The Killers

Superoito express (27)

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American slang | The Gaslight Anthem | 8

O maior pecado que se pode cometer com o Gaslight Anthem é tratá-la como mais uma banda americana que se aventura a cingir as estradas do abertas por Bruce Springsteen. De fato, não são os únicos: como o Hold Steady e o Titus Andronicus, este quarteto de Nova Jersey revisa o ‘rock clássico’ setentista (não só Bruce, mas Stones, Clapton, Greatful Dead) com uma sensibilidade punk e uma escrita realista – crônicas de uma América sem glórias, cotidiana. Mas as comparações logo perdem a importância: quando vai ao microfone, Brian Fallon se torna o porta-voz de todos os  roqueiros que abandonaram a juventude, mas não perderam a inquietação. É o homem.

Enquanto o Hold Steady e o Titus ainda conseguem tomar algum distanciamento para narrar a saga dos meninos e meninas da América, Fallon parece contar a própria história (e talvez seja tudo ficção, mas o que importa é o grau de convicção, altíssimo). Mas, em vez de se retrair no canto do quarto, ele combina versos cheios de mágoas e nostalgia com uma sonoridade extrovertida, de cabeça erguida. “Aqueles velhos discos não vão salvar a sua alma”, Fallon avisa, em Stay lucky. Mas American slang, mais conciso e aparadinho do que The 59 sound (2008), soa como um álbum perdido do início dos anos 70: hinos robustos para o sonho que acabou.         

 

Gemini | Wild Nothing | 7.5

Sem querer forçar a barra (mas já forçando), existe pelo menos uma semelhança entre o Gaslight Anthem e o Wild Nothing: ambos soam autênticos mesmo quando seguem todas as regrinhas de certos subgêneros do indie rock. No caso do projeto de Jack Tatum, a matriz é o shoegazing dos anos 80. Mas, se a neblina de Gemini nos transporta imediatamente a um disco do My Bloody Valentine ou do Cocteau Twins, Tatum vai remodelando e atualizando essa sonoridade com a leveza do pop sueco (Summer holidays é bonita de doer) e o noise doce de um Pains of Being Pure at Heart. Em resumo: a delicadeza às vezes exige uma arquitetura complicada.    

White magic | ceo | 7.5

E o sol continua a brilhar na Suécia… O projeto solo de Eric Berglund, do Tough Alliance, é cartão-postal para as belezas do pop escandinavo, a ser consumido com cautela por quem se engasga com melodias acolchoadas e arranjos com cheiro de morango. Canções infinitamente otimistas como Illuminata, No mercy e Love and do what you will são quase exercícios de estilo: coros, flautas, ecos, barulhinhos divertidos, sentimentos nobres e sintetizadores gentis. Uma lindeza. Melhor do que isso, só quando caem as chuvas de verão: Oh God, oh dear, uma ode tocante a Brian Wilson, e a eletrônica nebulosa da faixa-título são remédios contra insolação. “Venha comigo para um lugar que eu chamo de realidade”, convida Eric. Por enquanto não, obrigado.         

Night work | Scissor Sisters | 7

Nada como um produtor sagaz: no terceiro disco do Scissor Sisters, o parisiense Stuart Price transforma um conjunto de canções apenas medianas num álbum que flui como um DJ-set. Um milagre semelhante ao que ele operou em Confessions on a dance floor, da Madonna, e Day and age, do Killers. No caso de Night work, o espírito é o de uma festança para trintões, com doses de dance music safada, new wave e pop dos anos 1970 e 1980. Os nova-iorquinos ainda pilham os hits alheios com humor debochado, camp – mas, desta vez, ganham massa muscular graças aos esteróides roubados de discos antigos do Prince ou de um Midnite vultures, do Beck. De Bee Gees (Any which way) a Talking Heads (Running out), o DJ não falha. No calor da pista, sobra até para os mais românticos: Fire with fire é o tipo de baladona épica que venceria o Oscar de melhor canção em 1986. O suficiente para nunca mais confundirmos Scissor Sisters com Mika.

Quatro discos estrangeiros

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O que perdi durante o Festival de Brasília: The Killers lançou o melhor álbum da carreira (e nem é um grande álbum), Kanye West gravou uma ópera emo, Britney Spears virou gente e até o Guns n’ Roses aproveitou meus dias de isolamento no fantástico mundo do cinema brasileiro para finalmente concluir a obra mais ridicularizada de todos os tempos. Ainda não ouvi as últimas do Axl e da Britney, e sei que estou bastante atrasado nesta leva dos lançamentos, mas vamos com calma ao leite derramado (e as análises são toscas e apressadas, como de costume).

kanyepeq808s & heartbreak | Kanye West | « «

Eles também são humanos: mais cedo ou mais tarde, todo astro da música pop acaba se identificando terrivelmente com Blood on the tracks. Para os padrões de Kanye West, esta espiada na vitrine das caras desilusões sentimentais (quase todas as canções do álbum sangra sobre os cacos do fim de caso entre o rapper e a noiva Alexis Phifer) soa como suicídio comercial. Mas, comparando a esta terapia para pistas de dança, o que dizer de Sea change (Beck) e Hissing fauna, are you the destroyer (Of Montreal)? São disquinhos revolucionários.

