Sabrina

The people’s key | Bright Eyes

Postado em Atualizado em

Conor Oberst é o homem dos planos impossíveis. Sabe que não vai superar os próprios ídolos (eles são insuperáveis), mas continua tentando.

Há como não torcer por ele? Compreendo o sujeito. Sempre me comportei um pouco assim. Meus colegas de trabalho admiravam o funcionário mais talentoso. Eu mirava o sujeito que papou o Prêmio Nobel. “O tipo de ambição que não não vai te levar a lugar algum, Tiago”, diziam. Eu ignorava os conselhos.

É claro, sofri muito por conta dessas aspirações inatingíveis. Ainda hoje, não sei lidar com rejeição. Faço que estou bem, mas sempre tento me convencer de que o problema está em quem me rejeitou. Um raciocínio falso. Mas, até aí, permaneço um garoto birrento.

Quero, por exemplo, ser o romancista que escreveu o parágrafo cuja estrutura ainda me parece um mistério. Perguntam: “Tiago, quando é que você vai escrever um livro?”. Faço que não me importo com nada disso. Mas penso, frustrado com as minhas limitações: nem sei com que palavra começar.

É o que percebo em Conor Oberst. Nota-se que o chapa é dedicado, cresceu ouvindo bons discos e tem mestres que flutuam muito acima das canções que ele consegue compor: Bob Dylan, Bruce Springsteen, Neil Young, os grandes. É novo — 30 aninhos, um ano a menos que o Tiagão aqui —, mas nada indica que o tempo fará dele um ídolo tão retumbante quanto aqueles que persegue.

Não é o que acontece, por exemplo, com um Thom Yorke, um Damon Albarn. Homens feitos. Quando querem elogiá-lo, dizem que Conor é o novo Dylan. Tudo o que queremos é que Thom Yorke continue sendo Thom Yorke.

Mas paciência: a personalidade musical de Conor sempre pareceu um tanto frágil, incompleta, como se ela precisasse se escorar em referências, tradições, cacoetes, modelos de “álbuns de rock” para não cair e quebrar.

E aí eu me identifico com ele. Ainda há muito a fazer, e sinto que nada será suficiente. Meu romance – me rendo! – terá parágrafos singelos.

No Bright Eyes (trio formado também por Natel Walcott e Mike Mogis), ele gravou o “disco épico” (Lifted, de 2002), o “disco folk” (I’m wide awake, it’s morning, de 2005), o “disco com blips eletrônicos” (Digital ash in a digital urn, de 2005), o “disco espiritual” (Cassadaga, de 2007). Solo, fez dois álbuns na tradição de singer-songwriters emotivos, coração rasgando, sons “de raiz”, diários de motocicleta.

Um homem que tenta surpreender — mas incapaz de forjar um estilo. Dedicação, meus amigos, não é tudo. Existe um elemento sobrenatural que separa um Conor Oberst de um Elliott Smith.

Tudo isso para dizer que The people’s key, o novo do Bright Eyes, é desde já meu disco favorito da banda. Mais do que Lifted. Mais do que I’m wide awake, it’s morning. Talvez por ser o disco em que Conor aparece com uma postura mais relaxada, como quem finalmente reconhece os próprios limites (ainda que continue tentando, a teimosia dele é uma arma pra nos conquistar).

É disco de fã de rock.

O que essas 10 canções entregam é um retrato quase ordinário, mas muito simpático, de um homem que ouviu as canções de protesto de Dylan, as “road songs” de Springsteen, que talvez tenha admirado o disco mais recente do Arcade Fire, e que, talvez incapaz de fazer algo diferente, adapta essas e outras referências ao próprio temperamento. Combina os conceitos dos álbuns anteriores numa betoneira sonora que funde folk, classic rock, um quê de country e efeitos de sintetizadores.

Há alguns meses, ele afirmou que este seria um último capítulo para o Bright Eyes. Faria sentido. The people’s key resume a trajetória: deixa a conclusão imediata de que Conor sempre esteve mais para um Ryan Adams (observador de certa história do rock) do que para um Beck Hansen (capaz de transformar a colagem em algo pessoal).

Eis o perfil do compositor. O que não tira os méritos do álbum, todo ele arredondado, potente, muito profissional, resultado de esforço, suor que praticamente ensopa os arranjos.

Aqui estão pelo menos três das melhores faixas que Conor escreveu: a trovejante Haile Selassie, a balada Ladder song (que só poderia ter sido escrita por um sujeito de 30 anos de idade, sem inocência) e o encerramento One for you, one for me, que termina com um sermão otimista sobre paz, amizade, piedade. Até certo ponto, um disco também simples. Mas uma simplicidade madura: por que precisamos de outro Bob Dylan quando temos o original?

Conor, ele admite, não tem muito a nos oferecer. Mas compensa essa ausência de uma arte extraordinária recorrendo a um discurso afetuoso, que soa transparente mesmo quando maquiado com as melodias mais superficiais, mais tolas.

Talvez por isso eu me veja um pouco nele. Não somos tudo isso, nunca seremos, não somos os melhores nas áreas em que atuamos, mas ninguém terá o direito de apontar o dedo e acusar: “rapazes, vocês nem tentaram!”

Sétimo álbum do Bright Eyes. 10 faixas, com produção de Mike Mogis. Lançamento Saddle Creek Records. 7/10

2 ou 3 parágrafos | A saga Crepúsculo: Eclipse

Postado em

Meninas, estou começando a entender a infinita angústia de Bella, a heroína blasé da Saga Crepúsculo. Deve ser difícil para ela — dificílimo — escolher entre os dois pretendentes a que tem direito: passar a eternidade ouvindo a lengalenga de um morto-vivo insuportavelmente romântico? Ou abraçar o cachorrão?

A decisão se torna ainda mais complicada quando ela descobre que, no mundo mágico da Saga Crepúsculo, casamentos duram a vida inteira. Às vezes, a eternidade inteira. Um horror. Note que não são opções muito palpitantes (daí o ar de tédio, o enfado da pobre virgem): tanto Edward, o vampiro, quanto Jacob, o lobisomem, têm um repertório de conhecimentos gerais que parece muito limitado. O dentuço só sabe falar sobre a importância do amor eterno. E o lobão tenta convencer a mocinha de que é bacana se acasalar repetidas vezes com um sujeito de sangue quente. É sério que esse drama aí vendeu toneladas de livros? Eu conheço filmes mais intrigantes sobre adolescentes indecisas e posso indicá-los a vocês.

Fico me perguntando se esses personagens não teriam outros assuntos a conversar uns com os outros. Algo tipo: “Eu curto Paramore, e você?”, ou uma tirada irônica do estilo “nossa cidadezinha é tão reluzente e festiva quanto Las Vegas, não acha?” Ou algo sobre a fome na África. O aquecimento global. O cinema 3D. Qualquer coisa. Mas não: o trio prefere voltar ao mesmo debate sobre “escolhas” que é exaustivamente explorado na literatura barata de bancas de jornal e, claro, no filme anterior da série. Aí os mais cínicos virão com esta: pelo menos Eclipse (1.5/5) tem cenas de ação menos raquíticas. Sim, tem. Mas os momentos cafonas e floridos anulam a subtrama esquentada. E fazem deste um filme tão tolinho e singelo (e engraçadíssimo, se você estiver no clima) quanto os outros dois.