Dia: fevereiro 5, 2009

2 ou 3 parágrafos | Little Joy em Brasília

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littlejoy1

Na intensa correria da minha vida banal, acabei esquecendo de escrever dois ou três parágrafos sobre o show do Little Joy aqui em Brasília, que lotou sábado passado o pequeno Espaço Brasil Telecom  (e aproveito o momento para abrir um modesto puxadinho aqui do blog chamado 2 ou 3 parágrafos, dedicado a textinhos que morrem na praia).

No palco, talvez instigada pelos fãs enloquecidos do Los Hermanos, a banda reforçou a informalidade do disco: poucas vezes vi um Rodrigo Amarante tão animado. E quem esperaria encontrar um Fabrizio Moretti que, além dos elogios rasgados a Brasília, puxaria um coro de Último romance, só para provocar o vocalista (que, meio constrangido, quase se escondeu debaixo das poltronas do teatro)?

Os 50 minutos de pocket-performance funcionaram como uma espécie de contraponto para o show do Marcelo Camelo (sem querer forçar comparações, imagiiina) – despreocupado, ensolarado, uma tarde na piscina (e, nessas condições, até a voz miúda de Binki Shapiro fica simpática). Mas, apesar da vitória do Los Hermanos sobre o Strokes, o grande momento foi mesmo a cover de This time tomorrow, do Kinks. Será que o Amarante também ficou de quatro por Amantes constantes? Ponto para ele.

Quem quer ser um milionário?

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Slumdog millionaire, 2008. De Danny Boyle. Com Dev Patel, Freida Pinto e Anil Kapoor. 120min. 6/10

As resenhas sobre Quem quer ser um milionário? me vendem um filme que não encontro na tela. Quando passo o olho no Metacritic, tenho a impressão de ter entrado na sala errada. “É a primeira obra-prima globalizada do mundo”, escreveram no Wall Street Journal. Imagino os termos que eles usaram para analisar a crise econômica.

Eu não deveria estar morrendo de saudades do hype em torno de Pequena Miss Sunshine. Mas é quase o que sinto. Vamos lá, gente: o filmezinho de Danny Boyle, se não chega a passar batido feito novela de Glória Perez, não é isso tudo. E não precisamos esperar a ressaca do Oscar para constatar que a suposta homenagem do diretor de Trainspotting às superproduções de Bollywood não passa de um game show bem-intencionado, editado por um discípulo de Daniel Rezende.

As comparações com Cidade de Deus são e serão todas inevitáveis e óbvias (e, de fato, há dois ou três planos que justificam um processo por direitos autorais). Mas nem acredito que Boyle tenha embarcado para Mumbai com a intenção de compor um tratado sociológico sobre a Índia contemporânea. Trata-se de um olhar assumidamente estrangeiro e superficial para uma realidade que, quando muito, é tratada como pano de fundo para uma fábula.

A menos que, como grande parte da crítica norte-americana, você também compre o filme como um retrato mais ou menos complexo das favelas indianas (e depois não vá reclamar com os espectadores indianos que fizeram campanha contra Boyle).

Na verdade, é uma pena que o longa tenha se transformado em coqueluche de cerimônias de premiação. Cada prêmio grave e imponente (melhor diretor segundo o sindicato de cineastas de Hollywood, para ficarmos no exemplo mais revoltante) cai com o peso de um tijolo sobre os ombros de uma produção que está entre as mais modestas da filmografia de Boyle (Extermínio, por exemplo, me parece mais vibrante).

O roteiro de Simon Beaufoy, adaptação do romance de Vikas Swarup, é uma camisa de força a que Boyle se adapta confortavelmente. A trama, sobre um menino pobre que se transforma em fenômeno do Show do milhão indiano (provavelmente por determinação do destino, quase todas as perguntas revelam alguma relação com fatos que ele já viveu), é esquemática o suficiente para garantir um clima quase insuportável de suspense no clímax (mas que filme sobre game shows não provocaria? E que game show não provoca?). O mesmo vale para a ideia de sacar um flashback a cada nova pergunta disparada pelo programa de tevê – um recurso cujo efeito se esgota nos 15 primeiros minutos de filme.

A costura de gêneros (love story, thriller, filme de competição esportiva e, finalmente, musical) é tão aparente que sugere uma referência apressada a dois ou três sucessos de Bollywood. A inspiração popular nunca é assumida por completo, escancarada e apaixonadamente. Ao contrário dos arrasa-quarteirões indianos, este longa não tem nenhum momento que fuja das normas de “bom gosto” de uma típica produção ocidental de entretenimento. O grotesco, o insólito (e aí imagino uma ode de Tarantino a Bollywood, como seria mais interessante!) são limados do produto final.

A Índia, e o cinema da Índia, são tomados por Boyle como um papel de parede colorido e exótico – e talvez por isso eu tenha me lembrado tanto de A praia durante a projeção. Mas, e taí uma explicação para o sucesso do filme, desta vez o diretor adota um olhar mais afetuoso, como quem trata a viagem como um aprendizado e se diverte com a experiência da filmagem (não à toa, a indiana Loveleen Tandan, responsável pela seleção do elenco, foi promovida a codiretora durante o processo).

Agora entendo por que, toda vez que a equipe do filme ganha um prêmio, ela se surpreende descontroladamente, como se aquela fosse a consagração mais extravagante do planeta. É sim. Mas isso é Hollywood.