Tune-Yards
Mixtape! | Maio, primeira luz
A mixtape do mês passado era sexy e pegajosa. Em comparação, a coletânea de maio soa como uma temporada na clínica de reabilitação. Parece um cdzinho calmo, tranquilo. Mas não é.
Não é mesmo.
Ele ficou do jeito que ficou (mais lânguido, digamos, mais arredio, mais tímido, fechadão) por dois motivos.
O primeiro: a ideia, como sempre, era criar um contraste com a mixtape anterior (que era de soul music, hip-hop); mas eu não queria gravar uma mixtape folk toda animadinha. Essas melodias adoráveis, portanto, estão cheias de lacunas desconfortáveis. Tratam de temas às vezes pesadões: frustração, arrependimento, medo, tensão sexual, hesitações tristes. Ouvindo novamente, acho que é a mixtape mais perturbada que gravei.
E uma das melhores. Vai ficando melhor, certo?
O outro motivo: ela, a mixtape, foi aparecendo numa época em que se falava muito aqui na cidade sobre o show do Jack Johnson. E eu sempre achei (continuo achando) que os fãs do homem só gostam muito dele porque ainda não foram apresentados a um Bon Iver, por exemplo. A um Fleet Foxes. Então este CD é um pouco pra eles, os fãs do Jack Johnson.
Ao contrário da coletânea de abril, esta aqui não conta uma história com começo-meio-fim e tem algo de autobiográfica. Foi um mês complicado.
Lá dentro você vai encontrar Six Organs of Admittance, Wild Beasts, The Antlers, Okkervil River, My Morning Jacket, Tune-Yards, Death Cab For Cutie, Bon Iver, Ron Sexsmith e, claro, Fleet Foxes, que ganhou a foto lá no alto do post.
Tem também faixa nova do Pinback, que é a minha favorita entre todas as que estão aqui. Ela está na primeira parte do CD, que vai criando uma onda que cresce até atingir o ponto máximo (lá no meio do disco). Depois, o aguaceiro vai se desfazendo aos poucos.
Acho que ficou bonito. O desfecho, pra mim, é emocionante.
Eu dedicaria esta mixtape a algumas pessoas, a amigos que não estão mais próximos como eu gostaria que estivessem, mas prefiro não anotar o nome de ninguém. Ouvindo mais uma vez, acho que é um CD com um quê de despedida.
Espero que, depois de ouvi-lo, você escreva duas ou três frases lá na caixa de comentários, onde está a lista de canções. Custa nada, né?
Vá lá, perca o medo, faça o download da mixtape de maio.
E, já que você está de bobeira, ouça também as fantásticas mixtapes de abril (minha favorita), março e fevereiro.
Superoito express (39)
Burst apart | The Antlers | 7.5
Como seria nossa amizade com o The Antlers se esse trio tivesse nascido em Londres e lançasse discos por uma grande gravadora (a EMI, digamos)? Talvez eles seriam rotulados como uma aposta da indústria musical para reforçar o segmento ocupado pelo Elbow, pelo Wild Beasts: grupos que, em maior ou menor intensidade, satisfazem os desejos de fã trintão que ainda torce para que o Radiohead grave um novo Ok computer (ou, vá lá, um outro In rainbows).
Mas, já que eles são nova-iorquinos e lançam discos por selos muito pequenos, a tendência é que essa história seja lida de outra forma, com um pouco de condescendência. Ok. É uma banda que soa tão sincera, tão verdadeiramente à beira de uma convulsão (corações sangrando!), que dobra nossa ranzinzice e faz com que desviemos o olhar daquilo que está na cara: Peter, Michael e Darby ainda estão digerindo muito lentamente, e com deslumbramento, o som dos ídolos (e, enquanto isso, criando derivações lindas como No widows e Putting the dog to sleep).
