Antony and the Johnsons

Superoito express (33)

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Man on the moon II: The legend of Mr. Ranger | Kid Cudi | 7

Um álbum de hip-hop dividido em cinco atos (um deles atende por You live and you learn), com uma faixa chamada Scott Mescudi vs. the world e um título que parece ter sido concebido pelo George Lucas. Tem como não gostar? Infelizmente tem, se o seu iTunes emperrar na faixa 8, Erase me, um rockzinho ordinário que nem Kanye West salva. Antes que você comece a refletir sobre o quão terrível é o fato de que os mais promissores pupilos do rap geralmente não sabem diferenciar Kings of Leon de Queens of the Stone Age, sugiro um rolê no segundo ato do disco, A stronger trip, usa psicodelia e dub para fins medicinais (a dobradinha Marijuana e Mojo so dope é, perdoe a falta de inspiração, viciante).

E, quando o sujeito resolve brincar com um sampler soturno de St. Vincent (“Paint the black hole blacker”, em Maniac), a pergunta volta a fazer sentido: tem como não gostar? Tem, principalmente para quem ainda se encontra perdido nos vãos de My beautiful dark twisted fantasy, de Mr. West. Dois álbuns talvez igualmente ambiciosos, mas note as diferenças: enquanto West bagunça o interior das canções (que são longas e sinuosas), Cudi tenta nos impressionar com o acúmulo de faixas que disparam ideias coloridas, mas por vezes superficiais. É daqueles discos que nos agradam mais pelo temperamento frenético do repertório do que pelas canções em si. Não é tudo o que pensa que é – mas tem como não gostar?   

Le noise | Neil Young | 7

Em tese, é o disco em que Young decanta a própria identidade até que restem apenas os elementos essenciais: a guitarra (alta, ruidosa, massacrada por toneladas de efeitos) e a voz. Mas nada na trajetória do homem é simples como parece, e basta lembrar que o disco anterior a este é o desgovernado (mas muito franco) Fork in the road, praticamente um álbum conceitual acerca de um carro ecológico. O que o produtor Daniel Lanois faz em Le noise é um ‘extreme makeover’ parecido com o método que aplicou em Time out of mind, de Dylan: criar uma atmosfera crepuscular, cinematográfica, mas com lacunas para que o compositor vença os maneirismos de estúdio. Mas esse conceito rigoroso por vezes parece uma estratégia para empacotar canções não exatamente inesquecíveis. Elas condensam tudo o que esperamos de um disco de Young – os lamentos de guerra e os hinos pacifistas e os retratos de homens solitários e a fúria juvenil – sem muitas surpresas ou desafios. De qualquer forma, é sempre uma alegria ver o sujeito verdadeiramente se esforçando e criando maravilhas como Peaceful Valley Boulevard. E, sejamos justos, é o mais coeso dele desde Silver and gold, de 2000. 

Marnie Stern | Marnie Stern | 7

O terceiro disco da nova-iorquina pode ser interpretado de uma forma pessimista (soa como uma reprise dos anteriores, um beco sem saída, um exercício seguro etc) e de uma forma muito otimista (soa como uma celebração do estilo que Marnie talhou nos dois outros discos). Minha tendência, no caso, é o pensamento positivo: este é o primeiro disco dela que não me parece um projeto frio de faculdade de Arte, com todas aquelas camadas calculadas de distorção supostamente agressiva. Acredito que, desta vez, Marnie conseguiu vencer se livrar desse véu chamativo e se encontrou nas canções. A última faixa, The things you notice (que incluí na mixtape de outubro) poderia muito bem servir de ponto de partida para o próximo disco: tem o molde atormentado, paranoico, pontiagudo, do restante da discografia que ela lançou – mas é como se a autora das canções finalmente se expusesse de corpo inteiro. É bonito, é delicado (de uma forma inusitada) e, melhor ainda, soa intenso.

 Swanlights | Antony and the Johnsons | 6

Um dos discos mais valentes do ano, já que Antony renega quase todos as referências pop para encontrar uma sonoridade tão serena e introspectiva quanto é (aparentemente) o momento em que ele vive. E encontra: mas pena que é um som tão etéreo que às vezes se dissolve nos headphones. Ouvi o disco pelo menos cinco vezes e só consigo me lembrar das faixas que destoam desse climão solene: I’m in love, que soa como uma daquelas divinas criaturas de Van Dyke Parks, e Thank you for your love, que abre um caminho soul no coração desta floresta gelada. Não é um álbum que consigo ouvir com frequência (e não recomendo a ninguém que acabou de romper um namoro; a dose de melancolia pode ser brutal). Mas, no momento certo, pode ser o antídoto aos excessos que imperam no indie rock.

