Dia: dezembro 14, 2011
cine | A separação
Um amigo antigo, que fazia viagens frequentes ao exterior para trabalhar, certa vez me contou sobre um truque que ele usava quando sentia falta de casa: ia a um shopping center.
Aposto que não acontece só com ele. Para quem está constantamente em trânsito, o shopping deve garantir algum conforto. Mudam os idiomas e os arranjos de (algumas das) vitrines. Mas a organização espacial das lojas e setores, em qualquer lugar do mundo, segue um traçado que quase nunca nos parece bizarro.
Lembrei desse amigo quando assistia a este A Separação. A estrutura do filme, vencedor do Urso de Ouro em Berlim, me pareceu muito semelhante à arquitetura de um shopping center transnacional. Um enorme centro de compras, refrigerado e aconchegante, genérico (mas com a inevitável “cor local”), construído no centro do cinema iraniano – ou de Teerã.
Infelizmente, nunca estive na cidade. Mas, da mesma forma como o turista americano não precisa ter visitado um shopping irlandês para saber como ele funciona, o filme de Asghar Farhadi (do também eficiente – eis a palavra – Procurando Elly) não parecerá exótico ou desconfortável ao espectador de, por exemplo, Law and Order.
Digamos que George Clooney projetasse um remake norte-americano deste filme. Talvez ignoraria alguns dos temas políticos/sociais em que o longa esbarra (a burocracia estatal no Irã, sabemos, dá bons thrillers kafkianos). Mas não precisaria mudar nada daquilo que é essencial ao longa: um roteiro que trata conflitos domésticos com as reviravoltas galopantes de uma fita de investigação – cujos personagens estão sempre escondendo uma parte importante da história. Um filme de gênero.
A câmera de Farhadi sempre treme (e câmeras trêmulas são o ar condicionado do cinema-shopping), e a trama se mantém em movimento acelerado, desdobrando intrigas e testando os códigos morais dos personagens. Todos eles, os tipos, são desenvolvidos com muito engenho: dentro do roteiro (um jogo de tabuleiro), cada um tem objetivos muito específicos, e fará o possível para cumpri-los. São mais de duas horas de filme, mas que passam como 30 minutos.
Uma dessas personagens – uma adolescente que se descobre diante de um dilema terrível – me pareceu verdadeira. Mas este não é um cinema que admiro. Me parece esquemático, prático demais (como num episódio de seriado, os limites do filme são os limites do roteiro), sempre colocando a trama numa posição de superioridade em relação à imagem, ao olhar do cineasta.
Só que, apesar de tudo, não posso negar: é um exercício de storytelling tão bem sucedido quanto os vencedores recentes do Oscar de filme estrangeiro. E eu o recomendaria, ainda que sem muito entusiasmo, ao espectador que busca em filmes (e países) orientais um território narrativo familiar – com, é claro, uma certa cor local.
(Jodaeiye Nader az Simin, Irã, 2011) De Asghar Farhadi. Com Peyman Moaadi, Leila Hatami e Sareh Bayat. 123min. C+ (ou, sendo cínico, B)