Os discos da minha vida (34)
Sem cabeça, sem pulso, sem estômago para a saga dos 100 discos que zonearam a minha vida. O mais seguro é terminarmos este post logo, antes que eu me aborreça. O pavio aqui está curto, amigos.
Antes, rapidinho, um sonho que tive ontem. Era assim: por engano, postei no Facebook os cinco primeiros colocados deste ranking. Percebi cinco minutos depois, apaguei o post, mas depois me amaldiçoei por ter arruinado a surpresa. Desliguei o computador, tomei um copo de suco de laranja, liguei de novo, voltei ao Facebook e percebi que a lista estava toda errada, muitos dos discos eu sequer havia ouvido. Aí não entendi mais nada.
Interpreto o sonho da seguinte forma: dou importância excessiva a esta série de posts, que certamente não vai dar em lugar algum e, pior, promete terminar num anticlímax tenebroso. Que deus nos proteja. Outra interpretação possível: estou dormindo pouco, escrevendo demais e comendo pouco cálcio.
Que seja. O importante é que com sonho não se brinca. Eles sempre têm alguma razão.
Os discos deste post destoam um pouco daqueles que apareceram recentemente nesta lista faraônica. Não são álbuns que costumam pintar em listas de melhores de todos os tempos e, coincidentemente, eles resumem dois períodos muito específicos da minha vida: meus 13 anos (já morando em Brasília) e meus 11 anos (ainda no Rio de Janeiro).
Preparem-se para o mais pessoal, o mais estabanado, o menos instrutivo entre todos os posts desta saga que só me traz pesadelos e ansiedade. Até semana que vem.
034 | Last splash | The Breeders | 1993 | download
Lembro que gravei o CD numa fita-cassete, dai eu podia descer do apartamento e ir ouvindo enquanto caminhava até a Cultura Inglesa (que ficava a uma quadra do prédio). Eu tentava chegar ao fim do disco, tentava sempre, mas passei algumas semanas indo e voltando entre as faixas 1 e 4 e, por uns meses, aquele me parecia o conjunto de canções mais perfeito. O maremoto caloroso de New Year, o apito de Cannonball, o sabor melado de Invisible man e, finalmente, os versinhos estilhaçados, sacanas e ao mesmo tempo tão desesperados de No aloha (a minha preferida do disco). Um dia fui assaltado. Demorei um tempinho para perceber (estava em Saints, outra joia), então entreguei meu relógio e perguntei se eles queriam o walkman. Olharam para aquele objeto arranhado, encardido, e disseram não. Me senti o menino mais fraco da cidade, os ossos quase partindo de tanta tristeza, mas capturei os fones a tempo do refrão: “O verão está pronto quando você está.” Top 3: No aloha, Saints, Invisible man.
033 | As quatro estações | Legião Urbana | 1989 | download
Lembro que as tias organizaram um amigo-oculto de fim de ano. Então obrigaram a gurizada a escrever no papel as opções de presente. Um primo meu pediu uma bermuda. Minha irmã, roupas da Barbie. E eu, que não pensava em outra coisa, tratei de anotar: boneco de Batman. Mas acabei ganhando (um tanto decepcionado, admito) a minha segunda opção: o disco As quatro estações, da Legião Urbana, que tocava nas rádios e parecia divertido. Acho que foi ali que minha relação com a música começou a mudar, sem que eu notasse. Alguns versos soavam completamente misteriosos (“lá em casa tem um poço, mas a água é muito limpa”), outros me pareciam non-sense, aí eu sorria toda vez que os ouvia (“quando o sol bater na janela do seu quarto, lembra e vê que o caminho é um só”), três ou quatro faixas fugiam totalmente da minha compreensão (Maurício, Sete cidades) e o sucesso da temporada, Meninos e meninas, me parecia apenas uma música sobre meninos e meninas. Ouvi tantas vezes que o vinil arranhou. Até os meus 12 anos, era o melhor disco do mundo. Depois, virou o melhor disco da minha pré-adolescência. Assim ficou. Ainda há trechos que, hoje, faço questão de não entender. Melhor desse jeito. Top 3: Há tempos, Eu era um lobisomem juvenil, Quando o sol bater na janela do teu quarto.
