Vá ao cinema e não me convide

2 ou 3 parágrafos | Brüno

Postado em Atualizado em

bruno

Borat não era um filme assim tão arriscado — satirizar a América dos conservadores em plena era Bush era pregar para os convertidos —, mas não lembro de ser uma comédia inerte. Tenho que rever. Em todo caso, Brüno (4/10) me pegou de surpresa: uma provocação curtinha, mas que parece interminável, de um humor agonizante, que vai se arrastando em cenas constrangedoras. Um über fiasco.

Nem vou falar no meu risadômetro (que ficou quase congelado no ponto zero), mas o projeto todo me parece um tiro pela culatra: é de uma redundância atroz. E, se você pretende escrever uma comédia supostamente anárquica e atrevida, meu amigo, anote aí — o pecado da preguiça é mortal. Antes fosse uma sátira sobre o mundinho da moda e das celebridades instantâneas. Mas nem isso. Cohen logo abandona a ideia para metralhar os vilões de sempre: os racistas, homofóbicos, hipócritas, os negros racistas, os héteros fascistas, os gays afetados (nem sobrou para os héteros jornalistas que curtem Jonas Brothers, mas me senti atingido) etc. Não me admiro que Bono, Chris Martin e Elton John tenham topado participar da brincadeira (a palavra é essa mesmo): o filme joga o tempo todo para a torcida do ator, e ainda sai por cima com pose de bem intencionado. Tão 2006!

É triste, mas taí: Cohen periga virar, no pior dos sentidos, o Michael Moore das comédias. Este é o Fahrenheit 11 de setembro dele. O truque começa a perder o efeito e passa a exibir uma engrenagem simplória sob a casca engraçadinha. E daqui pra frente? Quanto ele soltar um Sicko, alguém ainda vai se importar?

2 ou 3 parágrafos | Jean Charles

Postado em Atualizado em

jean

Ontem à noite, na bilheteria do cinema: “A mulher invisível. Uma inteira.” “Mas minha senhora, a sessão começou há meia hora.” “Então me dê uma inteira pro outro filme do Selton Mello.”

Acho que meu incômodo com Jean Charles (o “outro filme do Selton Mello”, 4.5/10) veio principalmente daí: as cenas sugerem uma produção barata e singela, com atores desconhecidos e um desejo de encenar a “vida como ela é”, o drama dos migrantes. Mas aí Selton Mello entra em cena e o que nos resta é um retrato distante, artificial, do brasileiro que morreu assassinado pela polícia de Londres. Ele está bem ou mal? Nem sei. O problema é anterior a isso: o personagem é, desde o início, engolido pela imagem conhecidíssima do astro.

Até os 15 ou 20 minutos finais, me pareceu um filme completamente primário e desinteressante. A narrativa é didática (as imagens do noticiário britânico são intercaladas ao dia a dia de Jean, por exemplo) e as cenas parecem trombar umas nas outras. Vai ter gente dizendo que são imagens “honestas”, uma homenagem “digna” mas, para mim, é tudo precário. No finzinho, o filme cresce um pouco quando apela para o sentimentalismo e atiça a indignação do público. As pessoas se comovem. Rage against the machine. Mas esse mesmo impacto poderia ter sido provocado por um documentário ou uma reportagem sobre o assunto, não?