Superoito express (6)

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Rock de mulherzona (e de mulherzinha, às vezes).

Actor | St. Vincent | 7.5 | É a hora e a vez de Annie Clark. Não é? Deveria. Depois da festa que se fez para Marry me (uma estreia promissora e tudo, mas que ainda soa irregular e enjoativa – pelo menos aqui em casa), até meu golden retriever estava se perguntando sobre a estratégia que ela usaria para não desaparecer completamente (e nunca ser encontrada). A boa notícia, então: Actor é um segundo álbum que, sem abandonar os traços mais firmes do disco anterior, encontra a clareza de intenções que Clark procurava. É um ciclo de sombrias canções de ninar, em que arranjos de cordas barrocos (à Van Dyke Parks, Jon Brion) convivem com riffs violentos de guitarra e uma eletrônica mecânica, dura (Marrow é o melhor exemplo desse contraste). Ainda lembra um pouco Fiona Apple e Björk, mas taí: as semelhanças não incomodam muito. Clark começa a pavimentar um caminho particular dentro da tradição do rock sinfônico elegante, com versos manchados por hematomas (“Pinte o buraco negro com mais preto”, ela ordena, em The strangers) e um desejo de provocar terremotos sentimentais que, apesar de aplacado depois da quinta ou sexta faixa, emociona mais que qualquer álbum do Polyphonic Spree, banda que ela costumava integrar. A resposta que eu, você e meu golden retriever queríamos está no título da décima faixa: Just the same but brand new. Exato. 

My maudlin career | Camera Obscura | 6.5 | Espero que sua inteligência me perdoe, caro leitor. Mas minha relação com este quarto álbum do Camera Obscura é abalada por um conflito (muito mais típico do que você imagina) entre instinto e razão. Lá na sexta faixa, me peguei num daqueles momentos de iluminação pseudofilosófica: quando é mesmo que devemos descartar um disco por não preencher nossos requisitos racionais, por frustrar nosso caro padrão de qualidade, por não cumprir as exigências da fria lista de exigências de seres obcecados por música pop?  Racionalmente falando, My maudlin career é uma negação. Os escoceses repetem pela quarta (!) vez uma fórmula mofada de pop rock retrô, com acenos e beijinhos para os grupos vocais femininos dos anos 60 e o remake de um universo paralelo de romantismo e fofura onde até o Belle and Sebastian parou de tirar férias. Mas o instinto pede a palavra por uns minutos e… por favor! São poucas as bandas que defendem um refrão twee com tanta franqueza, e os fãs de Juno certamente tratarão este disco como uma intensa trilha sonora para páginas borradas de diários escritos a canetinha colorida, lembranças melancólicas da pré-adolescência e saudade melosa daquela ingenuidade antiga que foi embora num transatlântico branco e nunca mandou uma carta sequer. “Eu sou exatamente como você”, canta Tracyanne Campbell. Eu??? Eu não, violão. Racionalmente falando, claro.

Still night, still light | Au Revoir Simone | 6 | As nova-iorquinas do Au Revoir Simone podem não ter tirado a sorte de uma Annie Clark, mas o álbum que segue o bem-recebido The bird of music também flagra uma banda pronta a reconhecer fragilidades e ressaltar pontos fortes. Ufa. Elas passaram a entender, por exemplo, que os remixes dançantes sempre soaram mais relevantes que o shoegazing embaçado que entorpece o disco anterior, sonolento (agora posso assumir sem culpas: escutei duas, três vezes no máximo). Quase todas as novas faixas são remixes pré-fabricados, com longas introduções de eletrônica e versos que se repetem em ladainhas sofridas de mulheres à beira de ataque cardíaco. “Estou mudando. Espero que você venha comigo. Não sou forte sem você”, admitem em Shadows, que cabe num desfecho de Grey’s anatomy. Prefiro a chanson The last one, tão delicada que quase caiu do meu iPod e quebrou. Still night, certo. 

(a)spera | Mirah | 5 | A decepção da semana. Foi mal, Pitchfork. Sorry, cinturão indie (e vocês ainda não me convenceram de que o novo do Yeah Yeah Yeahs é uma maravilha deslumbrante por soar como os anos 80; procurem um argumento mais confiável, ok?). Tentei me perder na floresta mágica de Mirah Yom Tov Zeitlyn, mas tudo o que encontrei foi uma confraria de elfos serelepes e migalhas de pão deixadas por Joanna Newsom e Björk (aliás, se Björk começar a cobrar direitos autorais das clones, salvará a Islândia da falência econômica). Também há lugares-comuns no indie rock bem-intencionado, minha gente. Por que não? (a)spera (e note o título modorrento) começa como uma ode à sensibilidade de Nick Drake, com versos místicos e eletrônica sutil. Em Generosity, Mirah avisa que está cansada de tanto desprezo, o amor às vezes é um porre e por isso não gastará mais energia. Um coro de machos reclama: “Queremos mais. Nós queremos mais”. O desejo é, infelizmente, uma ordem: Education tenta uma teoria acadêmica para relacionamentos amorosos, The forest tem guitarras abafadas à Nick Cave, While we have the sun cria pânico nos que temem as consequências do aquecimento global e The river se estica em insuportáveis sete minutos de folk transcendental. O ápice do transe, pelo menos para o público brasileiro, é Country of the future. Repare o título. E se eu disser que Mirah tenta um sambinha bem fajuto inspirada pela atmosfera gostosa do carnival? Armadilha pra turista.

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