Blitzen Trapper
Mixtape! | O melhor de junho
A mixtape de junho é mais ou menos (eu disse mais ou menos) um passeio na praia. A de maio, vocês lembram, era ruidosa e fantasmagórica. Desta vez, eu queria um pouco de leveza.
É claro: não encontrei o que eu estava procurando.
Mas encontrei mais ou menos isso, o que é raro. O mês de junho foi estranho. Ouvi muitos discos, mas poucos grandes discos. E álbuns de gêneros muito diferentes, daí a dificuldade de montar uma coletânea coesa. Quando percebi que seria impossível, relaxei.
Me vi obrigado, então, a descartar as canções de um dos melhores discos desse período, Before today, do Ariel Pink’s Haunted Graffiti. E encontrei uma brecha (aos 45 do segundo tempo) para o meu favorito, Public strain, do Women (e são eles na foto ali em cima). Teenage Fanclub, The-Dream e Major Lazer foram alguns que ficaram de fora.
É a vida.
Gravei o CD e, só depois, descobri que ele contava uma historinha. Que vai assim: era uma vez sujeito muito agoniado que pegou os dois filhos pequenos pelo braço, acomodou os petizes no carro e saiu para um rolê na praia. Os três beberam água de coco, tomaram banho de praia, tostaram ao sol, olharam as gaivotas e, no fim da tarde, quando voltaram para casa, o sujeito percebeu que a vida continuava triste. The end.
Traduzindo: o disquinho começa com um desabafo mui tenso da nossa serelepe Robyn, depois cai dentro da fofura mórbida do The Drums, e aí o sol abre um pouco (mas nem tanto, vemos nuvens aqui e ali) com The Black Keys, The Roots, Blitzen Trapper, tudo num clima gostoso de rádio FM. Aí bate um pouco de melancolia (que ninguém é de ferro) na interpretação dodói do Record Club (St. Vincent + Beck + Liars + Mutantes) para Never tear us apart, do INXS. Que é uma coisa fofa.
Depois de um entardecer ao som de Arcade Fire, a noite vai chegando e escurecendo tudo: Menomena e Drake. Na volta para casa, Women. A despedida deprê é com o How to Destroy Angels. E the end.
Aposto que você vai ouvir pela primeira vez e pensar: “é a mixtape mais frouxa do ano”. Lá na terceira audição, você vai reconsiderar a opinião e concluir que esta é uma das melhores mixtapes que você ouviu. As primeiras impressões podem ser cruéis, vá por mim.
Um alerta: não a ouça enquanto faz exercícios físicos. Tentei e não funciona. Nesse caso, prefira a mixtape de maio.
E, se possível (é possível, vá!), comente algo sobre o que você ouviu. Nem que seja um “esta mixtape está bem mais ou menos“. A tracklist tá logo ali, na caixa de comentários.
Faça (hoje mesmo!) o download da mixtape de junho: aqui ou aqui.
Superoito express (na Copa)
Destroyer of the void | Blitzen Trapper | 6
Bem, amigos do blog. A rodada de hoje começa com um time da segunda divisão que, após uma temporada de passes escandalosamente criativos (o ano de 2007, quando eles lançaram o surpreendente Wild Mountain Nation), assinou com um patrocinador parrudo (a Sub Pop) e, numa derrapada inexplicável, amargou partidas chochas, quase sempre à mercê de táticas supostamente “clássicas” (Furr, de 2008, não é digno de campeonato mundial). Em 2010, ele ainda soa como uma promessa que quase chegou lá, uma Dinamáquina empenada – um time que poderia ter erguido o caneco, mas que hoje desfila tímido e quase burocrático dentro das quatro linhas.
Destroyer of the void, com esse título pomposo, é uma seleção de jogadores que, quanto mais tentam reverenciar os mestres (Grateful Dead, Rolling Stones), mais demonstram que ainda estão a milhas do futebol-arte. Sebo nas canelas, rapazes! Falta muito treino, muita concentração, muito feijão-com-arroz para marcar um golaço elegante na tradição de Wild horses, dos Stones (eles tentam mais ou menos três vezes, sem sucesso). Ainda assim, é curioso (e uma pena! Antifutebol!) que eles queiram abandonar as divertidas peladas de outros tempos para se transformar em um time tático, correto, eficiente (quando muito) e que briga pelo empate. Poucas jogadas valem o replay, mas, quando esse tipo de milagre acontece, elas enchem os nossos olhos: Laughin lover é um baile, e a faixa-título tem um quê épico (Bohemian rhapsody?) que soa como um chute maior que as pernas. Mas um chute corajoso, ao menos.
