Merriweather Post Pavilion | Animal Collective
Pára tudo. Sério isso? Verdade? O melhor álbum de 2009? Mas jáááááááááá?
Não estou exagerando (se bem que, ok!, esse tipo de entusiasmo é sempre um perigo). Panda Bear, o mais paparicado do trio, já afirmou que trata-se de “álbum mais bem gravado” da banda. É pouco.
Se os discos anteriores eram maravilhas psicodélicas (continuo ouvindo Feels três vezes ao dia), o novo tem o peso e a relevância de uma tardia carta de intenções, de um resumo de carreira e, simultaneamente, de um largo (e, ao mesmo tempo, coerente) passo a frente. O Animal Collective fecha o foco para enxergar longe. E isso é ouro, meus amigos.
Mesmo quem tem asco do trio (conheço uns três) deveria pensar três vezes diante de um disco com… uma capa que deixa a gente zonzo, meu deus!
Sem gozações ou complicações: é, por qualquer ângulo, de qualquer perspectiva, da cabeça aos pés, o maior álbum da banda. E tenho dito. Se eu fosse você, o aceitaria como um estranho (e duradouro) presente de Natal.
Sei que este cedezinho não deveria ter me surpreendido desta forma. Disco após disco, o Animal Collective estilhaça a própria cartilha. Contra o rótulo de “freak folk”, trocaram os violões por um trator de ruídos duros (tente ouvir Strawberry jam em volume máximo sem dar entrada na ala de emergência do hospital). Contra a simplificação de quem os associam apenas ao espírito criativo das crianças, espelharam as responsabilidades da vida adulta em versos cada vez menos inocentes. Nesse caminho torto, Merriweather deveria parecer uma outra curva acentuada. Deveria.
Mas o que espanta aqui é o rigor como eles conseguem agregar, dentro de uma mesma atmosfera, muitas das experiências que apareceram nos discos anteriores – e ainda assim soar renovados, já que acentuam as estruturas de dance music como forte sustentação para o álbum.
Desde os primeiros discos (e com mais clareza em Person pitch, de Panda Bear), o Animal Collective está mais próximo da eletrônica que do rock. Mesmo quando picotava e colava acordes de violão. Em Merriweather, esse estilo chega a um estado de graça.
Está tudo aqui, em versões que parecem até definitivas. Na primeira faixa, In the flowers, Avey Tare identifica nos movimentos de um dançarino uma experiência mística (“Se eu pudesse abandonar meu corpo por apenas uma noite”, deseja o narrador). A melodia, lentamente, vai do ambient ao caos. Eis que papai Panda Bear, mais caseiro que nunca, irrompe na linda My girls, com uma síntese para os mantras domésticos de Person pitch: “Não me preocupo com bens materiais. Tudo o que quero é um lar para minhas meninas”, repete, repete, e repete.
Tão cedo, o principal tema do álbum está na mesa: contra a rotina mecânica de um mundo sem alma, a banda encontra refúgio no transe espiritual (ou lisérgico), no conforto do lar e na formação de uma comunidade de amigos. De certa forma, eles continuam a atualizar uma antiga filosofia hippie. Mas o interessante no Animal Collective (e neste disco em especial) é como, nessa fuga, ele constrói e habita um novo espaço musical.
Daí em diante, o álbum segue numa espiral de êxtase e desconforto. “Você também está assustado?”, eles desafiam, no corinho de Also frightened. Em Daily routine, Panda Bear lista atividades do cotidiano. E a delicada No more running parece um aceno distante para No surprises, do Radiohead: e um bilhete de despedida para um planeta sem eixo.
Tão agoniado e às vezes tão suave, como eles conseguem?
E esqueci de Bluish, a canção mais acessível que eles já gravaram? E Brothersport, a canção-testamento, e com ecos de tropicália? De tão rico em camadas e intenções, Merriweather Post Pavilion (o título vem de um tradicional palco ao ar livre em Columbia onde, nos anos 70, imperava o clima de jams comunitárias) exige diferentes interpretações – e aposto que haverá muita gente disposta ao desafio. Por aqui, e por enquanto, soa como uma verdadeira, sincera adaptação da psicodelia dos anos 60 aos ares confusos do século 21.
Nada pouco para um simples álbum de rock. 2009, desculpa aí, acabou de acabar.
