Body talk
Os melhores discos de 2010 (10-1)
Vamos ao top 10?
Não necessariamente os 10 Melhores Discos de 2010 (admito que o título do post ficou um pouco blasé: é pra chamar atenção no Google), mas aqueles que provocaram reações felizes neste blog e, simplificando de vez a metodologia, fizeram de 2010 um ano um pouco menos frustrante para o blogueiro que escreve estes posts confusos. Um sujeito que acha que entende sobre alguma coisa e que, de janeiro pra cá, sofreu um bocado.
Antes, as menções honrosas, para ouvir antes de morrer (em ordem alfabética): American slang, The Gaslight Anthem; Before today, Ariel Pink’s Haunted Graffiti; Broken dreams club, Girls; Cosmogramma, Flying Lotus; The fool, Warpaint; Forgiveness rock record, Broken Social Scene; Gorilla manor, Local Natives; Grinderman 2, Grinderman; Hidden, These New Puritans; IRM, Charlotte Gainsbourg; Pilot talk, Curren$y; Public strain, Women; Treats, Sleigh Bells.
E, coming soon, a lista dos 20 melhores filmes de 2010 e, se tudo der certo e eu cumprir o meu cronograma apertado, os 10 discos brasileiros do ano. Mas não prometo nada, ok?
10 | The age of adz e All delighted people EP | Sufjan Stevens
I should not be so lost… But I’ve got nothing left to love – ‘I walked’
Sufjan no furacão (ou: a crise dos 30). “Quanto mais ouvimos o disco, mais fica claro que a provocação não é gratuita – ele foi criado como uma afirmação de princípios. É como se as faixas refletissem um compositor de pulsos abertos, afetado por decepções amorosas, desejo de espiritualidade, medo da passagem do tempo e outras crises que se enfrenta aos 35. A reação de Sufjan a esse cataclisma define a música que ele produz hoje, mais tensa e caótica do que de costume.” (14 de outubro, texto completo)
9 | The Monitor | Titus Andronicus
The enemy is everywhere – ‘Titus Andronicus forever’
Um épico americano, em lo-fi. “Um disco imenso e valente, que cria uma atmosfera de filme de época (sobre a Guerra Civil) para se aventurar na América de hoje. Nunca sem paixão, o Titus Andronicus entende os desafios de uma banda de rock independente: aproveitar as liberdades do mercado para brincar com as convenções, experimentar, criar monumentos de areia — nem que apenas para procurar um tipo diferente de diversão” (12 de fevereiro, texto completo)
8 | The ArchAndroid (Suites II and III) | Janelle Monáe
It’s a cold war… You better know what you’re fighting for – ‘Cold war’
Janelle, nossa heroína. “Sem querer forçar comparações absurdas (mas já forçando), a estreia de Janelle Monáe soa como se tivesse sido criado por uma menininha que, sem contato com os produtos mais mecânicos do pop, ouviu um disco dos Beatles (ou do Frank Zappa, ou do Love, ou uma ópera-rock do The Who) e decidiu escrever algumas canções. Nos 68 minutos de duração, a palavra que quica é liberdade.” (27 de maio, texto completo)
7 | Body talk | Robyn
Get a heart made of steel ‘cause you know that love kills – ‘Love kills’
Agonia e êxtase. “Robyn entende o que há de mais poderoso na música pop: cumplicidade e catarse. Com arranjos introspectivos, este seria um dos discos mais melancólicos da temporada (reparem nos versos sobre amores perdidos, crises de identidade, depressão e solidão). Mas o clima é festivo de doer. Os minidiscos são de provocar dependência química, mas este aqui é grande disco pop do ano.” (9 de dezembro, texto completo)
6 | Halcyon digest | Deerhunter
Walking free… Come with me… Far away… Every day – ‘Desire lines’
Um álbum de memórias, sobre juventude, mas Bradford Cox ainda vive cada disco como se não houvesse amanhã. “O vocalista se exibe em quase todas as canções. Ora melancólico (quase suicida), ora eufórico, otimista. Em todos os casos, leva às gravações um discurso franco, sem corretivos, que nos toma pelos braços. Somos cúmplices. Pode ser encenação – mas, nesse caso, a técnica só valoriza um álbum que soa como os posts desesperados (e ansiosos, e por vezes apressados) de um blogueiro que ouviu demais.” (20 de setembro, texto completo)
5 | The Suburbs | Arcade Fire
Sometimes I can’t believe it, I’m moving past the feeling – ‘The Suburbs’
Um grande disco de rock dos anos 70 para as tardes silenciosas da minha juventude. “O discurso do Arcade Fire se infiltra em nossas vidas, em nossas lembranças, em nossas aflições. Não existe conclusão em The suburbs porque nossas vidas também são imprecisas. E, se o disco parece se movimentar em círculos (com trechos de melodias e de versos que se repetem), é que estamos sempre retornando às nossas casas, aos nossos antigos problemas, aos nossos sonhos mortos, às nossas frustrações e à nossa adolescência.” (27 de julho, texto completo)
4 | Teen dream | Beach House
It is happening again – ‘Silver soul’
Jornada delicada sonho adentro. “Este é um daqueles álbuns em que uma pequena banda adapta um estilo sólido a certas convenções do pop rock. Soa como um problema? Não quando essa pequena banda está disposta a usar um ou outro truque para facilitar nosso acesso a um mundo ainda sutil, ainda misterioso. Que me perdoem os mais radicais: à luz rósea do pop, a história do Beach House fica ainda mais bonita.” (26 de dezembro de 2009, texto completo)
