La Roux

Superoito express (na Copa)

Postado em

Destroyer of the void | Blitzen Trapper | 6

Bem, amigos do blog. A rodada de hoje começa com um time da segunda divisão que, após uma temporada de passes escandalosamente criativos (o ano de 2007, quando eles lançaram o surpreendente Wild Mountain Nation), assinou com um patrocinador parrudo (a Sub Pop) e, numa derrapada inexplicável, amargou partidas chochas, quase sempre à mercê de táticas supostamente “clássicas” (Furr, de 2008, não é digno de campeonato mundial). Em 2010, ele ainda soa como uma promessa que quase chegou lá, uma Dinamáquina empenada – um time que poderia ter erguido o caneco, mas que hoje desfila tímido e quase burocrático dentro das quatro linhas.

Destroyer of the void, com esse título pomposo, é uma seleção de jogadores que, quanto mais tentam reverenciar os mestres (Grateful Dead, Rolling Stones), mais demonstram que ainda estão a milhas do futebol-arte. Sebo nas canelas, rapazes! Falta muito treino, muita concentração, muito feijão-com-arroz para marcar um golaço elegante na tradição de Wild horses, dos Stones (eles tentam mais ou menos três vezes, sem sucesso). Ainda assim, é curioso (e uma pena! Antifutebol!) que eles queiram abandonar as divertidas peladas de outros tempos para se transformar em um time tático, correto, eficiente (quando muito) e que briga pelo empate. Poucas jogadas valem o replay, mas, quando esse tipo de milagre acontece, elas enchem os nossos olhos: Laughin lover é um baile, e a faixa-título tem um quê épico (Bohemian rhapsody?) que soa como um chute maior que as pernas. Mas um chute corajoso, ao menos.

Lazerproof | Major Lazer vs. La Roux | 7

Ah, a malandragem dos boleiros! O gol de mão! O juiz ladrão! A violência tão fascinante! Os cartões vermelhos! Os mash-ups mui picaretas! Major Lazer é o nosso Luis Fabiano e, obviamente, o gol chamado Lazerproof é duvidoso e divertidíssimo. Na mixtape, os pivetes Diplo e Switch (que atendem por Major Lazer) saqueiam o repertório da dupla inglesa La Roux (que bate um bolão) em uma seleção bizarra que soa como um encontro entre bambas da Jamaica e da Suécia. Isto é: electropop escorregadio na zaga, hip-hop de centroavante, reggae e dub no ataque. Muitas jogadas emboladas e patéticas, mas você esperava algo diferente disso? O importante é que o ML Futebol Clube cumpre o desafio de segurar nossa curiosidade até os 45 do segundo tempo e (mais espantoso ainda) mantém uma certa unidade que engrandece o álbum. É zebra, mas vai para as oitavas.

…And the Pioneer Saboteurs | Micah P. Hinson | 7

O texano é um talento individual que costuma apresentar uns balés misteriosos, curtidos em treinos secretos, e quase sempre discretos. Daí o susto (bom susto) deixado por esta quarta partida, acompanhada pela banda Pioneer Saboteurs. Antes, Micah se contentava em jogar na obscura divisão dos songwriters de country e folk alternativo. Hoje, ele disputa uma vaga no Mundial com uma estratégia muito mais aberta e moderna, a começar pelos sinistros arranjos de cordas (que perigam assombrar o adversário e render inúmeras vitórias por WO). Um dos modelos do cantor é o craque arredio Tom Waits, e aqui ele consegue encenar umas firulas teatrais muito atléticas, como se estivesse pronto para correr ao meio do estádio, ajoelhar-se no chão, erguer uma caveira e recitar Hamlet. Bonito, barroco, dramático. Aposto que, em alguma poltrona vip, um emocionado Rufus Wainwright lançou um lenço branco ao gramado.

Future breeds | Hot Hot Heat | 5

Depois de uma passagem acidentada pela liga dos campeões (pela Warner, eles lançaram Elevator, de 2005, e Happiness ltd, de 2007), os peladeiros canadenses do Hot Hot Heat voltam à várzea com um disco independente que (como era de se esperar) tenta recuperar a inocência e o frescor dos primeiros passes, dos dribles juvenis, do pé-na-lama, da camisa rasgada, da chuteira esfolada. De nostalgia, no entanto, também vivem as seleções da Itália e da França. Future breeds é assumidamente um disco “sobre a cena punk de Vancouver do fim dos anos 90” (segundo a própria banda), o que me livra de conhecer a cena punk de Vancouver do fim dos anos 90. Apesar do bla-bla-bla, o HHT continua fazendo pop punk com alguns lances sinuosos (o single 2120 é Pixies Esquema Vines), com aquele espírito alegre tão típico das seleções africanas. Mais esquecível, portanto, que discutir estatística em mesa redonda.

