Guerra ao terror

Os melhores filmes de 2010 (10-1)

Postado em Atualizado em

Bem-vindos ao top  10 de 2010.

Aos que chegaram agora, devo lembrar que este ranking inclui tão somente filmes que foram exibidos no circuito brasileiro de cinemas em 2010. Nada de trapaças, portanto.

E aí vocês vão fazer birra: mas Tiago, e agora, cadê o tio Boonmee? Calma lá. Antes da lista, cumprindo a promessa que fiz ontem, preparei um top 10 especial com os meus preferidos de 2010 entre os filmes que não entraram no circuito. Para mostrar que não guardo rancor, nada de eleger os piores filmes do ano. Pelo menos não por enquanto (ok, o campeão é Preciosa).

Os 10 que não entraram em cartaz: 1. Tio Boonmee, que pode recordar suas vidas passadas (Apichatpong Weerasethakul), 2. Mistérios de Lisboa (Raul Ruiz), 3. Cópia fiel (Abbas Kiarostami), 4. O estranho caso de Angélica (Manoel de Oliveira), 5. Somewhere (Sofia Coppola), 6. Homens e deuses (Xavier Beauvois), 7. O mágico (Sylvain Chomet), 8. Minha felicidade (Sergei Loznitsa), 9. As quatro voltas (Michelangelo Frammartino), 10. Armadillo (Janus Metz).

Agora, voltando ao mundo real, os primeiros da fila:

10 | Vincere | Marco Bellocchio

Bellocchio vê no fascismo um bombardeio de imagens: são panfletos, slogans, palavras de ordem, paixões, cenas de cinema que nos hipnotizam e atropelam. Um melodrama político dirigido com autoridade – e 40 graus de febre.

9 | Mother – A busca pela verdade | Madeo | Bong Joon-ho

Joon-ho quebra sutilmente as nossas expectativas (e um modelo de cinema policial) ao narrar uma trama de investigação pelo ponto de vista de uma personagem incapaz de analisar imparcialmente as pistas do crime. Um thriller maternal.

8Machete |Robert Rodriguez e Ethan Maniquis

O faroeste sangrento (e alucinado) de Robert Rodriguez é arte juvenil com alvos sérios. Quase nenhuma instituição norte-americana sobrevive ao herói bronco de Danny Trejo, orgulho latino.

7Ilha do medo | Shutter island | Martin Scorsese

Como se voltasse aos tempos de New York, New York, Scorsese cria um mundo artificial que está sempre prestes a ruir diante dos nossos olhos. É tudo ilusão. Não devemos, por isso, confiar totalmente nas imagens. Muito menos no narrador da trama.

6Guerra ao terror | The hurt locker | Kathryn Bigelow

Filmes de guerra nos chocam e perturbam, mas este parece ter outro desejo: com uma câmera curiosa, Bigelow quer apenas em identificar o que os soldados fazem, como fazem e por que. As respostas não são simples.

5 | Ponyo – Uma amizade que veio do mar | Hayao Miyazaki

Antes de um “filme infantil”, a criação de Miyazaki é um mergulho na imaginação das crianças. Sem barras de segurança (ou didatismo; aprenda aí, Christopher Nolan). Uma fantasia em tom pastel, uma fofura, e mais surreal do que qualquer brinquedo da Pixar.

4 | Film socialisme | Jean-Luc Godard

Podemos definir dezenas de itinerários para navegar neste novo filme caseiro de Godard. Eu, que preciso fazer a viagem novamente (o discurso me pareceu um enigma), por enquanto me deixo levar pelo poder superficial das imagens: o sublime num colorido digital.

3 | À prova de morte | Death proof | Quentin Tarantino

Uma homenagem aos filmes baratos exibidos em cinemas vagabundos, certo? Para mim, é o filme em que Tarantino desossa o próprio estilo até encontrar sua matéria fundamental: as palavras, a ação, a graça, o horror e o cinema. Nervos à mostra.

2Vício frenético | Bad lieutenant – Port of call: New Orleans | Werner Herzog

Esqueça que este filme nos foi vendido como um remake picareta. Não: ele é um documentário sobre a viagem de Werner Herzog a New Orleans, guiado por um ensandecido Nicolas Cage, aos becos de uma América alagada, despedaçada. Quem encarou como uma fita policial B perdeu o que ela tem de melhor: o olhar enojado de um cineasta que, como de costume, não se esquiva.

