Crises
Superoito express (32)
The age of adz | Sufjan Stevens | 8.5
Quem ouve apressadamente este The age of adz pode ficar com a impressão de que Sufjan Stevens escolheu um itinerário semelhante àquele que M.I.A. e MGMT tomaram recentemente: a aventura da autosabotagem. Afinal de contas, esta zoeira de ruídos eletrônicos, orquestrações pomposas e arranjos sinuosos é o sucessor de Illinois (2005), o disco que fez de Stevens uma espécie de Colombo indie. Uma parte numerosa do público, que não acompanha os “projetos paralelos” do músico, possivelmente ainda espera dele uma nova fornada de crônicas americanas narradas com uma caligrafia delicada e pessoal. Esses continuarão esperando, já que The age of adz é um desvio de rota.
Se Illinois era uma viagem de dentro para fora (o homem investiga o país e se enxerga nele), The age of adz se volta a um território sentimental, íntimo. Viagem ao redor do próprio quarto. Mas, ao contrário do EP All delighted people (que apontava para a sutileza folky de Illinois e especialmente de Seven swans), The age of adz envolve essas confissões de Stevens numa colcha de excessos – com barulhinhos, coros angelicais e furacões de sintetizadores -, numa explosão cósmica que nos atira diretamente ao buraco negro do prog rock dos anos 70.
Quanto mais ouvimos o disco, mais fica claro que a provocação não é gratuita – ele não foi planejado como um suicídio comercial, mas como afirmação de princípios. É como se as faixas, quase sempre incontroláveis, refletissem um compositor de pulsos abertos, afetado por decepções amorosas (e I walked é uma canção de despedida muito direta e tocante), desejo de espiritualidade (Get real, get right), medo da passagem do tempo (Now that I’m older) e outras crises que se enfrenta aos 35 anos. A reação de Stevens a esse cataclisma informa a música que ele produz, mais tensa e caótica do que de costume: The age of adz vai desagradar a quem o conhece como o bom-moço capaz de escrever melodias agradáveis que inspiram publicitários e fãs de Belle and Sebastian; e vai confirmar a fé dos que procuram em Stevens um artista.
Pop negro | El Guincho | 7
Pop negro soa como o “lado A” de Alegranza! (2008), um disco mais labiríntico (e que me parece mais denso e interessante) do que este aqui. O espanhol Pablo Diaz-Reixa continua combinando loops siderados como um legítimo herdeiro do Animal Collective, mas desta vez ele usa esse método a serviço da sensação de conforto e euforia que se espera de um disco pop. É um álbum que, por isso, deve até incomodar os fãs do anterior – muitas das canções soam como remixes nada radicais para o repertório do Mutantes ou de bandas como Café Tacuba e Aterciopelados. Dito isso (e quebrada essa resistência em relação ao disco), o que fica é a ótima impressão de que Pablo sabe como extrair o sumo de boas canções comerciais e contaminá-lo com psicodelia. É uma festa boa, quente, e que não nos aborrece em momento algum. E ela termina tão rapidamente que dá vontade de ficar ouvindo o disco sem parar.
Maximum Balloon | Maximum Balloon | 6
Um disco criado para nos provar que Dave Sitek (o “cientista louco” do TV on the Radio) também curte a vida adoidado. Não que ele consiga nos convencer totalmente disso (o pop “desencanado” do sujeito se revela tão engenhoso, tão excessivamente maquinado quanto qualquer outra coisa que ele produziu), mas consegue algo raro em discos superpovoados por participações especiais: ele dá ao som do Maximum Balloon uma unidade forte, como se adaptasse as referências do TV on the Radio (Bowie, Byrne, pós-punk) ao clima febril de uma pista de dança. Agora é esperar que, nos próximos discos do projeto, ele consiga usar essa sonoridade para criar canções tão boas quanto Young love, das poucas que me interessam aqui.
Postcards from a young man | Manic Street Preachers | 6
Depois de reencontrar a fúria (e a ansiedade adolescente) no ótimo Journal for plague lovers (2009), o Manic Street Preachers retorna ao ponto em que haviam parado em Send away the tigers (2007). Isto é: de volta às tentativas de fabricar rock de arena, comercial até a costela, com alguma dignidade. Sabemos que, nesse aspecto, eles não têm noção de limites: daí momentos constrangedores como Hazelton Avenue, que rouba o riff the It ain’t over til it’s over, de Lenny Kravitz. Mas o disco anterior parece ter energizado a banda, que parece mais confiante do que nunca na luta para voltar ao trono do britrock. Quantos euros o Bon Jovi pagaria para escrever uma canção como (It’s not war) Just the end of love? De volta à realidade, pois.
Mixtape! | O melhor de agosto
A mixtape de agosto é um break-up record. É isso e nada além disso. Um disco de separação, mal-me-quer, fim de caso, pé-na-bunda, etc. Mas não o tipo de break-up record que fica chorando pelos cantos e chutando latinhas. Nada a ver. Estamos falando de um modelo mais realista de break-up record.
É que, à vera, as separações contêm uma série de sentimentos conflitantes que não aparecem num típico break-up record. E por que isso acontece? É que a impressão de coerência às vezes serve à arte – mas quase nunca às nossas vidas ó tão caóticas.
Então taí. Esta mixtape usa algumas músicas que ouvi no mês de agosto para formar um catálogo de sensações que mapeiam o fim de um relacionamento amoroso. Pela ordem: ódio, leve euforia, melancolia, rancor, sutil desejo de recuperação, leve recuperação (acompanhada de bebedeiras irresponsáveis), doce nostalgia, fúria, tristeza e, finalmente, depressão (que as coisas costumam terminar mal, vocês sabem).
E essa não é, de forma alguma, uma desculpa bolada às pressas para justificar uma mixtape esquizofrênica.
Não é. Ouça uma vez e ouça novamente. Na primeira audição, provavelmente você tratará este CD como qualquer bobagem. Na segunda, ele vai começar a criar teias no seu coração. Na terceira, você entenderá que é a melhor mixtape que encontrou neste site. Em todos os tempos. A melhor. Ou pelo menos a mais humana.
Lá dentro, pulsam canções do Of Montreal (que gravou o disco preferido do mês, False priest, e por isso aparece na foto meio bizarra lá de cima), do Ra Ra Riot, do Royksopp, do Villagers, do Stars, do Curren$y, do Eels, do Thermals, do Sufjan Stevens e do Matthew Dear.
É, no mais, uma mixtape pequenina, de uns 30 e poucos minutos, para compensar os excessos do mês passado. Pequenina mas nunca desprezível ou simplezinha. Grandes surpresas num pequeno pacote.
As mixtapes deste site passam por um rigoroso controle de qualidade e, por isso, precisamos da sua opinião para manter um bom atendimento. Traduzindo: este é o post em que você vence a sua timidez e escreve um comentário bem bonito. Ok?
A lista de canções, como de costume, está logo ali na caixa de comentários. Faça o download da mixtape de agosto aqui ou aqui.