abril 5, 2011 às 12:26 am
Nem vou ficar falando do disco do Legião, porque, curiosamente, foi um dos nossos temas de dicussão no fim de semana. Eu Era um Lobisomem Juvenil ainda deve ser minha preferida desse disco. Na escola, a professora de um trabalho que era escrever uma versão alterando tema e a letra de uma música, a minha de Há Tempos fez sucesso.
abril 5, 2011 às 12:34 am
Olá! Não fique assim tão dramático em relação a sua lista, ela é uma maravilha, e com certeza são os posts que eu mais aguardo no blog. Porém, faço esse comentário para dizer que esse verso “Lá em casa tem um poço, mas a água é muito limpa” me incomodou a adolescência inteira e toda vez que eu escuto essa canção fico com aquela dúvida, o que Renato quis dizer com isso: suicídio? drogas? Não adianta, não entendo!
abril 5, 2011 às 1:50 am
Puxa, dois discos que eu adoro!!!! O dos Breeders até hoje escuto muito! Adoro “Do you love me now?”. Comprei esse disco por influência da revista Bizz.
E Legião, é a tal história, nunca haverá outra banda como essa, nunca haverá outro Renato Russo. E eu também ainda não sei o que quer dizer “Lá em casa tem um poço…” mas e daí? heheh. Acho o QUATRO ESTAÇÕES mais parecido com o DOIS no sentido de que tem mais enigmas nas letras. Mas ainda prefiro aqueles discos dos anos 90, que falam mais a mim, que me parecem mais claros na compreensão e em que o Renato Russo se aproxima cada vez mais de nós, seus ouvintes. Falar sobre Legião Urbana – com quem gosta de verdade, claro – é sempre muito bom. Dá pra passar uma noite inteira só discutindo sentimentos e significados e até a astrologia nas letras. E dá uma saudade…
abril 5, 2011 às 2:59 am
Pois é, Michel, foi grande coincidência termos falado sobre esse disco recentemente (e eu contei a história do amigo oculto). A lista dos 100 discos tá pronta há tempos e o Legião calhou de aparecer agora. Deve ser curioso esse trabalho sobre ‘Há tempos’. Quem sabe aí eu consigo entender a música? Haha.
Renan, não ligue pro drama. É tudo charminho :) Esses posts são todos meio panacas e irônicos, tenho que parar com isso.
Tocava muito Breeders na MTV, Ailton. Acho que foi por isso que acabei comprando. Mas conheci antes dos Pixies, que apareceu na minha vida alguns anos mais tarde. Meus discos favoritos do Legião são V e Quatro Estações, nessa ordem.
abril 5, 2011 às 3:15 am
Acho que no tempo que saiu o Breeders aqui não tinha transmissão da MTV. Que eu me lembre, o disco que eu comprei sob influência da MTV foi o do Elastica. Aquela canção das palminhas era irresistível. heheh
abril 5, 2011 às 3:19 am
Esse do Elastica eu também comprei por causa da MTV. Fui à loja e voltei com dois CDs: o do Elastica e o ‘The bends’, do Radiohead.
abril 5, 2011 às 1:44 pm
pro top 5 de tiago, chuto um do Radiohead, um dos Beatles, um do Pink Floyd, um do Arcade Fire, um de Elliott Smith.
abril 5, 2011 às 1:47 pm
Hmm, JV, acho que não.
Não vai entrar nenhum Arcade Fire na lista. Só adianto isso, por enquanto.
abril 5, 2011 às 8:40 pm
Não vou esconder: Legião Urbana talvez tenha sido minha primeira banda. Foi o primeiro show de rock q eu assisti – 1987 ou 1988, Maracanazinho lotado, com Faroeste Caboclo em alta rotação nas rádios – e eu sabia TODAS as letras. Até Acrilic on Canvas (é isso?).
Mas ainda bem q vc disse primeiro, Tiago, talvez eu nunca tivesse dito isso. rs
Lembro q um dos passatempos prediletos do pessoal da Bizz era ridicularizar a Legião (alguns anos depois, o Guns N’Roses). E eu jurava q eu era o único q tinha gostado do V, o disco “progressivo” da Legião. Agora descubro q vc tbm gosta.
