Hits
Intervalo | 200 mil hits
Há muito, muito tempo, o marcador de visitas deste blog marcou o número 100 mil. Imaginei, tomado pelo susto: “este blog doméstico, tão modesto, quase sempre inconsequente e ainda imaturo, foi acessado cem mil vezes?”. Daí que, empolgado com a notícia, escrevi um post pequenino chamado Intervalo para dividir minha alegria com as pessoas que têm fé no blog (e, consequentemente, em mim).
Pois bem: este site doméstico, tão modesto, quase sempre inconsequente e ainda imaturo, acaba de bater a casa das 200 mil visitas. Não sei se, no universo estatístico da blogosfera, isso conta como um número expressivo. Talvez não. Definitivamente não. Mas ele me impressiona. Quando olho para ele. E vejo: 200 mil. O que representa? Para mim, é espantoso.
A razão deste micropost é agradecer a quem, durante este tempo todo, visitou o blog mais de uma vez. Obrigado.
Os discos da minha vida (9)
Mais um capítulo da saga sobre os discos que governaram a minha vida — esta semana, em versão ansiosa, prematura. Comentários breves e irresponsáveis (escritos entre o plantão de eleições e o início das minhas férias) sobre dois álbuns que, por coincidência, me levam a uma época em que eu era muito novo e ingênuo.
Amanhã (se tudo der certo) chego ao Festival do Rio. Devo escrever posts curtos sobre os filmes, mas adianto que será uma semana corrida. Pretendo ver muita coisa e, por isso, não juro fidelidade ao blog. Mas paciência: estarei de volta na semana que vem.
Lembrando: os discos deste ranking não são todos obras-primas (o critério é sentimental, totalmente duvidoso), mas garanto que eles soam, no mínimo, curiosos. Faça o download e concorde comigo.
084 | Behaviour | Pet Shop Boys | 1990 | download
Eu era um garoto de 11 anos, levava uma vida muito agradável e as minhas músicas preferidas ainda tocavam no rádio e apareciam na MTV. Qualquer hit me satisfazia — mas lembro que este disco do Pet Shop Boys (sejamos fiéis à realidade: era uma fita cassete) me mostrou um traço melancólico do pop que me surpreendeu como algo totalmente novo. Mais tarde, descobri que era um disco muito forte sobre temas que eu ainda não compreendia em 1990. Mas o que guardo dele é aquela sensação inocente, pré-adolescente: existe algo errado com essas melodias tão perfeitinhas. Top 3: Being boring, How can you expect to be taken seriously?, So hard.
083 | Under a blood red sky | U2 | 1983 | download
Este é um disco importantíssimo para mim, talvez um dos mais emocionantes da lista, e por um motivo totalmente pessoal: foi o único álbum que eu gravei numa fitinha cassete para uma viagem de fim de ano, em 1993, em que (vejam que meiguice) passei dias incríveis com a primeira garota por quem me apaixonei. Era uma época em que, para mim, tudo parecia possível: meus desejos se realizavam integralmente, não havia frustrações. Hoje percebo o quanto essa gravação do U2 — interpretada por um Bono Vox que parece prestes a dominar o planeta — ecoa aquele meu sentimento otimista de que, no fim, tudo daria certo. Não foi bem o que aconteceu, mas é uma boa lembrança. Top 3: I will follow, Sunday bloody Sunday, Gloria.
Thank me later | Drake
Você conhece Drake? Então está na hora.
Até porque, nos próximos meses, será impossível não reconhecê-lo por aí. Nas rádios. Na MTV. Nas trilhas de cinema. O rapaz tem bons amigos (Lil Wayne, Jay-Z, Kanye West, Timbaland, The-Dream, T.I., Alicia Keys), vem no embalo do marketing da Universal Music e está prestes a lançar um disco de estreia que, se tudo der certo, o transformará num astro do R&B.
Está escrito.
O plano, aparentemente, é fazer de Drake um novo Usher, um novo The-Dream, um novo sexymothafucker (e é provável que isso aconteça). Mas, é claro, não é por isso que você precisa conhecê-lo.
Dou três motivos:
1. Na mixtape So far gone, lançada no ano passado, a terceira música é uma balada robótica, na linha do Kanye West de 808s and heartbreak, chamada Successful, que virou single e rodou até no VH1. A faixa seguinte é uma versão para Let’s call it off, de Peter, Bjorn and John. Isto é: o sujeito não ouve qualquer coisa.