50 discos para uma década (parte 1)

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Então é isto. Ninguém pediu, ninguém quer saber e suspeito que uma parte pequena dos leitores deste blog se sinta ofendida com este tipo de lista – mas, contra tudo e todos, começo hoje uma série de posts com os meus 50 discos preferidos da década. Adianto: selecionar os “vencedores” foi um drama sangrento. Admito que não estou satisfeito com o resultado e que, para fazer alguma justiça a tudo o que ouvi nesse período, a lista deveria conter mais ou menos 250 álbuns. Ainda assim, seria cruel.

Pensei em escolher 100, mas depois achei mais interessante o desafio de cortar na carne. Taí. Como critério para impor alguma ordem no cortiço, determinei o seguinte: só vale entrar um disco de cada banda/artista. Essa regrinha aparentemente simples é dolorida, já que não consigo imaginar uma lista de melhores da década sem a inclusão de pelo menos dois álbuns do Radiohead e três do White Stripes. Ainda assim, resisti aos impulsos destrutivos e segui com fé na cartilha.

Outra restrição (que nem me incomoda tanto): não entram discos brasileiros. Isso só serviria para confundir o que já está bagunçado. Mas fica o desejo quase secreto de, em outro momento, compor um top verde-e-amarelo, para delírio da nação. Prometo que, se vocês pedirem com carinho, pensarei no assunto.

Antes de começar os trabalhos, um ato de justiça: aí vão discos que quase, quase entraram na lista e foram cortados por alguns centésimos. Fica meu abraço para (sem ordem de preferência) United, do Phoenix, Whatever people say I am, that’s what I’m not, do Arctic Monkeys, Cross, do Justice, Gulag orkestar, do Beirut, Bitte orca, do Dirty Projectors, Relationship of command, do At the Drive-In, Vespertine, da Björk, Gorillaz, do Gorillaz, Vini vidi vicious, do Hives, Brighter than creation’s dark, do Drive-by Truckers, The greatest, da Cat Power, The warning, do Hot Chip e… quando eu voltar para a próxima parte da lista, e antes que isto se transforme numa enciclopédia, continuo com os outsiders, ok?

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50. Toxicity – System of a Down (2001)

Lançado exatamente em 11 de setembro de 2001 (juntinho de Glitter, de Mariah Carey, mas isso não ajuda em nada no meu argumento), este disco-bomba-relógio-trombeta-do-apocalipse ainda soa premonitório e perturbador, mesmo nos momentos mais estúpidos (e não são poucos, mas duram menos de dois minutos!). É o mais enlouquecido e enloquecedor dos álbuns de new metal – e, brilhante!, o artefato explosivo que detonou o new metal em centenas de pedaços minúsculos. 

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49. Rubies – Destroyer (2006)

Não tenho muitos argumentos contra aqueles que acusam Dan Bejar (o Sr. Destroyer) de sempre gravar um mesmo álbum. Acontece. Mas Rubies é tão luminoso que quebra até esse tipo de birra: aqui, Bejar continua a produzir novas versões de si mesmo, mas com uma novidade sutil: se deixa polir por uma banda em estado de graça e por uma produção que evita todas as estranhezas fáceis do lo-fi em busca de uma sonoridade elegante, resistente ao tempo e ainda assim absolutamente particular. A dangerous woman up to a point e Watercolours into the ocean reluzem.

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48 – Stories from the city, stories from the sea – PJ Harvey (2000)

A última obra-prima de Polly Jean Harvey refina algumas das principais características da compositora (a tensão sexual, a insatisfação amorosa, a agonia à flor da pele) numa atmosfera urbana, sob luzes calorosas e até algum sinal de satisfação e êxtase. A participação de Thom Yorke em The mess we’re in é uma das melhores performances dele na década (e a competição é dura…) e cada canção parece a definitiva. A começar por Big exit, o hino suicida que Harvey sempre tentou escrever. Mas é uma love song, de algum modo perverso e estranho.

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47. Person pitch – Panda Bear (2007)

Soa simultaneamente alienígena e familiar, como um álbum do Beach Boys transmitido de uma frequência irreconhecível, sabe-se lá de que cidade. Talvez exista mesmo um lado excessivamente racional nas experiências de Panda Bear e isso tenha me afastado um pouco do álbum, pelo menos num primeiro momento (compare com Feels, do Animal Collective, e tire a prova). Ainda assim, a colagem sonora é de uma doçura que deixa qualquer um desarmado. Lá pela décima audição, digo.

