Atmosfera

Yulia | Wolf Parade

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Com certo atraso (justificado pela dificuldade de encontrar uma versão decente no YouTube), eis o clipe novo do Wolf Parade. Um clipaço, aliás. Em Yulia, dirigido por Scott Coffey, um cosmonauta deixa a atmosfera enquanto uma mulher o acompanha pela tevê. Ou: de amores e viagens espaciais.

Penny Sparkle | Blonde Redhead

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Pode soar como sabedoria de autoajuda, mas é real: há os discos que você escolhe amar e há aqueles que, por uma combinação de fatores incontroláveis, entram na sua vida sem que você permita.

Penny Sparkle, o novo do Blonde Redhead, é um desses que chutam a porta, que chegam sem horário marcado. Que vão se instalando.

Ouvi este disco na hora errada. Ou na hora certa. Ainda não sei. Mas suspeito que, no futuro, ele será lembrado (por mim, obviamente) como a trilha sonora dos quatro dias terríveis que abriram o meu mês de setembro, em 2010.

Aliás: que ano!

Talvez, em alguns meses, eu nem consiga ouvir esse disco novamente, já que ele soltará uma torrente de memórias doloridas. E será uma pena — é um bom disco.

Não um grande disco. Mas que (e o acaso é o responsável por isso) eu já colocaria, de pronto, na lista dos 500 que marcaram a minha vida. Na verdade, ainda está marcando.

Há bandas de rock que definem as próprias expressões faciais (os traços, as rugas, tudo isso) logo no primeiro disco. E há outras que não se definem nunca, que preservam identidades borradas, derivativas. É o caso do Blonde Redhead. Ouço a banda e penso em Fever Ray (lite), em Beach House, em My Bloody Valentine, até em Mazzy Star e The Delgados. Penso em toda essa gente; só não penso em Blonde Redhead. Quem é Blonde Redhead?

E eles estão no oitavo disco!

Não consigo nem ao menos entender as diferenças entre Penny Sparkle e o anterior, 23 (de 2007). Talvez elas não existam. São dois discos às vezes sedutores, muito cuidadosos, mas vaporosos.

Voltemos, no entanto, à minha experiência. Ela deu um sentido muito mais forte (um sentido até mais profundo) a este disco meio raso.

Nos quatro primeiros dias de setembro, foi tudo o que ouvi. Minto. Tentei provar o álbum do Interpol (desisti após duas audições, mas voltaremos a ele) e o do No Age (que me parece excessivamente longo, mas voltaremos a ele), mas acabei retornando inúmeras vezes ao Blonde Redhead. O danado se impôs.

E tudo por conta de uma música chamada My plants are dead, que aparentemente foi enviada de Marte para me maltratar. E ela não tem nada de sobrenatural: é Kazu Makino flutuando sobre uma neblina de sintetizadores, murmurando algumas frases depressivas sobre plantas mortas e sobre o fim do amor. Coisa triste. Hardcore. E, para mim, a canção mais comovente de 2010.

É claro que, se eu tivesse ouvido essa música antes ou depois daqueles quatro dias de setembro, ela não teria me devastado dessa forma. Mas é o tipo de canção que agrava qualquer fim de namoro: é como se Kazu dançasse nas ruas de uma cidade recém-destruída por uma bomba atômica.

Era isso o que eu sentia (e ainda sinto, espero que com um pouco menos de intensidade). O horror. Destruição. O vazio. Um campo desolado. E chuva fria, ácida (de sintetizadores metálicos).

Por mais que eu tenha vivido essa situação outras vezes, por mais que eu tenha alguma experiência no ramo das separações e das crises amorosas, fui tomado pela sensação física de que algo estava morrendo. Deve ser uma impressão universal.

Tantos posts foram escritos sobre separações (eu mesmo assinei alguns muito constrangedores) que prefiro não me esticar no assunto. Ainda não consegui refletir sobre o caso. Como eu disse, estou um tanto paralisado. Separações são sempre cruéis. A minha aconteceu porque não havia outra saída.

O complicado, para mim (novamente), é olhar para a minha vida e me perguntar: o que eu faço com isso? Por onde começo? Dá para consertar? Posso tentar de novo?

Tudo ainda sem resposta.

Os discos (novamente) me ajudam nesse processo. Esses primeiros dias foram de catarse, de desabafo, de tentar encontrar algum sentido em coisas que não necessariamente têm lógica ou guardam algum senso de justiça. Meus amigos me ajudaram. Estão me ajudando. Mas daí a importância de Penny Sparkle, que cumpriu o papel de um colchão duro onde me deitei e onde me senti um pouco desconfortável.

O disco foi gravado entre Nova York (a cidade onde o trio mora) e Estocolmo (o lar dos produtores Van Rivers and The Subliminal Kid, que trabalhou com Fever Ray). No site da banda, o guitarrista Kazu Mazino diz que o disco foi gravado num ambiente “onírico e muito chuvoso”. Soa assim. Não muito especial, mas soa assim. As quatro primeiras faixas, creio eu, renderiam o EP chuvoso mais bonito do ano.

