O curioso caso de Benjamin Button
The curious case of Benjamin Button, 2008. De David Fincher. Com Brad Pitt, Cate Blanchett e Tilda Swinton. 166min. 7/10
É isso, meus irmãos: cá estamos nós na temporada do Oscar.
E ela continua me deixando zonzo: uma adaptação de quase três horas de duração para um conto de F. Scott Fitzgerald? Conduzida por um herói que, condenado a rejuvenescer enquanto o resto do planeta envelhece, parece preso num episódio interminável de Além da imaginação? E pontuada por edificantes frases de efeito – do estilo: “nada é para sempre” e “tudo pode acontecer!” – que nos fazem lembrar dos bordões mais insistentes de Forrest Gump?
Admito que entrei no cinema desconfiadíssimo.
Só que, ufa, não estamos no fim do mundo. O melhor que tenho a dizer sobre O curioso caso de Benjamin Button é que o filme não se deslumbra com os truques da premissa e, às vezes, até se esquece dela. Apesar de ter nascido em condições incomuns, Benjamin Button se revela um homem sem tantas qualidades. É ingênuo, até apático.
Se resumíssemos a trama do filme, teríamos algo assim: Benjamin trabalha, Benjamin ama, Benjamin conhece o mundo, Benjamin sofre com a perda de pessoas queridas. Pode parecer ambicioso, mas o roteiro de Eric Roth e a direção de David Fincher demonstram um olhar bastante objetivo para a vida: as pessoas amam e morrem, os romances acabam, nada é para sempre e, na melhor das hipóteses, tudo pode acontecer!
Em algumas sequências, fica a impressão de que Roth e Fincher tratam a existência como um combinação de elementos químicos, a ser testada em laboratório. Numa delas, nos explicam que, oh!, a vida é uma sucessão de pequenos acasos (e se aproximam do tom de uma peça institucional de campanha de doação de órgãos).
Mas tratar o filme como uma espécie de releitura de Forrest Gump é um equívoco. Benjamin Button testemunha um ou outro evento importante da história da humanidade. O roteiro de Roth, porém, extrai o máximo de situações triviais (ainda que exagere na dose ao usar Twist and shout como trilha sonora para embalar o idílio do casal de protagonistas).
Os filmes se aproximam num outro ponto: lidam obsessivamente, derramadamente com o ato de narrar histórias, que também serve de eixo de Benjamin Button (a trama é desenvolvida a partir da leitura de uma longa carta-diário).
Na primeira metade do longa, o narrador cataloga situações mais ou menos corriqueiras (o primeiro beijo, o primeiro emprego), filmadas por Fincher em uma chave às vezes até introspectiva, apesar de uma encenação quase sempre rococó. O acúmulo das experiências de Benjamin – que cresce num asilo e, por isso, é obrigado a se preparar constantemente para a morte – descamba numa história de amor impossível. Só que Fincher não desce da corda-bamba, rejeita o sentimentalismo fácil e opta por investir numa love story (pseudo) filosófica na linha de Brilho eterno de uma mente sem lembranças.
Essa segunda metade salvou a minha sessão. Não tem nada de excepcional, mas é aí que os temas mais latentes do filme passam da teoria à ação: a degradação do corpo, os efeitos incontornáveis da passagem do tempo e – talvez a grande cartada do filme – o elogio a um tipo de amor incondicional que não se confunde com romantismo.
Apesar do excesso de maneirismos, o filme passa como uma máquina milimetricamente calibrada, um carro-alegórico sem um único detalhe fora de lugar – mas Fincher não deixa que tamanha exibição de técnica e eficiência soterre a matriz sentimental da narrativa.
E isso não é bobagem. Se o Oscar ficar com ele, vou achar até justo.
janeiro 17, 2009 às 3:44 am
O texto inteiro e nenhuma vez li o nome “Brad Pitt”. Um sinal?
janeiro 17, 2009 às 11:10 am
Não, Pilon, ele tá bem (eu não diria extraordinário…) e a escalação de Pitt soma alguns outros sentidos pro papel. Se vencer o Oscar, também não vou ficar incomodado.
janeiro 17, 2009 às 3:54 pm
Escrevi sobre. Pra mim funcionou como olhar um aquário. Bonito e artificial. E o final “Filtro Solar” (Pedro Bial) é tudo que eu não esperava do Fincher.
janeiro 17, 2009 às 5:28 pm
Heh, espere só pra ver Slumdog Millionaire. Tem uma seqüência de dança no final que parece celebração da própria mediocridade do filme.