1 | Sempre bela | Belle toujours | Manoel de Oliveira

Os filmes de Manoel de Oliveira me parecem ao mesmo tempo cristalinos (a encenação está sempre visível) e misteriosos. A continuação de A bela da tarde, de Buñuel, ampliou essa impressão de que existe algo estranho, incompreensível, em um ambiente que me parece familiar. Mas por que, se está tudo às claras? Um homem e uma mulher, uma mesa de jantar, e toda uma história do cinema ao redor.

2 ou 3 parágrafos | E o Oscar foi para…

Postado em Atualizado em

Vi o Oscar aos pedaços, pela internet (não sei se perdi muita coisa, perdi?), mas preciso dar duas palavrinhas sobre o resultado. É que me incomoda muito essa conclusão (cada vez mais generalizada) de que a vitória de Guerra ao terror é um soco em Hollywood, um sinal de mudança, uma sandice da indústria. Calma lá. Não é bem o que acontece.

Desde o fim dos anos 80, a Academia aprendeu a lidar com as pressões criadas pelos próprios “independentes”, que passaram a investir em campanhas mais agressivas para emplacar produções e aquisições no Oscar (e o maior exemplo é a Miramax). Mas, já no fim dos anos 90, quando a própria Miramax já tinha sido comprada pela Disney, o conceito de independência ficou nebuloso. O que diferencia verdadeiramente esses filmes daqueles validados pelos grandes estúdios? Quem quer ser um milionário, Juno e Pequena Miss Sunshine, todos com o selo da Fox Searchlight (setor de um estúdio enorme), devem ser classificados como indies? E essa classificação, o que representa hoje além de um valor de marketing? Lembro de uma entrevista que fiz com o Todd Solondz, de Felicidade. “O único cineasta independente é o George Lucas, que controla todo o processo de produção dos próprios filmes”, ele comentou. É por aí.

Guerra ao terror é uma fita distribuída nos Estados Unidos pela Summit Entertainment, uma “pequena empresa” que lançou Crepúsculo e Lua nova. Me pergunto que, se num ataque de loucura dos integrantes da Academia, uma vitória dos vampiros adolescentes teria provocado manchetes em defesa dos independentes. Aposto que não. O que me interessa mais é notar como, nos últimos anos, a Academia tenta usar a (muitas vezes falsa) ideia de autenticidade associada aos “pequenos filmes” para recuperar prestígio e simular a aparência de uma festa relevante e séria, comprometida com um cinema supostamente adulto e legitimado pela crítica. Guerra ao terror cumpre todos esses requisitos. E (ainda que, no contexto, este seja um detalhe) calha de ser um belo filme.

2 ou 3 parágrafos | Indicados ao Oscar

Postado em

Bateu um pouco de saudade do tempo em que eram cinco os indicados ao Oscar. Havia os favoritos (no máximo dois, geralmente um), os que perderiam com alguma dignidade (no máximo dois) e os que entravam na lista pra fazer figuração. Agora vemos esse elenco de sempre acompanhado de cinco candidatos que aparecem meio que largados no subsolo, na classe econômica da premiação, totalmente fora de cena.

Não entendi a graça da brincadeira (claro, são 10 os estúdios na briga pelo Oscar de melhor filme, e aposto que todos ficaram muito satisfeitos com a partilha), mas seria interessante se a Academia inventasse o ‘Oscar B’, destinado à disputa entre Distrito 9, Um homem sério, Um sonho possível, Educação e Up – Altas aventuras.

E, como um amigo meu bem notou, dá para dividir os indicados também entre os filmes de guerra (Avatar, Hurt locker, Bastardos inglórios, de alguma forma Distrito 9) e aquelas obras supostamente inspiradoras com lições de superação/perseverança (Amor sem escalas, Up, Educação, Preciosa e Um sonho possível, que vi agora mesmo e é tão pueril que parece ter sido feito pra meninos de cinco anos). Um homem sério, que nem é algo tão atípico ou provocativo assim, fica parecendo até uma pedra na garganta da Academia. Uma disputa não tão interessante (de qualquer forma, estou começando a apostar na vitória de Hurt locker), mas gostei de ver A teta assustada na lista de filmes estrangeiros. Nem por ser sul-americano, ou peruano. Mas por fugir completamente daquele padrão careta de telefilme que as comissões de seleção brasileiras acreditam interessar a Hollywood. Olha lá: não é bem assim.