Há quem acredite que álbuns melancólicos não sirvam para nada. Eles amplificam nossos dramas. Eles nos puxam para baixo. Eles nos infernizam. Eles se humilham. Para mim, discos como Penny Sparkle contêm um desejo enorme de libertação: encaram o monstro para se livrar dele.

É o que tento fazer neste exato momento. Ainda que, admito, não seja fácil.

Oitavo disco do Blonde Redhead. 10 faixas, com produção da própria banda e de Van Rivers and The Subliminal Kid. Lançamento 4AD Records. 7/10

Total life forever | Foals

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Foals. Não acredito que seja uma banda extraordinária. Nem inventiva. Nem especialmente sedutora. Não é (em definitivo) daquelas que nos tiram para dançar e não nos abandonam. Mas – antes que você procure outra – preciso avisá-lo: a partir de agora, devemos confiar nela. Relacionamento sério, sabe como é?

O grande disco do Foals não é Total life forever. O grande disco do Foals virá em três anos. Programe-se aí. 

Enquanto 2013 não chega, este quinteto de Oxford flexiona os músculos como uma seleção séria em véspera de campeonato mundial. Cada disco (=cada amistoso) exercita os talentos de jogadores que ainda não estão totalmente satisfeitos com o time que têm. O desconforto permite alterações táticas surpreendentes que resultam em partidas muito bonitas – como é o caso deste disco, o segundo deles.

(E, por hoje, prometo não voltar às comparações futebolísticas. Patetice tem limite)

Numa época em que as bandas de rock correm para definir uma identidade (dois discos, no máximo), o Foals soa como uma exceção curiosíssima. Eles parecem preocupados unicamente em apurar uma lógica interna que não diz respeito a mais ninguém. E seguem apurando – eles sabem que ainda não chegaram lá.

É uma banda que rejeita, por exemplo, a se adequar a certos modismos do indie rock. A estreia, Antidotes, estava pronto para ser vendida como um álbum de ‘math rock’ (na linha do Battles) com os floreios do produtor Dave Sitek, do TV on the Radio. Mas o Foals tratou de engavetar o disco produzido por Sitek, foi ao trabalho por conta própria e criou canções que talvez parecessem melodiosas demais a quem curte as abstrações do tal do pós-rock.

Desta vez, esperava-se que eles seguissem desmontando o funk-rock. Eis que decidem tomar uma curva perigosa e (sem largar o volante funk) gravar um disco ainda mais assobiável, com inspiração prog-pop e atmosfera de épico “à inglesa”. Mais para Elbow e The Verve, (muito) menos para The Rapture.

Uma mudança que nos obriga a rever tudo o que pensávamos sobre o Foals. Mas quantas outras bandas permitem essa revisão?

“O futuro não é o que parecia ser”, eles cantam (e como Yannis Philippakis está cantando!). Parece até que falam sobre o próprio Foals.

E o que dizer desse título? Penso em Total life forever e só consigo imaginar o Richard Ashcroft mordendo um travesseiro (de raiva).

A sonoridade mais massuda, aparentemente, pegou até própria banda de surpresa. Durante as gravações, eles declararam que o disco estava saindo “muito menos funk” do que tinham planejado e que soava como “o sonho de uma águia morrendo”. O que não é uma imagem adequada para remeter a um disco que se exibe como um pavão muitíssimo vivo – cheio de si.

Há, sim, algo de onírico em faixas como Black gold e After glow. Mas o que se nota é o som de uma banda realista, que acredita no engenho, no trabalho suado. Cada uma das músicas parece ter sido retocada exageradamente – são miniépicos dentro do épico. Talvez por isso o disco pareça – nas primeiras audições – um tanto embotado, pesadão. 

Não é para ser amado de uma vez só. Cada uma das canções vai aquecendo as turbinas do avião até o ponto de explosão – ainda que o disco só decole mesmo na faixa seis, a incendiária This orient. Estamos falando de um álbum que prefere o ambiente à ação, e que acredita na nossa capacidade de desconfiar das primeiras impressões.

É, como se diz (em ingrês), a grower.

E o interesse cresce quanto mais notamos o grau de detalhismo das faixas, que engrandece alguns elementos até óbvios (o disco todo parece feito de sobras do Radiohead, do Muse, da DFA Records). Black gold talvez seja o grande exemplo dessa capacidade do Foals de usar os detalhes, os ornamentos, para criar canções armadas como que em dobraduras, profundas. No caso, é uma linha de guitarra que, lá na metade da música, rompe a estrutura funkeada e nos transporta a uma dimensão mais doce.

Não é um disco que vai tirar o planeta de órbita. Mas Total life forever é o álbum que coloca o Foals (em definitivo?) na galáxia de bandas que importam.

Segundo disco do Foals. 11 faixas, com produção de Luke Smith. Lançamento Transgressive Records. 7.5/10