A mosca

Os filmes da minha vida (8)

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Er… Boa noite?

Depois de uma temporada de (sejamos dramáticos) absoluto desencanto com este blog, este redator aflito volta ao ringue para mais um capítulo da incrível, implacável saga dos 100 filmes que… estiveram lá.

Para refrescar as vossas memórias, explico as regras do campeonato: 1. este é um ranking subjetivo, particular, cheio de idiossincrasias, que não reúne os melhores filmes nem os mais importantes/influentes, mas aqueles que acabaram pontuando a minha vida (pro bem e pro mal); 2. a ideia é postar um capítulo por semana, mas (como vocês perceberam) isso nem sempre será possível; 3. Se os amigos leitores quiserem colaborar com links para download dos filmes, a caixa de comentários está aqui pra isso.

Nos próximos dias, vou tentar retormar as atividades deste blog, espantando os ácaros do meu teclado e, quem sabe, escrevendo algo digno de algum respeito. Sei não (estou usando apenas 10% da minha capacidade intelectual, acreditem), mas vejamos.

086 | Não amarás | Krótki film o milosci | Krzysztof Kieslowski | 1988

Os filmes de Kieslowski foram tão importantes para a minha adolescência quanto os episódios de Os Simpsons e os discos do Nirvana (lembro de, no auge da minha rebeldia, ter matado uma aula de inglês para ver A liberdade é azul no cinema), mas, olhando para trás, sinceramente não sei se foi proveitoso ter crescido no período em que o polonês virou astro em festivais internacionais. Na época, não entendi metade dos longas que ele dirigiu (A dupla vida de Véronique ainda me parece um enigma), e acredito que a maior parte tenha sido feita para um público não tão imaturo quanto eu era nos anos 1990. Uma exceção: minha ingenuidade fez de Não amarás uma experiência audiovisual ainda mais inquietante. E o diretor, de algum modo, explicava a forma como eu, um garoto muito tímido, via o cinema: um caso de amor platônico através de janelas indiscretas.

085 | A mosca | The fly | David Cronenberg | 1986

Durante a pré-adolescência, minha fixação por filmes de horror era provocada por slasher movies: Freddy Krueger, Jason – todos os outros maníacos com sérias necessidades especiais – eram meus heróis, talvez porque os mocinhos oficiais não me inspirassem muitos sentimentos além do tédio. Ainda que meu estômago fosse bem resistente, eu não estava pronto para A mosca, que me apresentou um tipo de horror muito mais medonho, mais desagradável – e intenso, já que sem a aparência de uma brincadeira para meninos malcriados. Revi recentemente e ele (ufa) seguiu provocando o bom e velho mal estar, com cenas de degeneração física e psicológica que explicitam boa parte do projeto de cinema de Cronenberg. A partir dele, o cineasta entraria na lista dos meus diretores favoritos, onde permanece firme e forte.

2 ou 3 parágrafos | Distrito 9

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district9

(Escrevi um parágrafo inteiro comparando este Distrito 9 com Presságio, e puxando a sardinha descaradamente para o filme do Nicolas Cage, que, a meu ver, lida mais corajosamente com imagens e incertezas que nos afligem, mas resolvi apagar tudo. Não adianta. Vocês não vão mudar de ideia.)

O plot de Distrito 9 (7/10) já foi esquadrinhado por tanta gente que fico com até com preguiça de tocar no assunto. Mas lá vai: é mesmo impressionante  a forma como Neill Blomkamp faz cinema político (e acho que nem Michael Moore fez um filme sobre apartheid, segregação, xenofobia, medidas autoritárias de governos, os maus tratos sofridos por estrangeiros, marginalidade urbana e comércio ilegal de armas) com as hipérboles de uma fita B. Os filmes B que amamos são os mais intensos, os desenfreados, os que não pedem perdão, os que pegam, matam e comem. O cineasta sabe disso, Peter Jackson sabe disso (ele fez Fome animal), minha avó sabe disso e, nos primeiros 60 minutos, com uma câmera desarranjada e autoirônica (à Cloverfield) Neill cria um dos filmes B mais destemidos que vi em alguns anos (e não vou citar Presságio, calma aí). É como um mashup de A mosca, Tropas estelares e Cidade de Deus. Com picles.

… E depois a vaca quase vai para o brejo. Entendo assim: este filme só seria uma obra-prima se durasse 15 minutos. Para uma provocação tão acelerada, que gasta logo toda a munição, é um risco tremendo decidir-se pelo formato clássico de action movie — mais um a narrar a louca escapada de um herói encrencado. Essa segunda parte acaba parecendo ordinária perto do início do filme. Mas, como o Chico bem observou, vale notar como o longa converte um protagonista detestável num chapa falível com quem todos podemos nos identificar.