The Sea and Cake

Shadows | Teenage Fanclub

Postado em

Tony Naylor, repórter do Guardian, defende neste artigo que as bandas de música pop deveriam gravar no máximo três bons discos e, para o bem da humanidade, saltar do barco.

Concordo com ele quando lembro de Oasis, Smashing Pumpkins e Hole. Mas aí discordo: há Beatles, Rolling Stones, David Bowie. E Animal Collective, que tem oito álbuns e continua nos surpreendendo.

Esses são exceções, vocês diriam. Pode até ser verdade (para cada Animal Collective, são 10 The Vines). Mas, quando evitamos as extremidades de provocações desse tipo, as coisas se tornam muito mais complicadas. Por exemplo: como fica o Teenage Fanclub, que, já longe do ápice (de álbuns belíssimos como Bandwagonesque, de 1991, e Grand Prix, de 1995), segue gravando discos muito dignos como este Shadows, o nono da carreira?

Resumindo: não confie em artigos que tratam a música pop como um conjunto de regrinhas esotéricas.

Mas voltando ao Teenage Fanclub. Numa primeira audição, Shadows pode parecer o disco autoindulgente que se espera de uma banda anciã. Os riffs ruidosos do início dos anos 1990 são aplacados por arranjos agradáveis e delicados, quase discretos, com amenas distorções de guitarras, decorados com pianos, violões, cordas e efeitos discretos de sintetizador. Tudo muito adulto e “sofisticado”.

Para quem conheceu a banda no início dos anos 1990 e depois a abandonou, será um choque. Nada de noise pop. Nada de rispidez lo-fi. Nada de power pop (alegremente) adolescente. Mas, antes que esse fã se decepcione terrivelmente e vá revirar o catálogo da Sub Pop, sugiro paciência. Ouça o disco novamente.

E admita: os escoceses têm todo o direito de gravar um álbum diferente daquele que faziam aos 25. Norman Blake, um dos principais compositores, tem 44 anos de idade. Sinceridade (e é o que vale, não?) continua um valor que eles levam muito em conta.

No mais, Shadows dá prosseguimento à virada de Man-Made (2005), um disco mais afinado ao indie elegante e gentil de bandas americanas como The Sea and Cake e de britânicas como o The Clientele do que da euforia reluzente de um New Pornographers.

Mas é claro que aparecerá quem diga que eles não estão se esforçando. Novamente, calma: dentro do gênero que resolveram habitar (e vamos chamá-lo de rock pastoral britânico, algo assim), eles tentam praticamente de tudo. Para os parâmetros do nicho, Shadows é um disco até bem sortido, com camadas de guitarras que batem feito feixes de melodia, se sobreponto uns aos outros. Sutileza, sutileza.

E não é um grande disco, antes que me perguntem. Tecer lindas melodias pop sem beirar a fofura gratuita não é um trabalho tão fácil quanto parece, e o Teenage Fanclub ainda oscila entre o memorável (The fall, The back of my mind) e canções amarrotadas, que passam sem dizer olá. Ouvi o disco cinco vezes e há algumas faixas que soam simplesmente transparentes (pode ser que isso mude, mas não apostaria nisso).

Há quem acredite que a história do Teenage Fanclub chegou ao fim há 10 anos (e tudo o que temos desde Howdy, de 2000, é um longo epílogo meio cinzento). Eu não vejo assim, pelo contrário: Shadows, ainda que não justifique a espera de cinco anos, aponta muitas possibilidades para um quarteto que optou por crescer junto com o seu público.

Que eles se transformem num novo Clientele — eu não me incomodaria.

E, de qualquer forma, o tempo passa (e notem que muitas das letras do disco lidam com memórias, arrependimentos, saudade, o passado). A barriga cresce. O cabelo cai. E há pessoas que não querem ser Axl Rose (pelo menos não para a vida toda). O fã de Bandwagonesque, já trintão, vai ouvir este disco no iPod enquanto faz compras no supermercado, leva os filhos no colégio ou calcula as prestações da geladeira.

E aí o Teenage Fanclub soará novamente como aquele bom amigo que nos visita de cinco em cinco anos – e que deveria voltar mais vezes.

Nono álbum do Teenage Fanclub. 12 faixas, com produção da própria banda. Lançamento PeMa Records/Merge Records. 6.5/10

CAR ALARM | The Sea and Cake

Postado em Atualizado em

Às pessoas que se confundem um pouco com o sistema de cotações deste blog: seus problemas acabaram. As coisas funcionam de um jeito bastante fácil, e vou tentar explicar tudo isso agora. Até para simplificar um pouco as vidas tumultuadas de quem freqüenta este espaço aqui (gente atarefada e impaciente, sem tempo deixar um alô na caixa de comentários), a avaliação de filmes e discos vai de uma a quatro estrelas. Como prova de que sou um cidadão bem-humorado, são três estrelas do bem contra uma estrela do mal. Vê que barato?

Didaticamente: os filmes e discos que recebem a estrela solitária são os fracos. Ok, ela é bastante usada, a vida é difícil etc. Os que ganham duas (decente), três (muito bom) ou quatro (grande!) merecem a sua atenção. Não tem cinco. Parou no quatro. Em casos excepcionais, lanço mão da temida bola preta. Mas isso acontece tão pouco que ainda nem me preocupei em procurar um gif para ilustrar a raiva.

Ainda mais calmamente: Either/or e Figure 8 são dois álbuns do Elliott Smith que merecem a sua atenção. Mas, por uma série de questões que escapam dos objetivos deste breve manual de instruções, o primeiro ganharia quatro estrelas. Já o segundo, três. Daí a necessidade de dividir as “estrelas do bem” (vamos chamá-las carinhosamente assim, ok?) em “subestrelas do bem”. Se eu colocasse todas no mesmo pacote, você ficaria sem entender que eu acho Either/or muito superior a Figure 8. Entendido?

No fundo, é tudo muito relativo e abstrato e quase transcendental, eu sei. É uma esfinge. Mas o caso The Sea and Cake pode ajudar na compreensão do método. Em 2007, a banda de Chicago retornou de um hiato de três anos com um álbum melodioso e acessível, sem muitos dos experimentos que marcaram a trajetória do quarteto. Everybody, que dividiu os fãs, soou para mim como uma tentativa bastante digna de reinvenção, de decantar um estilo para que sobrem apenas elementos fundamentais. O disco foi desprezado pela crítica, mas, para mim, está entre os melhores do grupo. Três estrelas pra ele.

Car alarm parece ter objetivos mais modestos. Ele dá continuidade à fase iniciada por Everybody. Hoje em dia, a banda defende a idéia de gravar com pressa, em meio a longas turnês. O disco exibe esse tom despretensioso, e aí entram até algumas brincadeiras com música eletrônica. Mas, se o álbum anterior surpreendia pela economia de recursos, o novo acaba soando como um subproduto, um longo (e nada instigante) “lado B”.

Mas não é ruim. Essa transformação de um projeto de indie rock e uma banda jazzística e elegante (mas ainda desengonçada, e aí está o charme do álbum) ainda é capaz de despertar a curiosidade de quem os acompanha. Sam Prekop e Archer Prewitt parecem cansados de fazer amigos e influenciar pessoas. Estão isolados num ambiente idílico, distante de todo burburinho. O título soa até engraçado: Car alarm não tem nada de estridente. Na ocasião certa (depois de uma sessão de Friendly Fires, por exemplo), pode salvar vidas. Mas é um álbum duas-estrelas. Sabe como é: decente, correto, agradável e nada mais.

Oitavo álbum do Sea and Cake. 12 faixas, com produção de John McEntire. Thrill Jockey. **