcade Fire – que, apesar de ter entrado na mixtape do mês passado, assina o disco que mais gostei de ouvir neste mês: The suburbs. Por isso eles aparecem na foto lá em cima.

Esta primeira parte é uma continuação da mixtape de maio: tique nervoso e adrenalina. E é dedicada a todo mundo que usa headphones para matar o tédio provocado por exercícios físicos repetitivos.

Assim funciona. Faça o que bem entender, ok? Ouça apenas a primeira, ouça apenas a segunda, ouça as duas ou não ouça nenhuma. Não sou seu pai e não vou monitorar seu IP. Fique à vontade (e, como sempre, a lista das músicas está logo ali na caixa de comentários).

Só peço um favor: se aqueles que ouviram a(s) mixtape(s) fizerem um singelo comentário, vai ser joia. “Sua gentileza levar-lhe-a ao sucesso”, li agorinha mesmo numa mensagem que encontrei dentro de um biscoito chinês. Sigam o conselho e sejam felizes.

Faça o download da primeira parte da mixtape aqui ou aqui.

E (força, rapaz!) faça o download da segunda parte aqui ou aqui.

King of the beach | Wavves

Postado em Atualizado em

Até aqui, os discos do Wavves eram a mais perfeita tradução de “bedroom rock”: gravados na casa dos pais, com parcos recursos, no esquema faço-por-minha-conta, quase toscos (mas adoráveis), às vezes autoirônicos, sem o menor desejo de abraçar o mundo pop com as pernas.

O novo, King of the beach, faz por merecer um rótulo diferente. “Backyard rock”, talvez. Rock de quintal.

Outro dia, escrevi que a geração 2000 do indie rock me parecia mais empenhada em gravar discos como Bleach (miniaturas poderosas, de nicho) do que em arriscar um Nevermind (a aventura pop, sem perder a bravura). Aí me chega Nathan Williams, o homem-Wavves, com esta: “O próximo disco será o meu Nevermind.”

Então tá.

Outro sinal dos tempos: o aviso de Nathan foi imediatamente tomado como uma espécie de gozação. E, de certa forma, é isso mesmo. Arcade Fire, The Shins, Interpol e tantas outras chegaram para provar que, hoje em dia, ninguém precisa fazer pacto com o “império do mal” para ser ouvido por muita gente.

Daí que a comparação só faz sentido esteticamente: talvez a intenção de Nathan tenha sido dizer que King of the beach é um álbum que, a exemplo de Nevermind, absorve alguns procedimentos típicos do pop, tanto em termos de produção (mais polida, direta) quanto de composição (mais imediata, ganchuda, melódica).

Um plano, aliás, muito parecido com os de New wave, do Against Me, e de Watch me fall, de Jay Reatard.

E não pode ser coincidência: dois músicos da banda de Jay Reatard (morto no início do ano) são os responsáveis por inflar (no bom sentido) o balão sonoro de Nathan. Stephen Pope e Billy Hayes não só arredondam o skate-punk do Wavves como escrevem três das melhores faixas do disco: Convertible baloon, Baby say goodbye (nuggets psicodélicos de Billy, e as minhas preferidas) e Linus spacehead (Stephen).

Enquanto isso, o produtor Dennis Herring, de Good news for people who love bad news (Modest Mouse), faz o resto do trabalho.

Sem o trio, King of the beach possivelmente não teria provocado tanta surpresa. Nathan, ainda que tenha passado por um período de complicadas provações (a turnê do disco anterior foi interrompida diversas vezes), continua o mesmo discípulo de Kurt Cobain: autodepreciativo, agoniado e demasiado humano, ele se define um idiota — e não apenas na canção que se chama Idiot.

O disco é um sucessor até vibrante de Watch me fall. Reatard ficaria orgulhoso. As canções são organizadas de forma a provocar impacto à primeira audição (o disco abre com um nocaute, e depois vai se arrastando gloriosamente) e, espertinho, mandar acenos para os fãs de Animal Collective (Mickey Mouse, por exemplo, é quase um remix de Panda Bear).

Metido nesse furacão, Nathan renasce como um rockstar improvável, talvez vulnerável e cínico demais para defender as delícias do pop litorâneo. Daí que King of the beach não se deixa tostar completamente ao sol — é um disco diurno escrito por uma criatura noturna. Um sujeito que vai à praia usando bermuda, empapado de protetor solar e acompanhado de um livro de 500 páginas, para “matar o tédio”.

O que me impressiona é que o Wavves convence nos trechos mais bombásticos: há canções no disco, como Super Soaker e Take on the world, que soam confiantes, musculosas, como se Nathan tivesse lançado cinco discos espinhosos de hardcore antes de se aventurar neste resort agradável.