2. O refrão de Successful (muito simplezinho, até: “tudo o que quero ser é bem-sucedido”) não vem embalado no tom fanfarrão típico dos novos-ricos da black music, mas, surpreendentemente, existe nele uma certa melancolia, como se o intérprete da canção soubesse que o sucesso é doce e amargo.
3. Drake é um ator de 23 anos, ex-astro teen de seriado de tevê. E canadense.
Se nenhum desses argumentos parece suficientemente forte para que você dê uma chance ao moço, então não há nada a ser feito. Provavelmente, o álbum não vai colar. Não é sua praia. Vá por mim. Não perca o seu tempo.
Para começo de conversa, o disco soa conservador: não rejeita um modelo muito típico de R&B, pelo contrário. É quase um disco-de-gênero, songs for the lovers com alguma marra hip-hop. Nada que Kanye West, The-Dream ou Jay-Z não tenham feito. E Thank me later pode até ser ouvido dessa forma: como um álbum pop muito eficiente, coleção de hits, tudo nos devidos lugares, arquive entre Justin Timberlake e Rihanna.
O instigante na história, no entanto, é como Drake pega esse formato industrial e, sutilmente, se apropria dele. Sutilmente. O tom desiludido como o vocalista – que se chama Aubrey Graham – interpretou Successful é a colcha sonora do disco. Um fantasma que está sempre lá.
Há artistas que só se decepcionam com o sucesso lá pelo quarto álbum de estúdio. Pois a primeira música de Thank me later, Fireworks, abre com versos como “o dinheiro mudou tudo” e “meus 15 minutos de fama começaram há uma hora”. Novamente, Drake soa dúbio, na contramão das estrofes: a letra celebra a boa fase, o “sonho”, mas não existe alegria alguma na interpretação. A melodia é mecânica, cheia de lacunas e ecos.
Estranho.
Felizmente, todos os produtores – e são muitos! – parecem entender esse perfil introspectivo do cantor, que vai flutuando sobre névoa de teclados e efeitos metálicos. Nas primeiras faixas (as melhores do disco), não há festa: Drake narra dramas familiares (a separação dos pais, aos cinco anos), decepções amorosas e transformações da idade adulta. O sucesso não cura nada disso, e ele sabe disso. “Do que tenho medo? Isso deveria ser meu sonho. Mas todas as pessoas olham para mim e dizem a mesma merda: ‘você prometeu que nunca mudaria'”, ele desabafa, em The resistance.
A soul music de pesadelo atinge a catarse logo na quarta música, que se chama (olha aí) Over. Nesse ponto, Drake beira a esquizofrenia. “Conheço muitas pessoas que eu não conhecia há um ano. O que aconteceu? Fizemos de tudo ontem à noite, mas não lembro de nada. O que estou fazendo? O que estou fazendo?”, ele pergunta. Em seguida, porém, muda o discurso: “Eu estou me divertindo, estou vivendo a vida, e vou continuar assim até o fim.”
O hit é narrado com uma atmosfera dramática, tensa, que os produtores Boi-1da e Al Khaliq pressionam ao limite. O videoclipe mostra Drake fuzilado por canhões de luz, sozinho em um quarto de hotel.
Já ali, na quarta faixa, dá para concluir que Drake tem o “algo mais” que falta a muitos aspirantes ao trono do R&B: o intérprete paira acima dos produtores, das canções, de tudo. O álbum soa coeso, quase uniforme, porque é um retrato do cantor (ou talvez do personagem que o ator criou para si).
Na segunda metade, esse clima asfixiante das primeiras músicas vai se dissipando, ora em faixas mais animadinhas como Find your love (produzida por Kanye West), ora quando o “padrinho” Lil Wayne entra em cena, em Miss me. Mas até aí o show é de Drake. Em Miss me, o que fica na memória não é o falatório nonsense de Wayne, mas o apelo infantil, carente do vocalista. “Você vai sentir minha falta quando eu for embora?”, ele pergunta.
Superprodução programada para cumprir expectativas de uma indústria, Thank me later equivale a uma fita de fantasia dirigida por Sam Raimi: sob os efeitos especiais, há um coração que bate.
Primeiro disco de Drake. 14 faixas, com produção de Lil Wayne, Birdman, 40, Al Khaliq, Boi-1da, Crada, Francis and the Lights, Jeff Bhasker, Kanye West, No I.D., Omen, Swizz Beatz, Timbaland e Tone Mason. Lançamento Universal Music. 7.5/10
Mixtape! | O melhor de março
Como diria B.B. King, a mixtape de março é for the ladies. Uma jukebox muito fina, ocasionalmente delicada (e fofa, em alguns trechos). Sei que esta afirmação pode parecer muito arrogante, mas não sou de guardar segredos: é a melhor coletânea amadora de todos os tempos.
