Dia: setembro 4, 2011
express | 43
Mirror traffic | Stephen Malkmus & The Jicks | 72 | Pode não ser o melhor disco da fase solo de Stephen Malkmus, mas talvez seja o mais sinuoso (mesmo que, à primeira audição, pareça simples): por um lado, a produção de Beck tenta retomar o formato/espírito do Pavement de Wowee Zowee, com uma coleção longa de musiquinhas relaxadas (mas, aluno de Nigel Godrich, ele dá ao disco um polimento soft-rock à la Terror twilight); por outro lado, Malkmus escreve o autorretrato de um roqueiro de 45 anos – canções sem falsas ilusões, irônicas porém desencantadas (como se não acreditasse mais no efeito cômico provocado por um comentário blasé e muito esperto). Um álbum criado sob tensão criativa, portanto – e uma tensão muito saudável, que vai abrindo conotações inesperadas nas canções. O estica-e-comprime não produz um disco-síntese do Pavement (que talvez Beck quisesse), muito menos um disco totalmente pós-Pavement (que Stephen Malkmus tenta provocar), mas um jogo de reflexos entre o passado e o presente do músico. E isso com algumas das canções mais perfeitas que ele escreveu, como Asking price e Share the red (mas eu viveria bem sem Senator; a charge política não é, e não mesmo, o metiê do sujeito).
Past life martyred saints | EMA | 67 | Quando estou de muito bom humor, isto soa como uma versão em miniatura para um dos discos enfezados da PJ Harvey. Quando penso mais uma vez, começo a desconfiar que Erika M. Anderson tomou os discos de Courtney Love como cartilha e, olhos mareados e pulsos rasgando, foi à batalha (e algumas das confissões da moça me deixam mais constrangido que comovido). De uma forma ou de outra, as comparações com Kim Gordon me parecem um exagero: Erika está só no início, engatinhando, ainda modelando a forma de uma sonoridade que, nos próximos discos, pode até começar a soar arenosa e assustadora como ela pretende. Lembra um pouco o disco da Lykke Li, só que sem o senso de humor: uma mulher perdida no deserto, sem destino definido, mas pronta para desabafar horrores com o primeiro andarilho que passar pelo caminho. “Tenho só 21 anos. Não me importo com a morte”, ela avisa, em California. Te entendo, guria, mas grande pop não é só isso.
La liberación | CSS | 58 | Admito que não era o disco do CSS que eu estava esperando: depois de uma temporada que deve ter sido infernal – de crise, chiliques em revistas bacanas, apocalipse e ressurreição – a banda me sai com uma continuação direta (e “profissional”) para Donkey, o disco anterior. Ora. La liberación inverte a ordem dos sabores (desta vez, o electro docinho&facinho&safadinho vem antes da guitarrada abafada), mas o provoca efeito de reprise: as intenções arruaceiras e engraçadinhas do grupo (tipo: música em portunhol, música sobre mina que sai pra night com os “gay friends”, indiepop de Ibiza com participação de Bobby Gillespie) são amortecidas por uma produção que tudo controla e arredonda. A sensação é de ver um roteiro absolutamente ZONEADO dirigido por, digamos, Breno Silveira ou Cláudio Torres. No idioma deles, pois: it hits me like a pillow.
In the grace of your love | The Rapture | 49 | O tédio que bate quando penso em escrever sobre o disco só é comparável ao que sinto quando leio as entrevistas em que o Rapture discursa sobre “encontrar uma atitude mais positiva”. Zzz. Então deixe-me tirar o brutamonte bobo-alegre da sala, rapidamente: procurar atitude positiva (ou negativa, ou sei lá o que) nada tem a ver com gravar um disco que tenta nos acertar no esquema tentativa-e-erro; uma jukebox ora agradável, ora insuportável, desconjuntada e sem rumo (ou, para quem curte a coisa, “sortida”, “desencanada”), que parece compilar tudo o que era cool há dois anos – de LCD Soundsystem a Stereo love. Falta de timing (e de otras cositas más) é isso aí.
I’m with you | Red Hot Chili Peppers | 49 | Ao contrário de By the way (que era mais primaveril, melodioso) e até de Stadium arcadium (que pelo menos pensava grande), o décimo disco dos Chili Peppers soa amedrontado, feito adolescente em dia de vestibular. É o retrato de uma banda que perdeu o eixo (ou: que perdeu John Frusciante) e que, depois de um período de autoestima elevada, agora não parece entender que papel deve cumprir neste mundão confuso aqui. E esse sentimento de incerteza, que poderia gerar um disco interessante, acaba fragilizando todas as faixas do disco, que, quando muito, se esforçam para encher a barriga dos fãs (e, lá pela metade, a impressão é de que a banda saiu de cena e deixou o trabalho para um androide). O uso de percussão afro é tão sutil que merecia ter ficado na gaveta. Mas ok: é de tentativas assim (bem intencionadas porém inócuas) que vivem as bandas de rock mais profissionais, mais eficientes, não mais relevantes.