Dia: maio 2, 2011

Os discos da minha vida (38)

Postado em Atualizado em

Esta semana, a saga dos 100 discos que zoaram a minha vida chega a uma edição apocalíptica. Melhor: revolucionária. Antes disso: incendiária. Antes ainda: lancinante. 

Um contém os diabinhos frios da minha adolescência, o outro guarda um pedaço importante da minha infância lá dentro. Dois discos que, acima de tudo, me ensinaram o seguinte: tenho todo o direito de criar expectativas quase insuportáveis para a música pop; ela, a música pop, quase sempre me surpreende.

Dois álbuns de invenção, se é que podemos catalogá-los dessa forma. Dois álbuns que pedem para que criemos novas formas de catalogar álbuns. Um disco que abriu (tardiamente) os anos 1960, um que iniciou (pontualmente) os anos 2000. Duas obras-primas.

Muita gente boa (e muita gente ruim) já escreveu vários parágrafos bons (e vários parágrafos ruins) sobre esses discos, então vou me esquivar da responsabilidade e aproveitar este espaço para contar historinhas sobre a minha vida. Dica: não leve estes textos (e este ranking) muito a sério, ok? São apenas textos. E isto é apenas um ranking (e um ranking sem discos do Novos Baianos).

026 | Kid A | Radiohead | 2000 | download

Lembro que foi o primeiro disco que baixei via web, mas a conexão discada lá de casa era tão lenta que demorei mais ou menos uma semana para organizar todas as faixas numa pastinha virtual alaranjada. Quando fui ouvir a coleção, o espanto foi tão grande que eu não sabia quem culpar: se a banda, se o disco, se a conexão discada, se as minhas expectativas, se a web (como um todo). Admito que, cutucando aquela versão aparentemente inacabada de um disco aguardadíssimo, imaginei ter caído numa gozação. Esperei o lançamento do CD, comprei a bolachinha REAL e, bem, e nada: a internet nem sempre mentia (lição duríssima, aliás) e o som era mesmo quebradiço, às vezes bizarro, a trilha sonora vacilante para a era do gelo (e não falo em desenhos animados fofos, mas no apocalipse). Mais do que um álbum de transição, é uma tomada de posição: muito difícil de ser aceita de imediato (principalmente por um fã de Ok computer, meu caso), mas que nos empurra lentamente para uma paisagem de onde não conseguimos nos desvencilhar. Talvez um ambiente glacial, repugnante, mais pessimista do que qualquer livro do Philip K. Dick; também fascinante. Dali pra frente, aprendi rapidinho a baixar mp3. E tudo ficou nos lugares certos. Top 3: Everything in its right place, Morning bell, Optimistic.

025 | Rubber soul | The Beatles | 1965 | download

Meu pai, que nem sei muito bem onde está, gravou este disco para mim numa fita-cassete. Eu tinha acho que 10 anos, talvez um pouco menos. Lembro que era período de férias e eu detestava ficar desocupado, de bobeira na casa do meu velho, deitado no sofá, lançando osso pro cachorro, dormindo enquanto passava filme dublado na tevê. Antes de amar os Beatles, eles serviam para que eu preenchesse meu tempo. E Rubber soul é um dos discos que me levam àquelas tardes tão desalmadas: era como se não existisse mais vida alguma além daquela que saía do meu walkman. Ainda me impressiono como essas músicas acabaram se impregnando nas minhas lembranças, de tal forma que hoje choro quando ouço Drive my car e You won’t see me. Passei muito tempo negligenciando este disco, o trocando por outros (Revolver, por exemplo). Mas agora chega: Rubber soul, ainda que desperte memórias por vezes lamentáveis, até muito tediosas, guarda algo da minha infância que outros discos dos Beatles não têm. Talvez a sensação de que havia um playground lá fora enquanto eu estava preso lá dentro. Para minha sorte, havia um momento em que as férias com meu pai acabavam e, finalmente, eu apertava o stop. Top 3: Drive my car, You won’t see me, I’m looking through you.

Depois do pulo, confira os discos que já apareceram neste ranking.

Leia o resto deste post »