Lambchop
mixtape | Janeiro, from a room
A mixtape de janeiro é um pouco diferente da de dezembro, mas não muito.
A ideia era gravar uma coletânea mais alegre e dançante, só que todos os planos tiveram que ser alterados depois que ouvi os discos da Sharon Van Etten (que está na foto acima) e do Leonard Cohen (daí o nomezinho do post, em homenagem ao homem). A mixtape, portanto, passou a ser conduzida pela sonoridade, digamos, crepuscular desses dois álbuns.
É uma das minhas mixtapes preferidas – e acho que gosto muito dela porque não foi tão simples encontrar as músicas que combinassem direitinho com a atmosfera que eu queria sugerir. Tive que me livrar de algumas boas faixas, que estão entre as minhas preferidas do mês. Na minha modestíssima opinião, o esforço de não fugir ao tema compensou: o disquinho faz sentido e conta uma história.
Aqui dentro, vocês vão ouvir músicas novas também de John K Samson, Whistle Peak, Bears, Lana Del Rey (ok, essa não é tão nova), Craig Finn, Damien Jurado e Lambchop. A lista das faixas está na caixa de comentários.
Como de costume, você pode fazer o download da mixtape ou ouvi-la aqui no blog. Recomendo a segunda opção: desconfio que o arquivo em mp3 vá desaparecer rapidamente.
Comentários serão bem recebidos. E, antes que eu esqueça, esta mixtape é dedicada ao Daniel (nada de hip-hop desta vez!) e ao Adalberto, que talvez curtam os climas tão realistas (e adoráveis, de vez em quando) deste disquinho.
Faça o download da mixtape de janeiro
Ou ouça aqui:
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♪ | Mr. M | Lambchop
Ninguém vai levar como ofensa (talvez nem a própria banda) se você afirmar que o Lambchop grava sempre o mesmo disco. Será, é claro, uma generalização. Mas não muito absurda, principalmente quando se fala numa fase que começou em 2002 (com Is a Woman) e segue imperturbável há uma década, cingindo um céu aberto e tranquilo.
Nenhum dos discos do Lambchop pós-Is a Woman contém os desafios de Nixon (2002), que acabou representando um período de transição para o grupo de Nashville. O álbum capta um momento de experimentação, quando eles tentavam, já fora da fazendinha do “country alternativo” e combinar certas referências de soul music, country, jazz, gospel e lounge. A aventura modificou a banda quase por completo. Compreensível: se eu ainda não me recuperei da porrada de Up with People – que é uma obra-prima -, imagino que essas e outras invenções tenham sequelado a banda.
No disco seguinte, o Lambchop definiu um modelo sonoro que, hoje em dia, provoca preguiça até na própria gravadora. A Merge Records descreve esse modus operandi da seguinte forma: “como nos discos anteriores, muitas das canções de Mr. M são emolduradas por cordas exuberantes, e existe uma camada contida de distorção e dissonância; o centro da música ainda está no movimento cíclico da guitarra de Kurt Wagner e o coaxar suave e caloroso de sua voz.” Não deixa de ser um resumo fiel do disco, mas que parece apontar para palavras como estagnação e comodismo. É isso? O mesmo disco, mais uma vez?
Acho que sim e que não. Sim porque, vamos ser honestos, só consigo ouvir em Mr. M (e no anterior, Ohio) o lentíssimo polimento de um estilo que talvez esteja precisando mesmo de uma chacoalhada. Mas não, porque este parece ser o disco que Kurt Wagner sempre quis gravar: um álbum que soa como um dia comum, um elogio en passant ao cotidiano; moroso porque, entre outras coisas, a vida às vezes é assim mesmo. E não é de hoje que o Lambchop tenta sonorizar situações comezinhas (nem por isso pouco tristes, melancólicas, tocantes), geralmente observando a rotina do casamento, das relações de amizade e da família. Esse olhar ainda tem seu encanto.