Oitavo álbum do Animal Collective. 11 faixas, com produção de Ben Allen. Domino Records. 9/10
PS: Amanhã viajo para passar o ano novo no Rio de Janeiro. Enquanto dou uns mergulhos, o blog fica parado até semana que vem. Vocês nem vão sentir falta que eu sei. Desejo pra vocês, e pra mim também, um 2009 de boas vibrações. E que (façam figa!) eu consiga comprar uma estante pra sala ainda no primeiro semestre. Até!
dezembro 29, 2008 às 1:18 am
Esse disco vazou no momento errado, porque eu ainda não consegui ouvir. :-(
dezembro 29, 2008 às 1:50 am
Assino embaixo, é exatamente o que eu penso. Depois de um disco fenomenal desses eu realmente não sei até onde eles podem ir (exatamente a mesma sensação que eu tive quando eu terminei de ver Inland Empire, por exemplo, haha), parece que eles chegaram ao máximo mesmo. Acho que agora eu posso dizer com firmeza que Animal Collective não é só uma das minhas bandas favoritas da atualidade como também uma banda favorita “no geral”, hehehe. :)
dezembro 29, 2008 às 2:07 am
Até eu gostei. Adorei, na verdade.
Summertime Clothes é incrível.
dezembro 29, 2008 às 12:59 pm
Nossa, Diego, até você? Mas acho que esse disco vai pegar um público maior mesmo. Mostrei o início de Bluish pra um colega meu e ele: “é MGMT?”.
Concordo, Rodrigo. Fica mesmo essa sensação de que chegaram ao máximo.
dezembro 29, 2008 às 7:03 pm
“O melhor álbum de 2009? Mas jáááááááááá?”
Bem, Drive by Truckers vazou este ano no começo de janeiro e ficou em segundo na minha e na sua lista hehe
“Mesmo quem tem asco do trio (conheço uns três)”
…
“Até eu gostei”
Porque sera que eu sabia que o Tiago estava se referindo ao Diego? hehehe
dezembro 29, 2008 às 7:58 pm
Eu vivia falando pra ele – aqui, inclusive – que nunca tinha visto graça na banda, ué.
Passei a mudar de idéia com o show, apesar dos problemas de som.
dezembro 29, 2008 às 9:01 pm
Ok, até eu (e esse é um “até eu” que realmente significa algo) vou baixar.
E Tiago, vai passar o reveillon onde aqui no Rio? Copacabana com Martnália e Revelação ou Piscinão de Ramos com Mc Leozinho e Kelly Key? hehe
janeiro 5, 2009 às 2:13 pm
Guga, passei em Angra. Renderia uns três posts, mas acho que vou deixar quieto.
Diego, essa seu interesse repentino por AC ainda me espanta.
janeiro 9, 2009 às 1:35 pm
[…] Strawberry jam em volume máximo sem dar entrada na ala de emergência do … fique por dentro clique aqui. Fonte: […]
janeiro 12, 2009 às 1:09 pm
Belo texto o seu. E numa das frases vc resumiu bem o que é esse disco, haja vista que essa é uma obra difícil de conceituar/avaliar/rotular/classificar:
‘…sincera adaptação da psicodelia dos anos 60 aos ares confusos do século 21’.
Exato. Há muitas coisas do Zombies, dos Beatles, do The Beach Boys, da psicodelia 60’s. Além disso, há muita inserção de world music, como a própria ‘Brothersport’ condena.
Eu, que nunca tinha parado para ouvir a banda com atenção e fazer um julgamento preciso, tanto que deixei passar em branco o ‘Strawberry Jam’ e até hoje tento entender melhor o ‘Feels’, o MPP veio como um bálsamo para os meus ouvidos, e passei a interpretar o quarteto com outra opinião (aconselho a outros internautas fazerem o mesmo).
E eu tentei rascunhar alguma coisa sobre o disco aqui:
http://www.outernative.net/cgi-bin/reviews_view.cgi?id=newsitemEkFEVEAAFyUfwaQVvN
Isso é, se não for chato deixar um link (uma espécie de propaganda de meu trabalho), espero que vc possa ler e deixar seus comentários tb. Já que vc é um cara culto, adorador da boa música e sensato.
Abraços e obrigado.