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46. Boxer – The National (2007)

O disco anterior do National, Alligator, era um city tour atormentado nas madrugadas de Nova York. Em Boxer, eles criam um tipo mais silencioso e intimista de pesadelo: são canções de amor que podem ser interpretadas como canções de horror, de um jeito delicado e sombrio que só Leonard Cohen sabe fazer (mas com um tino pop que parece até criminoso – eles teriam o direito de soar tão… humanos?). Canções como Start a war, Slow show e Mistaken for strangers já nasceram standards – para um mundo não tão fácil, no entanto.

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45. Echoes – The Rapture (2003)

Outro disco que soa como uma premonição – mas, ao contrário do System of a Down, o Rapture viu no frenesi pós-11 de setembro uma chance de explorar sonoridades tão instáveis e confusas quanto o tempo em que vivemos (e levá-las para as pistas de dança, quando possível). Daí este disco confuso – um dos mais confusos da década, e eu entendo perfeitamente a reação desanimada de parte da crítica à época do lançamento -, que contém um dos hits mais poderosos que já ouvi (House of jealous lovers), mas não quer saber de seguir as próprias fórmulas. Erra graciosamente. James Murphy e Tim Goldsworthy produzem. 

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44.It still moves – My Morning Jacket (2003)

O destino é um tanto injusto com alguns discos. Este, por exemplo, periga ficar conhecido como o último suspiro comercial do country alternativo. Na trilha do Wilco, o My Morning Jacket também abandonaria lentamente o gênero para procurar uma sonoridade mais ambiciosa, com ares de rock progressivo. Mas não conseguiriam gravar um disco tão surpreendente quanto It still moves, um álbum-de-estrada que não se decide entre o country rock, o hard rock setentista e a psicodelia. Faz tudo ao mesmo tempo, como se fosse a última vez – e com uma honestidade tocante.

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43. A grand don’t come for free – The Streets (2004)

Um dos discos de hip hop mais inusitados da década veio da cabeça mais-ou-menos-ordinária de Mike Skinner, um inglês branquelo que escreve rimas tão francas quanto posts de blog – o cotidiano cru (e hilariante) de um zé-ninguém. Um chapa. Ao contrário de Eminem, Skinner cria um personagem cômico que ri da própria insignificância, sofre na mão de mulheres insensíveis e aceita ser tratado pelo fã como um amigo próximo. Dry your eyes é o hino de uma geração de adoráveis perdedores.

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42. I am a bird now – Antony and the Johnsons (2005)

Um dos discos mais precisos e puros da década: bastam alguns acordes para que qualquer um perceba toda a carga de desespero que envolve a arte confessional de Antony. E melhor: para que se perceba o quão genuína ela é. São canções sem meios-termos: páginas arrancadas de um diário proibido, poesia pop interpretada como hinos religiosos. As participações de Rufus Wainwright, Boy George e Lou Reed soam quase discretas perto do peso emocional que Antony imprime a cada canção. Hope there’s someone é brutal. 

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41. Bang bang rock & roll – Art Brut (2005)

O rock inglês começou o século dividido entre a grandiosidade dos épicos para estádios (Muse, Coldplay) e um revival dançante do pós-punk (Libertines, Arctic Monkeys). O Art Brut é um caso a parte: a banda assumiu a função de cronista e chargista de uma geração. O primeiro disco ainda soa como uma piada divertidíssima, que tira sarro de tudo o que se move no mundo pop (da empáfia dos semanários britânicos à vida fútil das celebridades). Do segundo em diante, eles descobririam que tudo é um pouco mais complicado. Não sem perder a graça.

Não sei quando, mas depois tem mais.

Summertime clothes | Animal Collective

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No novo clipe do Animal Collective, o diretor e editor Danny Perez convida a companhia de dança Flex, do Brooklyn, para encenar uma espécie de balé endoplasmático que soa como uma versão psicodélica para as feiras de ciências que apresentávamos aos 12 anos de idade. Também lembra perigosamente um certo clipe recente do Antony and the Johnsons. Quanto mais extravagante, melhor. E quem é aquele ser estranho que aparece num flash por volta dos 2 minutos e 30 segundos? Marilyn Manson?

Epilepsy is dancing | Antony and the Johnsons

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Eu juro que ainda não sabia: para se recuperar do baque de Speed Racer, os irmãos Wachowski não se afogaram em whisky e gibis – eles dirigiram um clipe do Antony and the Johnsons. Quem imaginaria? Tal como Matrix, o vídeo lida com realidades paralelas, mas o que resulta do transe é o produto audiovisual mais escancaradamente homoerótico desde… Mary Poppins?

