Dia: dezembro 8, 2008

The chemistry of common life | Fucked Up

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fukd1Uma banda de hardcore chamada Fucked Up já sai da garagem com pelo menos uma imensa promessa a cumprir: fazer justiça ao próprio nome.

Até agora, era impossível acusá-los de vender gato por lebre. Com quase 40 faixas lançadas em singles, EPs e compilações, o quinteto sem-limites já gravou canção de 17 minutos, subiu no palanque dos anarquistas, foi acusado de apologia ao fascismo e (heresia imperdoável para a seita hard) fez parcerias com Nelly Furtado e Owen Pallett (do projeto Final Fantasy).

O álbum The chemistry of common life é a provocação que faltava à gangue canadense liderada por Pink Eyes (Damian Abraham): tirar uma casquinha do império do indie rock. Lançado pela Matador Records – um dos maiores pequenos selos de que temos conhecimento -, o álbum nega a liturgia dos nichos, bagunça o coreto dos gêneros e, em alguns momentos, chega perto do pop (na fantástica Black albino bones).

Em resumo: um disco tão fraturado e paradoxal quanto sugere o nome da banda. Fucked up, sim. Existe algo mais tipicamente indie que isso?

O elo entre fúria e melodia acaba remetendo a Pixies, Hüsker Dü e Smashing Pumpkins. Mas são elementos que nem sempre se misturam numa mesma faixa: a pancada Magic word, por exemplo, é seguida pelo mantra instrumental Golden seal. A idéia de diversão, aqui, é surpreender o público (e chocar os fãs xiitas de hardcore) a cada três ou quatro minutos.

A química funciona mais ou menos como num álbum do Les Savy Fav: um riff dócil é lançado em meio a uma selva de ruídos; um vocal assobiável sobrevive à erupção barulhenta; um arranjo tosco briga com letras sobre “os mistérios do nascimento e da morte”, etc.

Nas primeiras audições, o descontrole me pareceu um pouco gratuito – e nem tão assustador ou radical quanto a banda gostaria. Mas canções como Days of last e No epiphany são pedregulhos que sustentam esse prédio torto, criado para rasgar a paisagem.

Segundo álbum do Fucked Up. 11 faixas, com produção de Jon Drew. Matador Records. 8/10

Rede de mentiras

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bodylies

Body of lies, 2008. De Ridley Scott. Com Leonardo DiCaprio, Russell Crowe, Mark Strong e Golshifteh Farahani. 128min. 4/10

Existe uma idéia nos primeiros dez ou quinze minutos de Rede de mentiras, mas o restante do filme é tão desajeitado que logo nos esquecemos dela.

De qualquer forma, é uma tese assim: há um descompasso tecnológico que emperra a caça a terroristas. Enquanto os ocidentais se deixam maravilhar e dominar por novíssimos aparelhos de comunicação e espionagem, os candidatos a homens-bomba trocam instruções de forma rudimentar, ultrapassada.

O filme lança a questão que vai além do debate sobre política internacional: até que ponto a tecnologia se faz indispensável em nossas vidas? Nos primeiros 60 ou 70 minutos da trama, os dois personagens principais (agentes secretos da CIA) contracenam à distância, via telefone celular. Mais adiante, um desses heróis (Leonardo DiCaprio)  inventa uma organização terrorista via computador.

O roteiro de William Monahan (Os infiltrados) joga com nossas contradições: o império da tecnologia não decifra nem vence o horror feito à mão. Seria interessante se essa premissa caísse no colo de um cineasta capaz de olhar o mundo de uma forma pouco pragmática. Isto é: o problema se chama Ridley Scott.

Scott , um técnico competente (mas aborrecido), empacota esse roteiro com a coloração azulada e acinzentada de um thriller de Paul Greengrass. O personagem de DiCaprio, que parecia perdido no tiroteio de informações, aos poucos se acomoda na função do herói duro-na-queda, imbatível. Um James Bond da era Daniel Craig. E Russell Crowe, ótimo porém subaproveitado, representa a burocracia engravatada, distante do “mundo real”.

A dupla enfrenta capangas do Oriente Médio que poderiam estar num filme do Indiana Jones. Será que os americanos ainda compram essa versão monocromática da história?

O mais curioso, aqui, é que o próprio filme se deixa engolir pela tecnologia. É como se um computadorzinho sabichão tivesse hipnotizado Ridley Scott. “Clique aqui para fazer um thriller de espionagem versão 1.0”, a máquina ordena. E ele obedece.