Dia: março 20, 2014

THE LIGHTS FROM THE CHEMICAL PLANT, Robert Ellis

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Robert Ellis é um texano de 25 anos que mora em Nashville. Se resolvesse cantar no The Voice, possivelmente chegaria à final do reality show. Superficialmente, ele é estranho, “errado”. A voz de Ellis, tecnicamente perfeita, vestiria bem qualquer canção: de Sweet Home Alabama a Wrecking Ball, e é essa ideia de versatilidade (bem típica dos crooners) que os auditórios televisivos aplaudem.

Nada disso soa como elogio, eu sei. Os cantores mais dissonantes e cheios de peculiaridades interessantes raramente são aprovados nas audições às cegas do programa de TV. Mas, no caso, é apenas uma constatação: estamos falando sobre um vocalista aparentemente amável, para toda a família.

O maior ídolo de Ellis é Paul Simon e, tal como o autor de Mrs. Robinson, o texano sofre críticas por soar organizado, polido, agradável demais. Não é o que acontece (verdadeira e profundamente) em ambos os casos, mas audições rápidas e desatentas podem levar a essa conclusão.

Os discos de Ellis não são resenhados na Pitchfork, por exemplo, talvez por serem enquadrados como “álbuns de gênero” – discos de country music que não destoam da média. O curioso é que o cantor vem demonstrando uma curiosidade cada vez maior por transitar entre gêneros (do country ao folk ao pop ao rock) – ele persegue uma ideia de liberdade, de ampliar o próprio território musical, que inexiste em muitas bandas valorizadas por publicações e sites de música pop.

Aparentemente, Ellis é um conservador, já que valoriza certas tradições do country e do rock clássico. Mas a comparação entre seus dois discos – o anterior, Photographs, de 2011, e este – revela um compositor em fase de crescimento, em nada nostálgico e que, com muita naturalidade, coloca em prática a ideia de uma música country revigorada por uma geração que cresceu usando internet. A primeira faixa, TV Show, é um perfil de um homem que se isola do mundo vivendo de acordo com a programação do… Netflix? Ele não especifica, mas temos elementos para acreditar que sim.

Os temas típicos do country – a solidão, o isolamento, o desencanto amoroso – estão todos no disco, mas refletidos na tela pessoal de Ellis, com cenários urbanos e conflitos que, às vezes, são próximos demais de seu cotidiano. A última faixa, por exemplo, é o lamento de um músico em turnê, que não sabe se a namorada o esperará quando ele voltar para casa e que, antes disso, vai a “bares de hipsters” à procura de companhia.

É preciso ignorar muitos clichês da crítica musical supostamente alternativa – que está pronta para elogiar bandas que misturam Bruce Springsteen com shoegazing, mas se perde ao não conseguir analisar a obra mais recente do próprio Springsteen – para embarcar num disco ao mesmo tempo tão pop e tão desesperado. Uma das baladas conta a história de um homem que coloca a culpa de todos os seus problemas em uma garrafa de vinho e em uma bolsa de cocaína. Em outro trecho do álbum, Ellis narra o drama de um personagem que perde tudo, mas não o orgulho, com uma franqueza triste que me lembra o Elliott Smith de Alameda.

O ponto central do disco – e o mais controverso – é uma versão absolutamente delicada, quase onírica, para Still Crazy After All These Years, de Paul Simon. Numa primeira audição, ela pode soar sentimental demais, amanteigada. Pouco a pouco, começa a deixar a impressão de um registro definitivo. Enquanto muitas bandas de indie rock distorcem o rock clássico e o country aplicando a eles uma sensibilidade de fã de rock, Ellis faz o contrário: ele é um compositor de formação country se aventurando por outras paragens. No meio do caminho, talvez sem querer, supera muitos preconceitos que fazem do indie rock um cenário por vezes monótono e seguro demais.