Ó, irmãos, cá está o dilema: diante de um disco tão apaixonante (e também tão óbvio, para padrões do indie rock), como proceder? Para cada referência superficial (e para cada versinho rebuscado que não chega a lugar algum), o Antlers vai criando um novelo sentimental que nos captura por completo. É singelo, às vezes apelativo, mas irresistível: por isso muito parecido com o primeiro disco do Band of Horses, Everything all the time. Menos monocromático e deprimente que Hospice, de 2009, porém mais arriscado, e por opção (se eles quisessem, gravariam um disco inteiro de climões sinistros). Me ganharam. Só não me saiam com um Infinite arms daqui a seis anos, ok?
w h o k i l l | Tune-Yards | 7
Merrill Garbus, a voz do Tune-Yards, poderia passar apenas como a musa perigosamente imprevisível da estação – o equivalente às meninas do Warpaint (temporada 2010) e ao Micachu and the Shapes (temporada 2009). E, de fato, whokill é um álbum cuja estranheza colorida, frenética, nos seduz logo na primeira audição – é disco perfeito, por isso, para jornalistas que trabalham demais. Quando ouço com mais calma, encontro: lo-fi pós-tudo feito com autoridade (Gangsta, Es-so), lo-fi pós-tudo que desbota com o tempo (My country, Doorstep), certa obsessão por violência (Killa), uma linda canção triste no lugar errado (Wooly wolly gong) e ideias de afro-pop que soam ainda imaturas, mas que talvez rendam grandes coisas nos próximos discos. É um grude. Mas é só o início.
Hot sauce committee part 2 | Beastie Boys | 6.5
Há os que compararam à energia teen de Licensed to ill (1986), há os que lembraram do espírito noise de Check your head (1992) e Ill communication (1994). Eu, que ouvi todos esses discos muitas vezes, não arredo pé: pra mim, Hot sauce committee part two vem no mesmo feixe de Paul’s boutique (1989) e Hello nasty (1998), discos em que a zoeira de samplers, que piscam feito árvore de Natal, domina a festa. Ouça Ok, por exemplo: é ou não é um filhotinho de Intergalactic? Soa como se eles tentassem, com muita força, reprisar o lance mágico. Taí: percebo uma banda tentando se reintegrar à própria mitologia – como o sujeito que, depois de uma crise, retorna à cidade de origem. Talvez por isso o disco seja um pouco parecido com qualquer outro que eles gravaram: e também um pouco melancólico, já eles próprios sabem como, em 2011, já não fazem mais tanta diferença assim.
Wasting light | Foo Fighters | 6
É, de certa forma, quase um irmão desse disco novo dos Beastie Boys – já que o Foo Fighters também faz um flashback para recuperar algo que a banda perdeu. Os mais recentes (principalmente Echoes, silence, patience and grace) eram discos muito técnicos, álbuns polidos, para disputar campeonato de eficiência. O que eles procuram aqui é a virulência dos primeiros discos e algo do desespero de Kurt Cobain – mas parece uma busca inútil, já que, por mais que se tente reprisar a juventude, tudo o que nos resta no fim do espetáculo é um grupo de adultos entediados, ricos, famosos, tocando rock numa garagem. A produção de Butch Vig é pragmática (como sempre), evitando espaços em branco, e Dave Grohl segue abastecendo o repertório para arenas superlotadas. Mas, pronto-falei: não consigo acreditar numa única palavra que ele canta. E, no mais, isto aqui soa mais ou menos como os discos anteriores: eficiente. Só que mais enxuto. É o bastante?
Circuital | My Morning Jacket | 5
Para uma banda que começou a carreira como uma espécie de Grateful Dead para fãs de Flaming Lips, o My Morning Jacket não poderia ter se transformado em algo mais distante daquilo que esperávamos dele: Circuital soa como Fleetwood Mac para fãs do Wilco. Eu não consigo ir contra essa filosofia de mudar e surpreender a cada disco, mas, deus!, taí uma das poucas bandas que deveriam parar de tentar. Quase todas as reviravoltas me parecem desengonçadas ou, no mínimo, equivocadas. Em Evil urges (2008), que era medonho, eles acenaram para Prince e Radiohead. Desta vez, eles criam uma espécie de mashup com Creep e Sting, numa faixa-título que resume as fraquezas do disco. Algumas faixas ainda retêm a graça country-rock do primeiro disco, mas vêm embaladas numa produção inofensiva, higiênica. O crítico da revista pode até curtir (olha lá, eles são inquietos!), mas duvido que ouça pela quarta vez.