Lazerproof | Major Lazer vs. La Roux | 7
Ah, a malandragem dos boleiros! O gol de mão! O juiz ladrão! A violência tão fascinante! Os cartões vermelhos! Os mash-ups mui picaretas! Major Lazer é o nosso Luis Fabiano e, obviamente, o gol chamado Lazerproof é duvidoso e divertidíssimo. Na mixtape, os pivetes Diplo e Switch (que atendem por Major Lazer) saqueiam o repertório da dupla inglesa La Roux (que bate um bolão) em uma seleção bizarra que soa como um encontro entre bambas da Jamaica e da Suécia. Isto é: electropop escorregadio na zaga, hip-hop de centroavante, reggae e dub no ataque. Muitas jogadas emboladas e patéticas, mas você esperava algo diferente disso? O importante é que o ML Futebol Clube cumpre o desafio de segurar nossa curiosidade até os 45 do segundo tempo e (mais espantoso ainda) mantém uma certa unidade que engrandece o álbum. É zebra, mas vai para as oitavas.
…And the Pioneer Saboteurs | Micah P. Hinson | 7
O texano é um talento individual que costuma apresentar uns balés misteriosos, curtidos em treinos secretos, e quase sempre discretos. Daí o susto (bom susto) deixado por esta quarta partida, acompanhada pela banda Pioneer Saboteurs. Antes, Micah se contentava em jogar na obscura divisão dos songwriters de country e folk alternativo. Hoje, ele disputa uma vaga no Mundial com uma estratégia muito mais aberta e moderna, a começar pelos sinistros arranjos de cordas (que perigam assombrar o adversário e render inúmeras vitórias por WO). Um dos modelos do cantor é o craque arredio Tom Waits, e aqui ele consegue encenar umas firulas teatrais muito atléticas, como se estivesse pronto para correr ao meio do estádio, ajoelhar-se no chão, erguer uma caveira e recitar Hamlet. Bonito, barroco, dramático. Aposto que, em alguma poltrona vip, um emocionado Rufus Wainwright lançou um lenço branco ao gramado.
Future breeds | Hot Hot Heat | 5
Depois de uma passagem acidentada pela liga dos campeões (pela Warner, eles lançaram Elevator, de 2005, e Happiness ltd, de 2007), os peladeiros canadenses do Hot Hot Heat voltam à várzea com um disco independente que (como era de se esperar) tenta recuperar a inocência e o frescor dos primeiros passes, dos dribles juvenis, do pé-na-lama, da camisa rasgada, da chuteira esfolada. De nostalgia, no entanto, também vivem as seleções da Itália e da França. Future breeds é assumidamente um disco “sobre a cena punk de Vancouver do fim dos anos 90” (segundo a própria banda), o que me livra de conhecer a cena punk de Vancouver do fim dos anos 90. Apesar do bla-bla-bla, o HHT continua fazendo pop punk com alguns lances sinuosos (o single 2120 é Pixies Esquema Vines), com aquele espírito alegre tão típico das seleções africanas. Mais esquecível, portanto, que discutir estatística em mesa redonda.
Quatro discos e pé na estrada
Na pressão, bem rápido, sem rigor, quase no automático, enquanto arrumo as malas para a viagem a São Paulo.
Another world EP | Antony and the Johnsons | **
A prévia do álbum The crying light, programado para 2009, me deixa dividido. De um lado, é bom saber que Antony Hegarty retorna mais inquieto que aborrecido (a melhor prova de que o sujeito anda uma pilha de nervos é Shake that devil, que parece um blues-rock do Morphine). De outro, as músicas mais novas (entre elas o primeiro single, Another world) repetem quase literalmente os temas e climas do disco anterior, batem na mesma tecla. De uma forma ou de outra, a tristeza não tem fim.
Furr | Blitzen Trapper | **
O sexteto de Portland talvez seja a melhor banda verdadeiramente derivada de Super Furry Animals. Nada errado nisso. Aqui eles provam mais uma vez a disposição de trafegar por praticamente todos os gêneros da música pop sem perder o bom humor. Lançado pela Sub Pop, Furr pode ser menos hiperativo e imprevisível que Wild mountain nation, mas soa tão aventureiro quanto. Se aproxima de um formato que podemos chamar de convencional – mas felizmente ainda não chega lá.
Acid tongue | Jenny Lewis | **
Se o primeiro álbum solo de Lewis, Rabbit fur coat, surpreendia por não contentar os fãs do Rilo Kiley com um típico projeto paralelo feijão-com-arroz (a menos que eles esperassem por uma ode ao gospel), o segundo coloca trata de arrumar as peças no tabuleiro. Acid tongue é nota 10 em comportamento, mais sortido e equilibrado, quase-quase uma Sheryl Crow. E com surtos de soft rock daqueles que encontramos na fase pop do Rilo Kiley (e tomamos como ironia, por falta de opção).
Lightbulbs | Fujiya & Miyagi | **
Quando somou um baterista à formação da banda, o Fujiya & Miyagi avisou que buscava uma sonoridade mais calorosa, mais “humana”. É essa a chave para Lightbulbs. Ainda que o baterista não participe ainda de quase nada, já estamos diante de um álbum de carne e osso, mais para o pós-punk dançante do LCD Soundsystem que para qualquer gênero de eletrônica. A reverência obsessiva ao Kraftwerk começa a cansar, mas é um álbum tão modesto e direto, e com refrãos tão acessíveis, que fica difícil resistir.
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E não há melhor: a música das minhas férias será The tears and music of love, do Deerhoof. Meus heróis.