Vocês não acreditam em mim, não é? Então aguardem.
O meu disco favorito de março é, aliás, de uma dama muito fina e valentona: o triplo (triplo? Triplo!) Have one on me, de Joanna Newsom. Mas, como a moça já apareceu na coletânea do mês passado, ela cede lugar ao sujeito estranho da foto acima: Dan Snaith, Mr. Caribou, é o autor do segundo grande disco de março: o flutuante Swim, que (lá vai outro segredo!) já entrou na minha lista dos 10 de 2010. Não sou o único fã: os bróderes doFranz Ferdinand rodou quatro faixas do disco antes do show que fizeram aqui em Brasília. E neles vocês confiam, não é? Pois é.
Mas vamos logo à melhor mixtape amadora de todos os tempos, ok? Reconheço que essas águas de março são até calorosas. Eu estava ouvindo as coletâneas dos meses anteriores e notei que são todas um tanto deprês, coisinhas tristes (mas muito bonitas, é claro). Resolvi juntar algumas músicas que não estragassem o nosso dia – e que, nos momentos mais elétricos, servissem para adeptos de bicicletas ergométricas e outros aparelhos de ginástica.
Foi com esse espírito saúde-é-o-que-interessa que comecei a definir as faixas. Mas aí percebi que, nas minhas mixtapes, tristeza é acorde maior. Essa minha tão típica indecisão resultou num CD em três movimentos: ele começa bem sacolejante, se embrenha numas guitarradas ruidosas e termina feito sussurro. Importante: soa escancaradamente agradável do início ao fim. Tem o lamento (muito tocante) de Rufus Wainwright, os adoráveis bebuns do LCD Soundsystem e do Drive-By Truckers, além de MGMT, Gorillaz, Lightspeed Champion, jj (com uma homenagem arrepiante ao Lil Wayne e ao The Game), She & Him…
Para manter uma certa discrição, a lista de músicas está ali na caixa de comentários (espero que os arquivos durem um pouco mais do que os anteriores). Sugiro que vocês ouçam o CD na ordem que eu defini. Garanto que desse jeito (e apenas desse jeito) ele fazer sentido.
Faça o download da mixtape de março aqui (ou, se preferir, aqui).
2 ou 3 parágrafos | Franz Ferdinande!
Depois de ter escrito um caminhão de abobrinhas sobre os shows do Guns N’ Roses e do a-ha, me sinto na obrigação de contar alguma coisa sobre a passagem diabólica (explico: fazia um calor infernal) do Franz Ferdinand por Brasília. Acontece que – a-há! – não tenho muito a dizer sobre a performance dos rapazes. Isso me deixa um pouco incomodado, já que foi um show muito, muito bom.
Não deixa de ser um negócio estranho: por que, no day after, bateu uma certa apatia. Teria sido um show apenas correto? Não pode: o Franz é uma das bandas mais precisas do mundo. Tudo está no lugar certo — o carisma do vocalista (que dá chutes no ar e sorri quando o fã salta do palco num mosh desengonçado, e diz ‘Franz Ferdinande!’ com sotaque carioca), o entusiasmo do baterista, os incríveis macetes do guitarrista (que manda muito bem nos sintetizadores), as jams hipnóticas (se bem que a batucada de Outsiders, marca registrada deles, já está virando um tique), o namorico com a dance music, o baixo pesadão, os hits poderosíssimos, a atitude invariavelmente cool (antes do show, eles aqueceram o público com quatro faixas do disco novo do Caribou!)…
De onde vem meu incômodo, então? Talvez tenha sido culpa do set list meio torto, que queima todos os hits bem antes do bis. Ou do uso desleixado do telão, jogado às traças. Ou nada disso. Talvez minha birra resulte de uma espécie de choque térmico: depois dos excessos (sentimentais, pirotécnicos, patéticos) do Guns N’ Roses e do a-ha, o Franz me pareceu carne crua, hambúrguer sem ketchup, biscoito sem recheio de marshmallow. Mas do que estou reclamando? É o que dá cair de barriga no século 21, sem asa delta. A filosofia da geração desse quarteto (e do Strokes, e do White Stripes) é podar a penugem e ir ao osso da canção, da atitude, da encenação, da pose (e há pose sim, como não?). O show deles deixou essa imagem: é ossudo. Cálcio à beça. Símbolo de uma época. E, possivelmente, um espetáculo que deveria ter feito de mim um sujeito realizado. Mas não foi bem o que aconteceu — e é bizarro, acreditem, não saber por que.