Adeus 2009

Teen dream | Beach House

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Entre todas as pequenas bandas que apareceram nos últimos 10 anos, eu poderia apostar que o Beach House seria aquela que jamais mudaria. Acho até que escrevi sobre isso, não lembro quando. Se aconteceu, cá estou eu queimando minha língua mais uma vez.

Em retrospecto, as melodias dos discos Beach House (2006) e Devotion (2008) pareciam vazar de uma mesma caixinha de música atirada no fundo de uma caverna. Delicadas e misteriosas. Desde o início, era muito fácil classificar o estilo da dupla — shoegazing, dream pop —, mas quase impossível descrever a sensação de intimidade que canções como Gila e Apple orchard despertavam. Elas sugeriam uma beleza secreta, quase tímida e, por fim, de difícil acesso. Uma certeza, apenas: lá estava uma banda à prova de discos irregulares.

Nos quatro primeiros anos de carreira, Victoria Legrand e Alex Scally se esconderam numa atmosfera enevoada. Nada contra. Os álbuns lançados pela Carpark Records eram filmes domésticos, desfocados, despretensiosos, frágeis (e, nos momentos mais enfadonhos, monocromáticos). A voz de Legrand — sobrinha do francês Michel Legrand — provocava calafrios, mas às vezes parecia indiferente a tudo. Musa de mármore. Um resenhista definiu a estreia como um “álbum de outono” — e, ainda que a comparação não tenha tomado este rumo, vale lembrar que estamos falando da mais encabulada estação do ano.

Pois bem: esse Beach House acinzentado e cabisbaixo acabou. Bem-vindo à primavera.

Teen dream, que sai no fim de janeiro (no inverno norte-americano, portanto), acrescenta mais de uma dezena de cores à palheta da dupla. Inesperado pacas. Mas tem mais: o primeiro grande disco de 2010 arranca o Beach House do conforto do lar e joga a banda no mundo. Parecia impossível, mas eles cresceram e mudaram — graciosamente.

Os mais cínicos vão explicar essa nova estação da seguinte forma: eles teriam passado pelo típico banho de loja a que é submetido o elenco da Sub Pop. O selo de Seattle tem fama de polir e adoçar a sonoridade de recém-contratados. Volta e meia, a gravadora é “acusada” de ter arredondado discos de bandas como Cansei de Ser Sexy, Band of Horses e Fleet Foxes. De fato, o Beach House nunca soou tão radiofônico (o próprio título do disco é de consumo imediato). As duas primeiras faixas, as deslumbrantes Zebra e Silver soul, provocam paixão imediata em qualquer fã do Shins, por exemplo. A névoa de ruídos evaporou — e ganhamos o direito de assobiar mais de um refrão. Isto é: neste longa-metragem indie, fica mesmo difícil negar a interferência dos produtores.

O interessante é que, como raramente acontece, as concessões fazem bem ao duo. Dialogar com as expectativas da Sub Pop parece ter despertado o Beach House para o desafio de atingir um público maior sem abandonar o desejo por sutileza. Mais depuração, menos diluição. Ou, simplificando a saga: pop com tutano.

Daí que, se os dois primeiros discos traziam a imagem de dois outsiders que não deviam explicações a ninguém, Teen dream se apresenta como uma obra mais “responsável”, mais afável — e, por que não?, pop (e eu poderia terminar este texto agora mesmo com o argumento de que é um disco absolutamente tocante e que vocês deveriam abandonar tudo para ouvi-lo antes do dia 31, mas seria uma baita de uma apelação).

Os avanços impressionam. A performance vocal de Legrand, antes comparada à de Nico, agora é recriada de faixa a faixa, sintonizada ao clima de cada canção. A melancolia ainda vibra em cada acorde, mas a diversidade melódica acompanha toda a duração do disco, criando surpresas agradáveis: os ares oitentistas de Lover of mine (imagine um remix do Tears for Fears feito pelo Mazzy Star), a elegância jazzística de Better times, a afetuosidade quase derramada de Take care e a explosão de sintetizadores ao fim de 10 mile stereo. Um sonho em tecnicolor.

Sem juízo de valor: este é um daqueles álbuns em que uma pequena banda adapta um estilo sólido às convenções do pop rock. Isso parece um problema? Não quando essa pequena banda está disposta a usar um ou outro truque para facilitar nosso acesso a um mundo ainda delicado, ainda misterioso. Que me perdoem os mais radicais: à luz rósea do pop, a história do Beach House fica ainda mais bonita.

Terceiro disco do Beach House. 10 faixas, com produção de Chris Coady. Lançamento Sub Pop. 8/10

Adeus, 2009 | Superoito’s mixtape, parte 2

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Meu segundo best-of de 2009 saiu um pouco menos sombrio do que o primeiro, mas não tanto quanto eu esperava. Talvez o ano tenha sido assim mesmo: meio bizarro, osso duro de roer. Paciência.

Aos menos melancólicos, fica a dica: da sétima faixa em diante, a pista esquenta.

E tem pra todo mundo – uma óbvia do Dirty Projetors (eles estão ali em cima, na foto que abre o post), uma não tão óbvia do Animal Collective, um balanço charmoso do Basement Jaxx, a “devoradora de homens” Neko Case, o hit improvável do Phoenix e, claro, Fever Ray (para Diego e Filipe). Espero que vocês sofram um pouco, mas se divirtam.

Ei:  um abraço a quem baixou a primeira coletânea. O número de downloads me surpreendeu. E, já que a ideia não é um fiasco completo, em janeiro de 2010 começo a preparar coletâneas mensais.

Eis a tracklist desta nova mixtape:

1. Stillness is the move – Dirty Projectors
2. When I grow up – Fever Ray
3. Crystalised – The XX
4. Laura – Girls
5. Bonfires on the heath – The Clientele
6. Bluish – Animal Collective
7. People got a lotta nerve – Neko Case
8. 1901 – Phoenix
9. Ecstasy – JJ
10. Feelings gone – Basement Jaxx
11. Moth’s wings – Passion Pit

Faça o download (via Rapidshare): Superoito’s mixtape 2009, parte 2

E, ainda nesta semana, devo terminar minha lista de melhores filmes do ano. Até.