3 | Have one on me | Joanna Newsom
Hey, hey, hey, the end is near. On a good day you can see the end from here – ‘On a good day’
Visões de Joanna (num disco onde, se aceitarmos o convite, podemos morar por um bom tempo). “A sensação de liberdade, de não dever satisfações ou se obrigar a algum tipo de obrigação, contamina de tal forma este álbum triplo que, lá pelos 60 minutos de viagem, tudo o que eu consigo ouvir nele é beleza bruta, beleza estranha, beleza sutil, beleza que emociona, beleza nos detalhes mínimos, beleza que não se sabe de onde vem, beleza inclassificável, beleza difícil, beleza insuportável. Outra beleza.” (2 de março, texto completo)
2 | Expo 86 | Wolf Parade
A little vision come, come shake me up – ‘Ghost pressure’
Quatro velhos amigos numa sala (enquanto o mundo pega fogo). “Quando fazemos algum esforço, conseguimos visualizar, entre uma faixa e outra, uma banda correndo dentro do estúdio, excitadíssima com as próprias canções, com pressa para gravar, mixar, concluir o trabalho e mostrar-nos o resultado. É, apesar dos versos ainda muito agoniados, um disco que sorri para si mesmo e para o público. Nada como o som de uma banda de rock no auge, feliz com a imagem refletida no espelho” (16 de maio, texto completo)
1 | My beautiful dark twisted fantasy | Kanye West
We’re going all the way this time – ‘All of the lights’
No mundo parelelo de Kanye West, discos pop ainda nos deslumbram e espantam, ainda nos levam a lugares onde nunca estivemos. “A angústia de West, para nossa surpresa, acaba por energizar o disco, já que ele compõe e grava como se estivesse à beira do precipício. Como se houvesse apenas mais uma chance (não é o caso, mas o sujeito é uma pilha de nervos). Em sua discografia, não existe um outro disco que aposte tantas fichas, que mire tão alto e que tome caminhos tão arriscados. As faixas são grandiosas por birra, não por necessidade. Muitas delas caberiam em três minutos de duração. Mas West as alonga para explicitar o que têm de desconfortável. Uma obra-prima.” (16 de novembro, texto completo)
Superoito express (34)
Tron: Legacy | Daft Punk | 6.5
Pode soar como uma trilha sonora muito funcional, daquelas que só fazem sentido quando anexadas às imagens do filme. Mas é um disco mais engenhoso do que isso: como de costume, o Daft Punk vai ao laboratório e altera a composição de gêneros já muito conhecidos. Em Discovery, a matéria-prima era a disco music. Em Human after all, os riffs de hard rock. Agora, a pompa cinematográfica de maestros como Maurice Jarre e Vangelis.
A orquestra de 85 integrantes não intimida os nossos robôs favoritos, que vão alternando elementos de música erudita com a eletrônica mais comercial. O mix não soa agressivo, pelo contrário (a sensação é de que já ouvimos esta trilha outras vezes), mas a ideia de recombinar vários clichês de soundtracks explica muito sobre os métodos da dupla. As faixas aterrissam aceleradamente – às vezes desembarcam sem que as notemos. Quase impossível amá-las. Mas brilham feito vagalumes.
Body talk | Robyn | 8.5
Quando escrevi sobre os dois ótimos minidiscos que Robyn lançou durante o ano, comentei que, unidos num mesmo pacote, eles dariam no grande álbum pop de 2010. Pois bem: aí está ele. As novas faixas deste Body talk redux podem não provocar dependência química, mas o set já soa como greatest hits. Pelo menos 80% das músicas entende o que há de mais poderoso na música pop: cumplicidade e catarse. Com arranjos introspectivos, seria um dos discos mais melancólicos da temporada (reparem nos versos sobre amores perdidos, crises de identidade, depressão e solidão). Mas o clima é festivo de doer. Blood on the dancefloor.
Come around sundown | Kings of Leon | 5.5
Remete aos dois primeiros discos da banda — sob uma brisa de country rock setentista —, mas o Kings of Leon continua gravando álbuns que me parecem unidimensionais: uma única ideia não muito particular aplicada repetidas vezes, com um estilo reto, plano, “honesto”. Ainda não me convence, mas fico muito satisfeito que eles tenham abandonado alguns dos artifícios dos álbuns mais recentes, principalmente aquele verniz genérico de “modern rock” que os transformou quase que numa boy band. De qualquer forma, aposto que muitos dos fãs vão tratar este disquinho amarelado, despreocupado, como uma pausa para admirar a paisagem. Tem lá alguma beleza.
Happiness | Hurts | 5
Uma estreia que sofre de excesso de informação, como se cada faixa tivesse a obrigação de servir como carta de intenções para a banda. Pior é quando se nota que a banda em si nada tem de extraordinário: apesar do hype da imprensa britânica, o duo de Manchester não é o primeiro (nem será o último) a atualizar o synthpop dos anos 1980 — no caso, mais para New Order do que para Pet Shop Boys. Três singles muito fortes (Wonderful life é daqueles que não se esquece nunca), mas deixa a sensação de que eles ainda precisam encontrar alguma tesouro no mar de purpurina. De qualquer forma, confirma a tendência da imprensa inglesa para superestimar projetos imaturos.