50 discos para uma década (parte 4)

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20. Dear science – TV on the Radio (2008)

No início da carreira, o TV on the Radio lançou um álbum-demo chamado Ok calculator. Mas é em Dear science que eles revelam um senso de aventura que lembram o terceiro disco do Radiohead. A combinação de glam, pós-punk e percussão-em-brasas já estava devidamente formatada no disco anterior, o excelente Return to Cookie Mountain (2006). Mas o esforço de imprimir uma atmosfera urbana (um raio de neon, digamos) nesse estilo ganha sentido em Dear science, um álbum que soa como uma fotografia granulada e fosforescente do estado de coisas no indie rock americano.

jayz

19. The blueprint – Jay-Z (2001)

O álbum definitivo de Jay-Z vale por um Scorsese safra 70: é um filme moderno de gânsgster narrado como um desabafo, um fluxo de consciência (e sempre que ouço o disco imagino o rapper recitando os versos num confessionário). As rimas são perfeitas, mas a surpresa é que, aqui, a música é tão cortante quanto as palavras — com samplers de Jackson 5, The Doors, David Bowie, Natalie Cole e Al Green, Jay-Z cria um clássico a partir de cacos de outros clássicos. E é preciso ser gênio para transformar esse tipo de picaretagem em grande arte.

ys

18. Ys – Joanna Newsom (2006)

Joanna Newsom é uma menina de traços angelicais que toca harpa e, por tudo isso, não deveria assustar ninguém. Mas, surpreendentemente, virou uma das figuras mais controversas da década, provocando discussões quase violentas entre defensores e detratores  (e ainda conheço gente que a considera uma grande farsa). Ys não é disco para quem tem pressa: com sete faixas e 55 minutos de duração, narra uma fábula folk que soa como um delírio barroco. Ou tudo ou nada. Os arranjos de cordas deslumbrantes de Van Dyke Parks e a produção crua de Steve Albini criam um universo. E não tente encontrar outro igual.

lcd

17. Sound of silver – LCD Soundsystem (2007)

Em termos objetivos, é muito fácil explicar a importância do disco: ele consolidou e popularizou o crossover de rock e eletrônica na cena de Nova York (com uma leve vantagem para o rock) e fez de James Murphy um ídolo de carne e osso (o disco de estreia, ainda que brilhante, não arriscava canções tão pessoais). Isso tudo é notável, mas o que me atrai no álbum é o modo franco como Murphy, quase quarentão, trata de um tema pouco comum tanto no rock quanto na eletrônica: a idade adulta. Os amigos não estão lá (All my friends), a morte assusta (Someone great), Nova York pode ser um lugar terrível (New York, I love you’re bringing me down) e a pista de dança não cura mais. Ainda assim, talvez ironicamente, um dos grandes discos de festa da década.

mia

16. Kala – M.I.A. (2007)

Toda essa história de pop global, na prática, soa terrível. Durante a década, muito se falou sobre encontros sonoros improváveis (facilitados pela web, blablabla), mas pouco se ouviu de verdadeiramente interessante. M.I.A. é uma exceção — talvez por conseguir transitar naturalmente entre diferentes culturas (e ela própria parece não pertencer a lugar algum). Arular era um grande disco, mas Kala é uma provocação ainda mais saborosa. De Bollywood (Jimmy) a Gwen Stefani (Boyz), é talvez o único disco da década que encarna verdadeiramente o transe mundial sem soar melancólico. M.I.A. é mais sofisticada que isso. E Paper planes nem precisava ter virado um hit planetário…

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15. Late registration – Kanye West (2005)

Na maior parte das vezes, o ego de Kanye West é maior que sua música. Mas, em Late registration, ele nos deixou sem argumentos. O blockbuster, que vendeu 4 milhões de cópias nos Estados Unidos, é a maior demonstração que o hip hop roubou do rock o poder de redefinir o mainstream. Com ótimos convidados suspeitos (Maroon 5? Jamie Foxx?) e coração geek (ele é um fã de cultura pop, e isso ficou mais claro que nunca), West fez um legítimo candy shop, viciante e impecável. E que ninguém esqueça de Jon Brion, envenenando os doces.