Uma loucura.

No happening campestre com um quê de Cirque du soleil, Boy Ge… Antony veste-se com a melhor fantasia de Björk e canta borboletas (meigo isso). Com os Wachowski, participaram do clipe os pintores Tino Rodriguez e Virgo Paraiso, além do coreógrafo Sean Dorsey e da atriz Johanna Constanine. Praticamente uma instalação.

Pra mim, ficou bastante claro que Speed Racer era um filme gay. Ou não era?

(Dica do Diego)

Dark was the night | Vários Artistas

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darknightcapaNão é que eu tenha problemas com coletâneas, mas veja o caso de Dark was the night. Nem sei por onde começar, sério.

O álbum duplo, lançado com a Red Hot Organization (que arrecada fundos em benefício dos portadores do HIV, e está por trás de discos como No alternative e Red Hot and Blue), tem 31 faixas, dura mais que muito longa-metragem e funciona praticamente como um yearbook para ídolos da comunidade indie (classe de 2007/2008, com paraninfos e agregados).

Quer dizer, Deerhoof ficou de fora. Mas eles não contam exatamente como ídolos, contam?

No mais, a turma está reunida: produzido por Aaron e Bryce Dessner (do The National), o álbum reúne canções exclusivas (entre inéditas e covers) de bandas como Arcade Fire, Spoon, Antony and the Johnsons, Grizzly Bear, Andrew Bird, The New Pornographers, My Morning Jacket, Cat Power. O set é tão diversificado (dentro dos limites do indie, claro) que praticamente todo leitor da Pitchfork vai querer uma cópia do disquinho.

Dá para forçar a barra e identificar uma atmosfera de melancolia em torno da maior parte das faixas – e algumas delas, como You are the blood (Sufjan Stevens) e Stolen houses (Iron and Wine) vão direto ao tema. Mas é um projeto abrangente demais para caber numa síntese (que o próprio título sugere).

Como de costume, há opções meio duvidosas. Conor Oberst, por exemplo, presta reverências ao próprio umbigo com uma versão de Lua (se faz acompanhar por Gillian Welch). E o Decemberists extrapola com uma faixa chorosa de oito minutos de duração (Sleepless). Mas são poucos equívocos, e eles quase desaparecem num conjunto bastante forte.

Eu destacaria umas 15 faixas, mas isso não ajudaria ninguém. Sejamos práticos: lá no topo da minha lista de preferidas estão Deep blue sea, do Grizzly Bear (tão boa quanto qualquer uma do disco Yellow house, que é maravilhoso), Knotty pine, com Dirty Projectors e David Byrne (que abre o disco, e não à toa) e You are the blood, que aponta uma direção mais experimental e eletrônica (mas ainda doce) para Sufjan Stevens.

Well-alright, do Spoon, abre o segundo disco e… Se não mereceria entrar no álbum mais recente dele, ainda é Spoon e por isso vale quase a coleânea toda. E, no departamento das covers, é uma delícia a versão do New Pornographers para Hey, snow white, do Destroyer (e a de Antony para I was young when I left home, de Bob Dylan).

Isto é: daqui a 60 anos, quando quiserem resgatar o indie rock do início do século, este álbum aqui servirá como uma introdução bem decente.

Coletânea produzida por Aaron e Bryce Dessner. 31 faixas. 4AD/Red Hot Organization. 8/10

The crying light | Antony and the Johnsons

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antonyjohnsonsNa capa da revista italiana Rumore, Antony Hegarty é “a voz que vem de outro planeta”. Fico me perguntando: ainda?

Quatro anos depois do fenômeno I am a bird now (e lá se vão nove anos desde o disco de estreia), o cantor continua a se alimentar de uma atmosfera de estranheza e de ambiguidade. Sempre foi difícil identificar onde terminava o homem e começava o personagem (se bem que, no caso, fica a impressão de que eles se misturam, se contaminam). The crying light tenta prolongar o mistério por mais um ato.

Confesso que, para mim, este álbum solene e seguro (digo: seguro dentro dos modelos testados no disco anterior) não deixa de soar um tanto frustrante. No EP Another world, lançado no final do ano passado, Antony saía do cercadinho para experimentar em outras freguesias (Shake that devil, a melhor do compacto, parecia até coescrita por Tom Waits). The crying light abandona os riscos em prol de um formato mais uniforme, demarcado por piano, orquestra (conduzida por Nico Muhly) e pela voz de Antony, novamente em primeiríssimo plano.

