Dois ou três parágrafos

2 ou 3 parágrafos | Amor a distância

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Amor a distância (1.5/5) é uma comédia romântica sobre uma jornalista estabanada (Drew Barrymore) e um olheiro de músicos independentes (Justin Long) que foram feitos um para o outro: eles curtem fliperama, são enciclopédias ambulantes de cultura pop (mas enciclopédias muito descoladas), têm amigos insuportáveis, adoram os anos 80 e… E é basicamente isso. O que interessa, no caso, é que eles se apaixonem e decidem, quatro semanas depois do primeiro encontro, enfrentar um namoro a distância. “Vamos ficar juntos?” “Vamos!” “Quero te encontrar” “Eba!” Etc. Ele mora em Nova York. Ela mora na Califórnia. E leva um tempão para ir de um lugar a outro.

Eu, que sou phD nesse tipo de sandice amorosa, entendo o drama dos personagens. Talvez entenda mais do que o próprio roteirista do filme, que trata o impasse como motivo para criar complicações e gracinhas muito típicas de comédias românticas. Exemplo: o rapaz quer transar, a namorada quer transar, as passagens aéreas custam caro, eles resolvem transar por telefone e o arranjo termina numa imensa trapalhada. Ha-ha. Outro exemplo: o rapaz vai encontrar a namorada, eles se atracam na maior euforia, eles transam na mesa da sala, a luz acende e tem um sujeito gordo fazendo uma refeição na mesa. Ha-ha. E é por aí.

Eu vou escrever um filme sobre amor a distância. Estou começando. Estou começando hoje. Não sei como será, mas estou certo de que farei um filme muito diferente desse aí. Um filme muito mais aflitivo. Com mais cenas silenciosas. Com ligações telefônicas silenciosas (vocês imaginam o horror que há nisso?). Com incertezas, frustrações e voos que atrasam e aeroportos frios e chuva e a sensação de que nada vai se acertar. Com fins de semana ruins. E um desfecho menos conveniente, talvez mais triste, possivelmente mais realista, um tantinho otimista. Mas diferente desse aí. É que, pra começo de conversa, namorar a distância é fita de terror. É thriller. É suspense psicológico. É qualquer coisa, menos comédia.

2 ou 3 parágrafos | Lunar

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Desde o lançamento de Avatar, ouço a reclamação de que, apesar de todo o deslumbramento visual, o filme de James Cameron tem um problema: a trama é fraca. A esses, indico Lunar (Moon, 6/10), uma ficção científica muito engenhosa — mas que, pelo menos na tevê lá de casa, não pareceu nem um pouco hipnótica.

Duncan Jones, o diretor (e filho de David Bowie), tenta uma provocação sobre a ética da ciência. Para isso, joga com as expectativas do público, que fica meio perdido entre personagens que, isolados numa estação espacial, podem ou não ser clones. Como reconhecer um ser humano?, eis a questão. Sam Rockwell embarca no delírio solitário como quem tenta superar o Robert Duvall de THX 1138.

As ideias são até atraentes; o visual, old school (e, como Avatar, Jones cita um punhado de fitas de ficção científica, de 2001 a Alien). Mas me incomoda a falta de domínio da narrativa, a dificuldade de traduzir as filosofices em situações vivas, fortes, singulares. Parece até que a trama está emperrada, embolada. E, se é assim, do que adianta uma trama supostamente complexa? Em matéria de clareza e fluência, ninguém tem muito a reclamar de James Cameron. E me parece um erro essa história de confundir ficção científica inteligente com ficção científica que, às custas da nossa paciência, se faz de inteligente. São duas coisas bem diferentes. De aparente simplicidade, o mundo de imagens criado em Avatar me parece mais autêntico.