2 ou 3 parágrafos

2 ou 3 parágrafos | Super 8

Postado em Atualizado em

Como se não bastasse tudo o que há de metalinguístico nesta história toda, talvez Super 8 tenha sido feito para mim. De verdade. Se existe uma plateia ideal para este filme, eu faço parte dela. J.J. Abrams (o diretor) e Mr. Steven Spielberg (o produtor) aparentemente criaram esta aventura com centenas, milhares de frames da minha infância. Foram grudando, umas às outras, as lembranças de um tempo que antecedeu o período em que o cinema se transformaria, para mim, numa espécie de obsessão. Se existe um documentário sobre a pré-história da minha cinefilia, é este.

Era o que eu via na tevê, era o que eu alugava em VHS: Os Goonies e Contatos imediatos, E.T. e Gremlins. Eu e meus amigos. Eu e meninos que eu nem conhecia. Super 8 soa como uma mixtape do cinema comercial juvenil dos anos 80: e, se é assim, como ignorar a grife produzida pelo “hitmaker” da ocasião? Um filme sobre/a-partir-de/para Spielberg, com a caligrafia meio torta que encontraríamos na confissão (tocante) de um espectador que chora quando vê as seleções de clipes do VH1. Os anos 80 enquanto estado de espírito (se é que vocês me entendem). E um olhar orgulhosamente infantil para o cinema (aliás, ele dá pano pra manga aos críticos que se dispuserem a tratá-lo como um filme-sobre-fazer-filmes).

Acredito sim que temos a assinatura de Abrams no projeto deste trem supersônico — tal como Spielberg, o homem fazia curtas em Super 8 quando pequeno, e o argumento do longa poderia ter sido imaginado por um menino de 10 anos, fã de quadrinhos e sci-fi. Inevitável, por isso, que este filme pareça falar diretamente a mim (e a uma parte grande da minha geração). Mas a programação visual retrô (e o esqueminha narrativo idem, com um mix de drama-família e bombardeio) aplicada por Abrams me deixa um pouco melancólico; acho que cresci. Quando o saudosismo me abandona, me sinto um tanto desamparado diante de um filmezinho tão choroso e eficiente (Syd Field ficaria orgulhoso), tão amável e inofensivo quanto um bom Spielberg. Talvez por essas eu evite rever os filmes que estão no top 10 dos meus oito anos de idade: são memórias que me desarmam, mas às vezes me matam de vergonha.

2 ou 3 parágrafos | Relapse

Postado em Atualizado em

eminem

Não retiro nada do que escrevi naquele outro texto sobre o retorno de Eminem (foram frases apressadas e meio toscas, mas, ei, você acabou de ganhar seis parágrafos pelo preço de três!). Modéstia à parte, notem como o Tiagão aqui conseguiu prever quase tudo sobre este álbum – e, se vocês tiverem alguns trocados sobrando, posso sugerir na caixa de comentários os números quentes da mega-sena. Só errei num detalhe: ainda que pareça um blockbuster de ação programado para se destruir em cinco semanas, Relapse (5/10) me incomodou menos do que o esperado. A premissa é até decente, ainda que o roteiro, a produção e a direção banalizem a história toda.

A trama vai mais ou menos assim: depois de vender trocentos álbuns, ficar milionário e afundar-se na esbórnia (sexo, drogas e clínicas de reabilitação, as usual), Marshall Mathers tenta voltar ao batente, mas descobre-se possuído por Slim Shady, a entidade psicopata sem-noção que tocou o terror no primeiro álbum do rapper, de 1999. Relapse deveria soar como um transe esquizofrênico: Slim Shady mata, estupra, prega peças em celebridades e inferniza Marshall Mathers — mais do que nunca, a cria devora o criador. Num determinado momento, Mathers toma a dianteira para vingar-se. Quando pensamos que o Mathers do álbum é uma versão de ficção para o Mathers real, as coisas começam a embolar. Mas ninguém deve se preocupar com isso: o disco é uma versão aguada (e interminááááável) para o freak show que existe na cabeça de Eminem.

Aguada sim, já que o confronto sangrento entre Shady e Mathers é mera desculpa para que o rapper dê uma maquiada em fórmulas de diferentes fases da carreira, sem espontaneidade ou graça — um tipo bem picareta de superprodução. Não sem consciência do próprio ridículo: a melhor faixa se chama Déjà vu.