Dia: setembro 10, 2008

Dear science | TV on the Radio

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Se os álbuns do TV on the Radio são contos de fadas doentios, então Dear science é o capítulo em que Alice, depois de quase se afogar nas próprias lágrimas, encontra uma forma de nadar até a terra.

Nas histórias narradas pela banda, ainda existe raiva e amargura. Desta vez, porém, eles tentam encontrar uma estratégia sublime para sobreviver ao caos.

Mas é apenas uma tentativa. Eu, que já ouvi o disco umas dez vezes, ainda não consigo encontrar nele uma obra-prima. E desisti de tentar. Se existe uma marca nesta banda – e por isso trata-se de uma espécie de mascote da crítica -, ela está na forma como ela transforma cada disco num laboratório de idéias, numa lista de possibilidades, num bloco frenético de anotações que talvez não dê em nada. O processo, para o TV on the Radio, conta mais que o resultado.

Por isso, são álbuns incompletos. Lembro da minha decepção com a segunda metade de Return to cookie mountain, que simplesmente não parecia conversar com o início do disco. Era como se as primeiras faixas, grandiosas e redondinhas, aos poucos se desintegrassem em ácido. Em Dear science, o procedimento se repete: novamente, fico com a impressão de que Tunde Adebimpe e Dave Sitek começaram o álbum sem saber como o terminariam.

E isso só será um problema se você quiser assim.

Os álbuns do TV on the Radio não soam coesos. Não soam comedidos. Não soam econômicos. Em compensação, convidam o ouvinte para abandonar os preconceitos e ser carregado por uma aventura. Esse desejo exploratório move Dear science. Daí a idéia que existe por trás do título do disco, uma carta endereçada à ciência com uma defesa dos instintos, de tudo o que não pode ser explicado racionalmente. Para nossa sorte, a banda ainda se move ao sabor da vontade de juntar um ruído com outro, uma melodia ruidosa com um verso delicado, uma referência de Michael Jackson com outra de David Bowie.

Pode parecer um clichê, mas poucas são as outras bandas de rock que colocam em prática a idéia de um laboratório pop (muitas também tentam, mas ao tentar se afastam do pop, caso do Animal Collective). Nem o próprio Bowie, que desenhava racionalmente o conceito dos próprios álbuns, operava nessa freqüência.

Não é um método tranqüilo. Existe um conflito no TV on the Radio que finalmente se faz explícito em Dear science. Para a banda, o maior desafio é se dedicar a um rock percussivo e psicodélico sem se deixar soterrar pelas camadas de efeitos arquitetadas por Dave Sitek – que, quando solto de amarras, ornamentou um bolo de noiva para Scarlett Johansson. É como se, para cada novo ingrediente adicionado ao som da banda, um outro tivesse que ser limado para evitar indigestão.

É essa busca por um equilíbrio possível (mas nada cômodo) que faz de Dear science o disco mais arriscado deles até agora. E talvez o melhor. Apesar de não apresentar canções tão imediatas ou memoráveis quanto as de Return to cookie mountain (não tem outra Wolf like me nem outra Province), o álbum joga o tempo todo com contrastes que, para a banda, sempre foram essenciais. De um lado, o transe de Halfway home (que, no refrão, lembra o clima desiludido do Radiohead de Ok computer) e de Crying. De outro, canções introspectivas e belíssimas como Family tree e Love dog, que chegam a lembrar os também nova-iorquinos do The National.

Aqui o TV on the Radio tenta de tudo – do afro-punk de Red dress ao drum ‘n’ bass, no finalzinho de Shout me out -, mas de forma a travar um diálogo cada vez mais direto com o público. Todo o início de Shout me out, por exemplo, poderia servir de trilha para seriado de tevê. Já Dancing choose é rock paranóico que parece mandar um aceno para o R.E.M. de It’s the end of the world as we know it. Golden age reforça as influências de soul music, mas é como se esse elemento merecesse finalmente espaço para sair da sombra de um paredão sonoro e se destacar.

Esse flerte com a delicadeza aparece também em letras como as de Lover’s day, que soa como uma confissão íntima dividida com o público. “Vou levar você para casa”, promete Tunde. É, não à toa, a última frase de um disco que começa a meio-caminho do lar. Depois de uma viagem cansativa por caminhos extraordinários, o TV on the Radio descansa a cabeça no travesseiro. O destino da próxima aventura? Aposto que até eles fazem questão de desconhecer.

Terceiro álbum do TV on the Radio. 11 faixas, com produção de Dave Sitek. 4AD/Interscope. ****

Ainda Kings of Leon

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I just had this melody and I didn’t know what to say. Then one day I just sang ‘this sex is on fire’ and I laughed. I thought it was terrible, but the rest of the band were like: ‘it’s good, it’s got a hook’. I was like: ‘fuck off!’, but I ended up writing it

Então tá. Caleb Followill cometeu o crime chamado Sex on fire, mas a culpa não foi exatamente dele. Entendi. Agora só falta explicar quem teve a idéia do clipe vagabundo.

Mamma mia!

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Mamma mia!, 2008. De Phyllida Lloyd. Com Meryl Streep, Pierce Brosnan e Colin Firth. 108min. *

Este filme foi feito para um público muito específico: os fãs do ABBA. Não faço parte dessa seita. Foi mal. Um abraço.

(…)

Agora, sem entrar em méritos de qualidade musical, importância para o mundo pop, valor kitsch, intensidade de gostosura ou o raio que o parta: existe todo um novo conceito de caça-níquel nessa mania dos musicais inspirados em canções conhecidíssimas e batidíssimas. Não existe? Tipo: você cai de amores por um filme que costura umas 50 músicas dos Beatles? E verte lágrimas por um hit perdido do Elton John interpretado pelo Ewan McGregor? Uma galera adora. Fico incomodado só de imaginar Like a virgin – The musical e em We are the champions – The movie, ou em I still haven’t found what I’m looking for – esse último, com direção de Neil Jordan.

Não há limites para a picaretagem? Em Mamma mia!, astros tarimbados como Meryl Streep e Pierce Brosnan interpretam hits como Gimme! Gimme! Gimme!, Honey, honey, Money, money, money e I do, I do, I do, I do, I do. Ok, há quem goste. Ok, há um (argh) valor kitsch nessa presepada. Mas não é nada que vá além da importância de um DVD de greatest hits.

Para quem só conhece os suecos graças a Dancing queen, o filme faz o favor de reativar um debate antigo e polêmico: tudo bem que os hits da disco music sobrevivem a tudo, mas o que dizer das baladas do ABBA? Elas merecem algum crédito? Algum apreço? Alguma consideração? Tudo o que encontrei na cena em que Meryl Streep interpreta The winner takes it all foi um arremedo de Celine Dion. “Mas a música tem toda uma importância dentro do contexto da banda”, argumentou uma fã indignada. Tá, tudo bem, fã é fã, pode ser até que a música tenha lá alguma graça, mas é uma interpretação que arrepia de pânico até os cabelos da minha bunda. E aquela câmera lenta, cacilda?

Se a idéia era ressaltar o potencial kitsch das canções, por que um visual tão genérico, tão padrão-Disney? Por que esse clima de aniversário de criança de nove anos de idade? Perto dos delírios de um Moulin rouge ou de Priscilla, a rainha do deserto, Mamma mia! parece ainda trancado no armário, com medinho de vomitar purpurina e gloss na multidão. Eu prefiro o Hairspray. Do John Waters.

(…)

E quando filmarem os hits do Roxette? Medo.