queens

14. Rated R – Queens of the Stone Age (2000)

Por um momento, em 2000, o Queens of the Stone Age nos fez acreditar na possibilidade de um revival grunge. Durou pouco (e a própria banda resolveu seguir caminhos mais sombrios), mas o efeito entorpecente de Rated R continua zunindo no meu ouvido. Uma espécie de continuação sacana e perversa para Nevermind, do Nirvana, o álbum lustra o stoner rock do disco anterior em formato mais direto e melodioso. Há hits que nunca fizeram o merecido sucesso (Feel good hit of the summer e The lost art of keeping a secret) e as loucuras de Nick Oliveri ainda soam hilariantes.

apologies

13. Apologies to the queen Mary – Wolf Parade (2005)

Pode não ser o grande disco da década, mas soa como o melhor do mundo. A estreia do Wolf Parade vale por duas: é um disco de Spencer Krug (Sunset Rubdown) e de Dan Boeckner (Handsome Furs), dois compositores à flor da pele. Produzida por Isaac Brock (Modest Mouse), a estreia da banda é como um resumo prematuro de carreira. Tomado por fantasmas, oscila entre duas personalidades (Boeckner é quase gentil, já as faixas de Krug são pura agonia) e soa urgente, como se o mundo estivesse sempre prestes a explodir.

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12. Kill the moonlight – Spoon (2002)

A mente matemática de Britt Daniel encontrou a equação da perfeição pop. Kill the moonlight apareceu do nada e ainda impressiona como um disco conciso, sem uma única nota em falso. Com um estilo rigorosamente econômico (um contraponto suingado para o Shins, a banda cria verdadeiros hinos que cabem em 2 minutos de duração, como The way we get by e Something to look forward to. Nos discos seguintes, a banda habitaria um casulo maior e mais confortável. Mas nunca soariam desse jeito: maravilhosamente pequena.

bob

11. “Love and theft” – Bob Dylan (2001)

Bob Dylan pode não ter se dado conta disso, mas os discos gravados desde Time out of mind casam perfeitamente com uma época em que o rock voltou-se ao passado para, na combinação de formas antigas, criar novos ambientes musicais. O Dylan de “Love and theft” não é simplesmente retrô — é como se o homem tivesse finalmente conseguido encontrar uma sonoridade que procurava desde os anos 1960. Tanto quanto as canções (que são excelentes), o que importa é a atmosfera das gravações — filmes em branco e preto. E não é isso que fazem Strokes e White Stripes?

***

A parte final da lista eu posto quinta-feira às 22h. Se vocês quiserem acompanhar, será bacana. Vou atualizar aos poucos pra aumentar o suspense, ok?

18 comentários em “50 discos para uma década (parte 4)

    marcus disse:
    setembro 22, 2009 às 11:57 pm

    ESPERO que na última parte tenhamos White Stripes e Strokes, pelo menos. Se bem que tu queimou o excelente Libertines lá atrás, então não sei o que esperar daqui pra frente.

    Radiohead, quase certeza. Eu colocaria Kid A, que considero o último grande álbum deles. Mas tu tem cara de que vai colocar o Hail to the Thief.

    The Killers será que aparece?

    Esperarei anCioso.

    daniel pilon disse:
    setembro 23, 2009 às 1:02 am

    Não gosto tanto do Wolf Parade (trocaria sem nem pensar pelo último do Sunset Rubdown) e gosto do da MIA, mas prefiro o Arular. De resto, excelente. Principalmente o Dylan tão bem posicionado.

    E agora é esperar por Wilco, White Stripes, Strokes, Radiohead, Animal Collective…

    cavalca disse:
    setembro 23, 2009 às 1:30 am

    Acho que todos concordamos com White Stripes e Strokes.