Quem chega pela primeira vez à banda pode se convencer de que é um projeto tedioso: as canções são quase sempre longas e parecidas umas com as outras, com sutilezas que exigem muitas audições e insights literários que talvez não despertem paixões em muita gente. O humor da faixa 2B2, uma canção absolutamente realista sobre a vida a dois, é discreto demais para chamar a atenção. E as instrumentais Gar e Betty’s Overture são lindas e perfeitas como peças de porcelana: cheias de detalhes que devem ser admirados à distância. No mais, o disco faz anotações sobre a vida adulta por um viés que não tem absolutamente nada de juvenil. Não é fácil, não é fofo, não coloca ninguém pra dançar, não fica borbulhando ideias.
É um som quase ambiente, que faz ainda mais sentido numa dessas manhãs serenas de domingo, quando o que nos resta é uma sucessão de pequenos eventos banais. O mesmo domingo. Kurt Wagner ainda é capaz de olhar para essa paisagem silenciosa (que pode ser bonita ou terrível, ou as duas coisas) e encontrar aí um mistério, e uma razão para compor.
Décimo primeiro disco do Lambchop. 11 faixas, com produção da própria banda. Lançamento Merge Records. B
OH (OHIO) | Lambchop
Entre as cinco ou seis pessoas que idolatram o Lambchop, é uma espécie de consenso que Nixon, de 2000, foi a álbum que colocou a banda entre as mais importantes do novo country alternativo dos Estados Unidos. Ao mesmo tempo em que desdobrava o som apresentado por Uncle Tupelo no início dos 90, o disco parecia mais amplo até que o próprio gênero, com referências de soul music, rock psicodélico e das confissões sombrias de um Leonard Cohen.
Pois bem. Como uma das cinco ou seis pessoas que idolatram o Lambchop, não tenho como discordar muito disso. Mas o tempo provou que, para o futuro da banda, o álbum seguinte a Nixon seria ainda mais decisivo. Em Is a woman, o crooner Kurt Wagner liderava um time de quase 20 músicos numa espécie de orquestra de silêncios. Ouça o disco com pressa e você pensará que Kurt se faz acompanhar apenas do próprio violão. Aumente o volume a, aos poucos, você reconhecerá os sopros, as cordas, os efeitos eletrônicos, os pianos, os sussurros.
Talvez seja uma aventura tão impresssionante quanto o próprio Nixon, mas, talvez por exigir o cuidado com que se trata uma peça de porcelana, confinou definitivamente o Lambchop num nicho preservado por cinco ou seis fãs muito dedicados. Como aconteceu com o Tindersticks, pagou o preço por burilar um estilo que não parece oferecer atrativos ou facilidades aos não-iniciados. O Lambchop é o que é, goste ou não: a banda de música ambiente mais agoniada que conhecemos.
Os dois álbuns mais recentes – o ótimo Damaged, de 2006, e este Ohio – não fazem absolutamente nada para satisfazer quem procura neles um novo Wilco. Estação errada, amigo. A faixa-título abre o disco mais para os standards interpretados por Frank Sinatra que para Neil Young. “Green doesn’t matter when you’re blue”, cantarola Wagner, satisfeito com o trocadilho. A seguinte, Slipped dissolved and loosed, soa ainda mais bucólica. “Um pássaro canta uma canção para mim”, avisa, numa onda mansa de melodia que parece nunca, nunca, nunca mesmo será capaz de se fazer maremoto.
Se Is a woman é uma obra-prima da tensão represada, e Damaged ainda comovia com o lado cronista de Wagner, Ohio é de um otimismo frágil, desconfiado. “Acredito no amor, acredito em bebês, acredito na mãe e no pai, e acredito em você”, canta, como uma criança, em I believe in you. Antes disso, o cantor afirma ter perdido a fé nas primaveras (enquanto repete frases musicais de Is a woman) e, em Popeye, emenda sha-la-las com a pergunta desesperada da vez: “Você pode me sentir agora?”.
Quem precisa da multidão? Em Ohio, o Lambchop nos avisa que talvez não seja tão trágico assim escrever álbuns que serão idolatrados por cinco ou seis pessoas. Cada vez mais, uma banda satisfeita com o mundinho acinzentado que criou para si.
Nono álbum do Lambchop. 11 faixas, com produção de Mark Nevers e Roger Moutenot. Merge Records. **