O insuportável
Deu na Folha:
Nós, disco de Camelo, beira o insuportável. O que o Los Hermanos tinha de pior – a inútil idealização de uma época que não volta mais; a melancolia auto-indulgente; letras tão idílicas que fariam João Gilberto passar por contestador; arranjos que vão na direção do samba-canção e na tradição MPBística, mas que tateiam sem chegar a lugar nenhum.
Em seguida, o colunista de música pop elogia o projeto do Rodrigo Amarante (Little Joy) pelo “clima de total descontração” e recomenda os novos do TV on the Radio e do Glasvegas como “lançamentos incontornáveis” do ano (para quem assina o jornal, o link para o texto é este aqui).
Eu acho jóia o exercício da crítica, mas diz aí: que argumentos são esses?
Na primeira frase, fica claro que o jornalista não deu trela pro álbum (“beira o insuportável”). Nas seguintes, tudo o que ele consegue é (nas palavras dele, aliás) tatear sem chegar a lugar nenhum.
Quase ninguém leva esse tipo de análise publicada em jornais diários a sério, mas vale tentar: qual seria essa época-que-não-volta-mais idealizada inutilmente pelo Los Hermanos? A bossa nova (já que ele comparou com João Gilberto)? O samba-canção? A Tropicália? O auge de Dorival Caymmi? Chico Buarque? Mas que Chico Buarque? Aliás, o que ele quer dizer por “tradição MPBística”? O que significa isso? O que entra ou não entra nesse rótulo? Seria interessante que ele identificasse esse período histórico, ou pelo menos algumas referências, já que estamos falando de momentos e às vezes de décadas diferentes.
O engraçado é que, minutos depois, o colunista libera o Amarante para caminhar pelo “reggae, pelo pop californiano dos anos 60”. Ok, o compositor tem todo o direito ao flashback que ele bem entender, mas me explica: o pop californiano dos anos 60 não seria um gênero de uma época que não volta mais? Mais adiante, ele compara TV on the Radio com Pixies e My Bloody Valentine. Também concordo. Mas, nesse caso, por que os nova-iorquinos teriam permissão de remeter tão descaradamente ao passado?
O textinho dá a impressão de que todos podem sentir saudades, menos Marcelo Camelo. Curioso que, entre todos os álbuns comentados pela coluna, o dele é o único sobre saudade. Mais que insuportável, o disco do hermano parece uma objeto esquisito que o colunista não se dá ao trabalho de decifrar. Seria mais fácil se o álbum tivesse optado por um clima de descontração. Ou, claro, matado de inveja o Noel Gallagher.
setembro 19, 2008 às 2:29 pm
Não gosto tanto do disco do Camelo, mas concordo contigo. Às vezes parece que ele usou esses argumentos rasos, super contestáveis, de propósito, só pela polêmica mesmo.
setembro 19, 2008 às 2:31 pm
Eu já tenho uma análise mais pessimista sobre tudo isso. Mas enfim. Fiquei um pouco envergonhado quando li o texto.
setembro 19, 2008 às 2:53 pm
É que não tô querendo acreditar na hipótese pessimista.
setembro 19, 2008 às 2:56 pm
Hahaha. É, pode ser um bom remédio. Mas me impressiona como os jornais, ao tentar simular o imediatismo dos blogs, acabam mais rasteiros que muita coisa que se lê na internet. Em qualquer fórum de discussão eu encontraria comentários mais interessantes e menos preconceituosos sobre o disco do Camelo.
setembro 19, 2008 às 7:12 pm
Nossa, em que fórum? Me apresenta ae.
setembro 19, 2008 às 7:50 pm
crítica = opinião pessoal.
foi o alvaro, aposto.
setembro 20, 2008 às 1:06 am
Até no MySpace do Camelo dá pra encontrar, Diego.
setembro 20, 2008 às 3:13 pm
Realmente, terrivel. E falo isso como quem tem certeza que o disco do Glasvegas vai tocar aqui em casa com bem mais frequencia do que o Camelo.
setembro 20, 2008 às 10:21 pm
Mas Glasvegas é bacana. Apesar dos “here-here-here we fucking gooo!”
setembro 21, 2008 às 1:52 pm
bem, ainda não ouvi o disco do camelo. de qualquer forma, achei infundada a maneira como o colunista tentou dispor seus argumentos. vou ouvir os discos e depois volto aqui! rs Ando tão ‘out’ nem sabia que amarante e camelo estavam com discos prontos cada um.
Até mais!
setembro 26, 2008 às 2:20 am
Tenho a impressão de que um simples “Não gostei porque sim” do colunista soaria mais consistente do que esse amontoado de (pseudo-)argumentos rasteiros.
Ainda não escutei “Sou/Nós” por inteiro. Por enquanto só conheço as músicas que foram disponibilizadas na net antes do lançamento do cd. Espero comprá-lo logo logo. Do que ouvi estou gostando muito. Como você sugere no outro post, de fato são músicas com personalidade, coisa nem sempre fácil de se encontrar, e bem brasileiras mesmo com tantas influências musicais diferentes.
Como deu pra perceber pelo que está disponível na internet, são caminhos distintos, o de Camelo e Amarante. Por isso, acho que comparações, neste caso, dificilmente levam a algum lugar.
Quanto ao Little Joy, que venha um trabalho bom também. Quem ganha somos nós, certo?
Abraço.