    Felipe Queiroz disse:
    setembro 23, 2009 às 1:46 am

    Muito bom você ter lembrado de Queens of the stone age. A lista tá ficando boa…

    Bom, eu arriscaria 8 nomes para as próximas 10 vagas (não em ordem de colocação):

    radiohead
    animal collective
    white stripes
    strokes
    outkast
    sigur rós
    wilco
    modest mouse
    arcade fire

    A outra vaga é um mistério. Eu colocaria Devendra Banhart ou Brian Wilson, mas podem surgir The Microphones, Broken Social Scene, Daft Punk, Dizzee Rascal, The Avalanches, Flaming Lips, Deerholf, No Age…

    Caramba, vc deixou muita coisa de fora! ehehe

    Felipe Queiroz disse:
    setembro 23, 2009 às 1:47 am

    eu quis dizer 9 nomes entre 10

    Diego disse:
    setembro 23, 2009 às 1:58 am

    Joanna Newsom melhor nem comentar, mas o que me deixou puto mesmo foi a colocação do LCD. Só 17º??

    Tiago Superoito respondido:
    setembro 23, 2009 às 2:25 am

    Marcus, adianto que The Killers não aparece. Mas o resto você vai ter que esperar, hehe.

    Caramba, Pilon, SÉRIO que você não gosta de Wolf Parade?

    Pois é, Felipe, 50 é pouco.

    Puts, Diego. É uma boa colocação!

    brunoamato disse:
    setembro 23, 2009 às 3:02 am

    Lista cada vez melhor.

    Entre as apostas seguras na lista do Tiago, estão Radiohead (Kid A), Animal Collective (a dúvida é qual), White Stripes (curioso, não achava q o Tiago colocaria algum no top 10). Entre as apostas quase seguras, Strokes, Arcade Fire, Flaming Lips (nunca me pareceu que o Tiago fosse fã em especial dessas), e assim como o Felipe, to achando que Brian Wilson também entra…

    Tiago Superoito respondido:
    setembro 23, 2009 às 3:07 am

    Bruno, você não acompanha meus blogs há muito tempo, hehe. Gosto muito de todas as bandas que vc citou.

    Mas não entendo pq tanta gente lembrando de Flaming Lips. Soft bulletin é de 1999, gente.

    marcus disse:
    setembro 23, 2009 às 4:04 am

    Mas tem o Yoshimi Battles The Pink Robots, que é de 2002 e, particularmente, é o meu preferido da banda.

    Daniel Pilon disse:
    setembro 23, 2009 às 11:27 am

    Gosto sim, só não tanto para um top 20, hehe.

    brunoamato disse:
    setembro 23, 2009 às 12:22 pm

    Eu sabia que você gostava Tiago, mas acho que nunca li nada que me inspirasse confiança de aparecerem no top 10.

    Tiago Superoito respondido:
    setembro 23, 2009 às 1:04 pm

    Yoshimi é legal, mas não colocaria na lista não. E olha que Soft bulletin entra no meu top 10 dos anos 90.

    Então aguarde, Bruno.

    guilherme disse:
    setembro 24, 2009 às 5:42 am

    fuckin’ boring. get some taste, dude.

    um abraço, tiago. você sumiu. daí agora, voltando ao seu blogue depois de um hiato (não intencional!), descobri que quem sumiu fui eu.

    guilherme disse:
    setembro 24, 2009 às 5:45 am

    e para de ver true blood e vá (re)ver buffy, série sensacional.

    gilmore, wire, once and again, vocês ganharam mais um irmãozinho!

    guilherme disse:
    setembro 24, 2009 às 5:49 am

    e para de falar que once and again é ruim e que ninguém via quando passava às sextas-feiras na era do onça. não magoe seus amigos, ainda mais aqueles que voltam à casa amiga com coisas amistosas como “fuckin’ boring, get some taste, dude”.

    Tiago Superoito respondido:
    setembro 24, 2009 às 1:16 pm

    As incríveis demonstrações de carinho de Guialves.

    Sayd disse:
    novembro 1, 2009 às 8:41 pm

    Nossa. Não tenho muito a acrescentar! Foi certeira e esclarecedora a definição da estréia do Wolf Parade!
    Curta concisa e absurdamente lúcida… De fato uma estréia como um resumo de carreira… Ah deus, nao sou só eu q sinto o mundo explodir!
    Parabéns! Abraço!

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