Todos os vinis q eu tenho deles jamais se “tornaram” CDs ou mp3, e permanecem escondidos em algum recanto escuro dessa casa, de onde provavelmente jamais sairão.
abril 5, 2011 às 8:45 pm
Eu ganhei o V pouco depois do Quatro Estações. No início achei bem estranho, mas não foi tão complicado gostar do disco (lembro que Teatro dos Vampiros tocava muito nas rádios, depois Vento no Litoral). Acho que é inevitável: quem viveu a adolescência no fim dos 80/início dos 90 acabou ouvindo Legião. A banda estava em todo canto, e era fácil a identificação com as letras. Só descobri o ‘Dois’ muito depois, mas ainda acho um grande disco.
abril 5, 2011 às 9:16 pm
Entendo “lá em casa tem um poço, mas a água é muito limpa” como o cara que prefere se manter seguro. Com tanta merda no mundo, tanta desilusão, ele, apesar de fazer as coisas da forma que julga correta, ainda se mantém em alerta para não se contaminar. Então apesar da água ser limpa na casa dele, ele ainda tem um poço, caso precise… Ficou confuso?? rs
E o ‘V’ é meu preferido da Legião também! Quase não ouço hoje em dia, e quando acontece bate uma nostalgia danada.
Abraços
abril 5, 2011 às 9:21 pm
É uma boa interpretação, Ricardo, mas admito que não entendi muito bem, haha.
abril 5, 2011 às 9:55 pm
Acho q se eu colocar pra tocar algum disco da Legião, as lembranças não vão ser boas. Não tenho nenhuma saudade da minha adolescência, não quero de forma alguma reviver aquilo.
Acho q ter sido fã da Legião durante um período dela explica um pouco isso. Esses jovens sensíveis q pensam demais são um perigo !! Eu devia ter ouvido alguma outra coisa, Bezerra da Silva, talvez. rs
abril 5, 2011 às 10:16 pm
Legião Urbana é um marco. Engraçado que quando eu escutava foi na minha adolescência, fase rebelde, lá pelos 2005. Vejo gente que escutou nos 90, outros nos 80… E esses dias vi um menininho de uns 13 anos com a tradicional camiseta preta com a letra de Pais e Filhos atrás, típico ar de quem já sabe tudo e não depende de nada, mais um adolescente.
Como é gostoso saber que antes tanta gente já escutou e fez história com Legião, e como a história ainda continua.
Abraço :)
abril 6, 2011 às 12:17 am
Acho que esse foi o post mais fofo da saga dos 100 discos, hehe.
Depois dele tenho quase certeza que vai ter Pixies no top 5.
abril 6, 2011 às 2:46 am
Pois é, Daniel, é por isso que não volto à maior parte dos discos que estão nas primeiras posições desta lista. Despertam muitas lembranças perigosas.
Sim, Lau, Legião vai saltando de geração em geração, acho que principalmente por conta das letras e das interpretações do Renato.
Rafael, Pixies no top 5? Deixa eu ver aqui. Hmm. Não.
abril 6, 2011 às 3:17 am
Se eu não me engano, a Bizz recebeu muito bem o disco V da Legião, o mesmo não aconteceu com os discos de início de década dos Titãs (Tudo ao Mesmo Tempo Agora) e Paralamas (Os Grãos). Esse negócio de ter vergonha de gostar de Legião é muito estranho. Talvez por tocar demais na rádio “Pais e Filhos”, que é uma bela canção e difícil de ser cantada por outra pessoa e ficar boa…
E quanto às lembranças tristes da adolescência, elas não estão necessariamente ligadas à banda. Pelo contrário, eu lembro de ter dado os amassos mais gostosos da minha vida ao som de Legião e tomando um vinho barato. Bons tempos que não voltam mais…hehehe.. A tristeza em relação à banda está ligada ao ano de 1996, à morte de Renato Russo. Meu pai morreu alguns meses antes, mas eu fiquei mais tempo de luto com o Renato Russo (ouvindo “A Tempestade”).
abril 6, 2011 às 3:34 am
Houve uma longa entrevista com a banda por ocasião do lançamento do V, mas o staff da Bizz não gostou muito do disco não.
Da resenha sobre os discos de Titãs e Paralamas eu lembro, foi até uma resenha forte e polêmica, pq o cara “decretava” o fim do rock brasileiro dos 80s. Que não acabou naquele ano, lógico.