Como acontece na carreira de West, o aparato de marketing ainda supera o produto final. Quem esperava ousadias em Graduation encontrou um bloco de rascunho com anotações sobre o pop eletrônico europeu. Quem mandou? Da mesma forma, 808s & heartbreak promete talvez demais: a catarse emocional nos é vendida em embalagem frágil, limitada – que pode ser resumida na opção de West por alterar grosseiramente a própria voz em todas as faixas (numa overdose de auto-tune que remete mais a Believe, de Cher, que a One more time, de Daft Punk).

As letras não somam tanto sentido à lamentação. Say you will e Love lockdown são lacônicas (o que abre brechas para efeitos ora percussivos, ora glaciais). Já as imaturas Heartless e Robocop provam que, depois de levar um pé na bunda, todo macho retorna aos 12 anos de idade (quer dizer: todos menos Dylan, vide Idiot wind). É um álbum arriscado e sensível (que não será aceito nas prateleiras de hip hop), mas ainda sinto a falta do West verdadeiramente ambicioso de Late registration.

thekillerspeqDay & age | The Killers | « «

Até aqui, o Killers aparentava ser uma banda que – apesar de apoiada num vocalista carismático e em hits acertados – procurava uma identidade. Em Day & age, eles chegam lá: sem macaquear Bruce Springsteen ou diluir acessórios do “novo rock”, se afirmam como discípulos do rock de arena de U2, com um quê de glam rock e raízes profundas no pop oitentista. Las Vegas, servia de tema e cenário para os discos anteriores, agora se converte em estado de espírito. Melhor assim.

Os fãs talvez sintam falta dos refrãos imediatos do primeiro disco, mas Day & age sai na frente como um surpreendente (pelo menos para mim, que não me interesso por nenhum outro disco deles) momento de coesão, uma demonstração de auto-conhecimento. Só uma banda muito segura inclui elementos eletrônicos à beira do kitsch em um single do porte de Human (que faz por merecer uma cover da Cher), ou tenta brincadeiras alegres com ritmos latinos (Joy ride).

A produção de Stuart Price dá ao Killers uma leveza que o grupo nunca tentou – e, apesar de ainda derivativa, a banda pelo menos aprendeu a se divertir com a própria insignificância.

kaiserchiefspeqOff with their heads | Kaiser Chiefs | « «

Depois de um álbum morno (Yours truly, angry mob), o Kaiser Chiefs parece ter levado a sério os comentários de quem vê neles uma encarnação do brit pop do início dos anos 1990. O novo disco defende tanto essa referência que fiquei à espera de uma cover de Parklife, do Blur.

Off with their heads é (calculadamente) é tão acessível quanto diversificado – um álbum de hits que atiram em diferentes direções. A produção de Mark Ronson dá polimento das canções de forma que nenhuma mudança brusca de via assuste o fã. Há os ecos de The Who e The Kinks (e as letras engraçadinhas de sempre), mas fica a impressão de que o Kaiser Chiefs quer dar um passo para frente e provar que pode evitar a cartilha monocromática do rock britânico alinhado ao Arctic Monkeys. Bom para eles.

Ainda assim, falta personalidade a esses refrãos todos. Acaba que nos lembramos do disco por um ótimo single (Never miss a beat) e pouco mais. 

eaglespeqHeart on | Eagles of Death Metal | « «  

 Por essa eu não esperava: enquanto o Queens of the Stone Age dá sinais de estagnação, o projeto paralelo de Josh Homme, Eagles of Death Metal, segue em frente na complicada tarefa de se afirmar como uma banda de verdade. Por enquanto, é divertido acompanhar essa história.

Talvez por se permitir um turbilhão de referências (Led Zeppelin, Rolling Stones e até James Brown), sempre com o bom humor de quem não tem nada a perder, o Eagles of Death Metal dá a Homme uma liberdade que ele não encontra mais no Queens. Pode parecer um contrasenso: Heart on é o mais próximo que ele chega de um álbum de rock convencional. 

E não estou reclamando. É o primeiro disco do grupo que consigo levar a sério.