La Roux | La Roux

Postado em

rouxDizem que não devemos avaliar discos quando estamos nos sentindo miseráveis e agoniados. Pois bem: estou triste (muito triste) e irritado (mais ou menos irritado, dependendo do momento do dia), mas algo acontece quando ouço os discos do La Roux e do Little Boots. Se entendo o meu corpo direito, eles provocam reações físicas: apertam minha barriga até quase me levar às lágrimas e depois me confortam com teclados iluminados, melodias antidepressivas e refrãos com sabor de xarope de morango. É como se nada, absolutamente nada estivesse por um fio. Ainda que esteja.

São tempos difíceis, meus amigos.

Mas vamos aos discos, que eles curam: o primeiro, aviso logo, é superior ao segundo. La Roux é uma dupla de electropop da Inglaterra com uma fixação por hits dos anos 1980 – de Yazoo a The Human League (passando por figurões como Prince e Depeche Mode), eles devoram tudo o que era lixo e hoje é um luxo. Num sistema solar habitado por Phoenix e Cut Copy, não é um flashback exatamente inusitado (e este não é um grande álbum). Mas limitar a banda a essa referência é muito pouco, é uma besteirada, já que existe um mulherão deitado nessa cama sonora. E ela se chama Elly Jackson.

Bem Langmaid, o produtor e compositor do La Roux, é o principal responsável pelo som retrô-chic, bem-humorado da dupla (que, nos trechos mais inspirados, lembra os hits mais irônicos do Daft Punk e alguma coisa de Air, Miss Kittin e Annie). Mas é Elly Jackson, a fã de Carole King e Nick Drake, quem tira esse estilo do quarto de brinquedos e infla os acordes de angústia – e aí é sangue mesmo, não é mertiolate (e Karen O tem muito a invejar, no caso). É ela, e só ela, quem faz desse o disco de dance music uma pilha de nervos – e um dos lançamentos mais interessantes do ano com o selo de uma grande gravadora (se bem que há pouquíssimos concorrentes nesse nicho).

O álbum narra uma saga extremamente banal (por isso real) de inseguranças, neuras, algumas alegrias e pequenos desastres amorosos – daqueles que vivemos de vez em quando, mas machucam feito gastrite. “Pontos finais e pontos de exclamação. Minhas palavras derrapam antes que eu tente começar”, ela avisa logo na primeira faixa, In for the kill (e, mais adiante, diz que está nessa “só pelo frio na barriga”). Em Colourless colour, a melhor do álbum, ela lembra dos anos 1990 como um deserto existencial. “Queríamos nos divertir, mas não havia nada mais para brincar”, lembra. E continua: “Quero fugir para sentir o sol na minha pele”. Uma canção tão descartável deveria soar tão verdadeira?

E Cover my eyes é diário de adolescente, tolinho que só: “Quando eu te vejo andando com ela tenho que cobrir meus olhos. Toda vez que você sai com ela, algo dentro de mim morre”, Elly canta. E, entre teclados à Strangelove, é logo acompanhada por um coro de crianças que encontraríamos numa baladona do Michael Jackson à época de Dangerous. Só ouvindo.

Little Boots não soa tão excitante, ainda que também provoque o efeito de um analgésico. O projeto de Victoria Hesketh (outra britânica, outra mulher à beira de um colapso) peca pela afobação: o álbum de estréia, Hands, é desnecessariamente superproduzido (faz a estréia do La Roux parecer um ensaio sobre o minimalismo). São nove produtores (!) – mãos para todo lado. Fica até difícil enxergar uma linha narrativa no álbum, que oscila do electro ao hip hop norte-americano de FM, já que cada canção parece esgotar totalmente suas possibilidades, deixando o espaço aberto para a próxima aventura. Ainda assim, não entendo o disco como um desastre (se isso é um desastre, o que é Lady Gaga?), mas sim como um esforço descontrolado de provocar uma boa impressão.

Uma bobagem. Mas não qualquer bobagem. E vá por mim: experimente nos piores dias.

Créditos
La Roux | La Roux (Polydor, 2009) 7.5
Hands | Little Boots (Atlantic, 2009) 6