Na verdade a “vergonha” em dizer q gostava da Legião era mais uma brincadeira mesmo. A Legião teve um papel muito forte na minha formação musical, eu não posso de jeito nenhum negar o grande talento do Renato Russo, mas a partir dos meus 17 anos (em 1991, um ano emblematico) Legião Urbana deixou de ter qualquer importância pra mim.
Eu falo por mim, é lógico q pra outros pode ser inteiramente diferente.
abril 6, 2011 às 2:24 pm
Eu nem dava muita trela para a Bizz, sinceramente. Lia sempre, até porque não havia outra opção (e aí os leitores mais jovens desse blog têm que fazer um esforço pra imaginar um mundo sem internet). Mas eu achava muitos dos textos exagerados, tolos, e lembro bem da crítica de Titanomaquia, que na época tratei como uma grande bobagem. Lá em casa assinavam o Jornal do Brasil e as dicas do Pedro Só e do Tárik de Souza sempre me influenciaram mais. Comprei o Nevermind por causa de um texto do Pedro Só (e, no quadro de cotações, vários dos críticos avaliavam o disco com notas baixas). Então meu mundo tava longe de se resumir à Bizz, ainda bem.
abril 7, 2011 às 12:16 am
Legião me remete a rodinhas de violão. Tenho pavor.
Mas já ouvi muito, claro. Aliás, meu primeiro CD foi o “Música para Acampamentos”.
Já de Breeders eu nunca gostei.
abril 7, 2011 às 2:34 am
Legião faz mais sentido para quem é de Brasília? Sempre tive essa impressão, mas não sei se é verdadeira… Só sei que até hoje compro briga com quem é cheio de empáfia e fica ridicularizando Legião.
Enfim, sou bem imparcial, pois deve ter sido a banda que mais escutei na minha adolescência.
abril 7, 2011 às 1:28 pm
tb acho que o ‘2’ é um discaço…
quase todo mundo que escutou Legião tem essa sensação de ser algo que ficou pra trás, é curioso. merece um estudo aí.
ainda sobre Legião: me perdoem não ser “correto” aqui, mas… caraca, é impossível encontrar os novos discos remasterizados da Legião Urbana na internet. tenho a impressão de que foi um tremendo fracasso — o que seria outro caso de estudo, considerando que foi (?) a banda de rock que mais fez sucesso no Brasil.
abril 7, 2011 às 1:29 pm
e tiago, vc devia recaptular nesses posts o ranking dos discos que vc já mencionou. eu mesmo não lembro mais o restante da lista…
abril 7, 2011 às 2:31 pm
Eu tinha a fita cassete de ‘Música para acampamentos’, Alê. Foi ali que eu decorei ‘Faroeste caboclo’, numa viagem de ônibus de Brasília ao Rio. Coisa de moleque que não tinha mais nada pra fazer, haha.
Iuri, não sei se faz mais sentido pra quem é de Brasília, mas descobri quando eu morava no Rio e lá a banda fazia um sucesso incrível.
JV, vou fazer isso a partir do próximo post.
abril 8, 2011 às 9:24 pm
Como sou do tipo que valoriza muito a Legião, imaginar rodinhas de violão tocando o que é “sagrado” não me agrada. E acredito que não, que a banda não é coisa do passado e que, não, não é cultuada mais por quem é só de Brasília. É um fenômeno nacional.
Os discos remasterizados parece que foram lançados em pouca tiragem. Mas a atitude é bem picareta da EMI brasileira, querendo continuar ganhando dinheiro com a galinha dos ovos de ouro deles. Recentemente, o disco mas horroroso que eu vi foi “Leila Pinheiro canta Renato Russo”. Ah, faça-me o favor… Que merda aquilo…
Quanto à Bizz, os sacos de pancada dela na época que eu lia eram os Engenheiros e o Lobão. Depois o Lobão ganhou respeito com A Vida É Doce, mas aí já é outra história.
maio 1, 2011 às 8:21 pm
Legal, No Aloha é a minha preferida do Last Splash também. Entretanto, tenho que dizer que prefiro o Pod. Esse disco e o Spiderland, do Slint, são discos com atmosferas que me apetecem bastante. Nem sei porque os relaciono, só acho a estrutura, o formato “quadrado” das músicas semelhantes.
E adoro esse disco do Legião. É daqueles gostosos de se ouvir e cantar junto. Entender as letras é outra história.
Aliás, percebem que hoje em dia é hype/cult falar que não gosta do Legião?