Mas Nevermind? Não sei. Já teve gente comparando a Dookie, não? Me parece mais plausível. Ainda assim, soa engraçado.

Terceiro disco do Wavves. 12 faixas, com produção de Dennis Herring. Lançamento Fat Possum Records. 7/10

Superoito express (8)

Postado em

japandroids

Ou: Pitchfork edition.

Passei a semana digerindo quatro disquinhos indicados pela seção Best new music, a vitrine do site. Talvez por coincidência (talvez não), eles soam como farinha do mesmo saco: poderiam ter sido embalados em cartolina e vendidos numa edição especial dedicada ao novo lo-fi da América do Norte. São produções de baixíssimo orçamento, precárias e sujinhas de propósito, mais ou menos como os primeiros do Pavement e o mais recente do No Age. Bons discos (um deles superou minhas expectativas), mas fico me perguntando: elegê-los não seria também uma estratégia usada pelo site para marcar posição à margem de uma “grande indústria fonográfica” que talvez nem assuste mais?

Aos álbuns.

Post-nothing | Japandroids | 8 | O duo canadense (formado pelo guitarrista Brian King e pelo baterista David Prowse, ambos também vocalistas) lançou esta estreia apenas em vinil e download digital. Entendo a jogada: o som da banda remete a antigos álbuns de pós-punk (os primeiros do Hüsker Dü, por exemplo) e à novíssima onda noise. Isto é: a gerações pré e pós CD. Mas o que surpreende no álbum é como ele vence essas referências de nicho e consegue se aproximar dos interesses de qualquer fã de rock. São canções para o fim da juventude, chocantes de tão sinceras, interpretadas como se fosse a última chance. “Não quero me preocupar com a morte”, filosofam, na excelente Young hearts spark fire. Simplezinho, mas há como não se identificar terrivelmente com eles?

Wavvves | Wavves | 7 | Demorei um pouco para escrever sobre um dos hypes do ano, e admito que (ops) por total desinteresse. Nas primeiras audições, não vi autenticidade nas experimentações de Nathan Williams – elas soaram como isca para fãs do Liars, do Deerhunter, ou de qualquer outra banda que intercala melodias noise com ruminações instrumentais. Aos que também se decepcionaram, um aviso: com o tempo, as coisas melhoram. A fusão de elementos de surf music e noise não é exatamente original (nem tão empolgante quanto parece), mas Nathan parece empenhado em quebrar as tradições do rock californiano – esforço que rende faixas verdadeiramente fortes (So bored) e um punhado de esboços mais ou menos intrigantes.

Songs of shame | Woods | 7 | Um dos principais nomes da Woodsist Records, que lançou álbuns do Vivian Girls e Wavves, o Woods é elogiado por expandir a cena noise com influências folk e clima neo-hippie. É um pouco de partida interessante. Mas, superada a estranheza inicial, o resultado não parece tão ousado quanto, digamos, um álbum do Blitzen Trapper (mal chega perto do que o Animal Collective, Panda Bear fizeram com o gênero). De qualquer forma, lamentos rústicos como Born to lose não nos abandonam facilmente, e podem levar às lágrimas uma cambada de fãs de Bon Iver (se é que eles existem).

Why there are mountains | Cymbals Eat Guitars | 7 | E, por último, nos resta o álbum mais ambicioso (e convencional) deste pacote: o quarteto novaiorquino faz uma viagem de classe econômica ao rock de arena do início dos anos 70, largado em estradas largas e paisagens épicas – um álbum para ser ouvido logo depois de It still moves, do My Morning Jacket, e Real emotional trash, do Stephen Malkmus. Não deixa de soar corajoso: um disco de nove faixas (uma delas se chama Indiana), 62 minutos, lançado sem gravadoras… O começo é um assombro, com And the hazy sea e Some trees, mas o álbum abre espaços amplos demais para uma banda ainda em formação. Faltou um bom montador a este belo road movie.

PS: Ontem vi o show do Oasis. Pela tevê. Não sei se vocês sabem, mas, num passado distante, madruguei numa loja de discos aqui da cidade para comprar Be here now no dia do lançamento. Vocês sabem, não sabem? Eu era fã. Daí minha frustração (que já vem de muito tempo, aliás) com uma banda que, sem saber o que fazer da própria vida, passaria a se apegar desesperadamente aos dois primeiros álbuns e gravar mediocridades em série. O show retrata perfeitamente essa falta de rumo: anos 90 no repeat. Nunca me senti tão velho.