Lembra muito a estrutura de um lançamento bem recente que Antony admite admirar: To survive, de Joan as Police Woman. Existe uma espécie de beleza serena nas dez novas canções – e todas elas indicam uma fase mais contemplativa do compositor, agora às voltas com versos sobre “paisagens naturais e emocionais” (impossível não retornar às “emotional landscapes” de Björk) e cada vez menos masoquista (ainda que faixas como Another world e Her eyes are underneath the ground sejam de cortar pulsos).

Mas, se existe um tipo de evolução no álbum, ela não nega nenhuma das antigas obsessões do músico. O medo da morte e da velhice, o mistério da criação artística, o sentimento de resistência, o amor aos outsiders: tudo está representado logo na foto da capa, do dançarino japonês Kazuo Ohno, de 102 anos de idade. Nos versos, afloram o romantismo extremado, o êxtase diante da natureza, o amor supremo, o sagrado (e Aeon, a mais impressionante do disco, é soul music para um mundo pós-In rainbows). Está tudo lá.

Ou seja: é um álbum com uma premissa nobre, interpretado com a convicção e a entrega que esperamos de Antony, mas também quase frio, sob controle. De qualquer forma, não deixa de ser interessante notar as diferenças entre a trajetória de Hegarty e do amigo Rufus Wainwright. Enquanto o segundo se mostrou cada vez mais extrovertido, o primeiro optou pela introspecção, por esculpir lentamente a própria obra.

Esse artesanato não perdeu o impacto. A música do Antony and the Johnsons ainda parece produzida dentro de uma caverna perdida num outro universo (ainda!) – e a personalidade que falta a gente como Andrew Bird e até à própria Joan as Police Woman, Antony tem de sobra. Acontece que nos acostumamos com essa força sobrenatural. E The crying light, apesar de magnético, sofre com o peso de tanta familiaridade. 

Terceiro álbum do Antony and the Johnsons. 10 faixas. Lançamento Secretly Canadian. 7/10

‘Another world’ – Antony and the Johnsons

Quatro discos e pé na estrada

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Na pressão, bem rápido, sem rigor, quase no automático, enquanto arrumo as malas para a viagem a São Paulo.

Another world EP | Antony and the Johnsons | **

A prévia do álbum The crying light, programado para 2009, me deixa dividido. De um lado, é bom saber que Antony Hegarty retorna mais inquieto que aborrecido (a melhor prova de que o sujeito anda uma pilha de nervos é Shake that devil, que parece um blues-rock do Morphine). De outro, as músicas mais novas (entre elas o primeiro single, Another world) repetem quase literalmente os temas e climas do disco anterior, batem na mesma tecla. De uma forma ou de outra, a tristeza não tem fim.

Furr | Blitzen Trapper | **

O sexteto de Portland talvez seja a melhor banda verdadeiramente derivada de Super Furry Animals. Nada errado nisso. Aqui eles provam mais uma vez a disposição de trafegar por praticamente todos os gêneros da música pop sem perder o bom humor. Lançado pela Sub Pop, Furr pode ser menos hiperativo e imprevisível que Wild mountain nation, mas soa tão aventureiro quanto. Se aproxima de um formato que podemos chamar de convencional – mas felizmente ainda não chega lá.

Acid tongue | Jenny Lewis | **

Se o primeiro álbum solo de Lewis, Rabbit fur coat, surpreendia por não contentar os fãs do Rilo Kiley com um típico projeto paralelo feijão-com-arroz (a menos que eles esperassem por uma ode ao gospel), o segundo coloca trata de arrumar as peças no tabuleiro. Acid tongue é nota 10 em comportamento, mais sortido e equilibrado, quase-quase uma Sheryl Crow. E com surtos de soft rock daqueles que encontramos na fase pop do Rilo Kiley (e tomamos como ironia, por falta de opção).

Lightbulbs | Fujiya & Miyagi | **

Quando somou um baterista à formação da banda, o Fujiya & Miyagi avisou que buscava uma sonoridade mais calorosa, mais “humana”. É essa a chave para Lightbulbs. Ainda que o baterista não participe ainda de quase nada, já estamos diante de um álbum de carne e osso, mais para o pós-punk dançante do LCD Soundsystem que para qualquer gênero de eletrônica. A reverência obsessiva ao Kraftwerk começa a cansar, mas é um álbum tão modesto e direto, e com refrãos tão acessíveis, que fica difícil resistir. 

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E não há melhor: a música das minhas férias será The tears and music of love, do Deerhoof. Meus heróis.