Dia: setembro 2, 2008

DON’T STOP | Annie

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Estressado com a infernal venda de ingressos pro show da Madonna? Tente Annie. É sticky and sweet. E sem a megaestrutura, o megamarketing e os megaproblemas das megacelebridades.

A norueguesa faz pop que derrete no calor. Alguns a chamam da “Kylie Minogue dos indies”. E aí, bateu medinho?

Loura, debochada e com amigos que sacam tudo de dance music, a musa européia foi adotada por blogs graças a Anniemal, de 2004. O álbum, que entrou na lista de melhores do ano da Pitchfork, era uma espécie de Cansei de Ser Sexy embalado em fita cor-de-rosa. Na Noruega, dizem, fazer pop ensopado de glacê não dá ressaca moral.

No segundo capítulo deste conto de fadas, Annie sai em busca do primeiro hit um pouco amedrontada com o fato de que talvez decepcione a torcida virtual. Como eu e você não temos nada a ver com isso (e sério, se a gente desse trela para todos os singles suecos tratados como obra-prima por sites descolados, estaria aqui babando sorvete de morango), não seremos crucificados se consumirmos este álbum com moderação.

Depois de assinar com uma grande gravadora, Annie faz o que todo mundo esperava dela: mais hits açucarados (parte brigadeiro, parte olho-de-sogra aguado) com refrãos de chiclete e letras rebeldezinhas no esquema “eu sei que sua namorada me odeia” (I know UR girfriend hates me) e “meu beijo é melhor que o seu beijo” (My love is better, com guitarras de Alex Kapranos) e “eu não te amo, mas quero te levar para casa” (Take you home).

Para não afastar os que se enjoaram de Timbaland, Annie investe num electro fofo que às vezes lembra o lado mais romântico do pop francês, à Daft Punk e Air. Heaven and hell é uma farra de teclados melancólicos. E Marie Cherie sugere climões de trip hop. When the night é a balada do Cardigans que o resenhista da Pitchfork nunca teria coragem de gostar (e a letra, como nas baladas do Cardigans, também é mais assustadora do que parece). E Sweet é, aviso, bastante sweet.

É um álbum pop divertido (mas irregular) que, se tudo funcionar à serviço de Annie, será superestimado em todo canto. É o som de um verão que talvez já tenha passado, mas quem se importa? Se Madonna decidir gravar um disco com produtores noruegueses, o resultado será exatamente este. Give it 2 me.

Segundo álbum de Annie. 12 faixas, com produção de Annie, Richard X, Timo Kaukolampi e Xenomania. Island Records. **

Atualização: Depois de ter quebrado a cabeça tentando (e não conseguindo) comprar os ingressos pro tal show, desejei ter nascido na Noruega. Isso que eu chamo de hard candy, meu irmão.

HELLBOY II: O EXÉRCITO DOURADO

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Hellboy II: the golden army, 2008. De Guillermo del Toro. Com Ron Perlman, Selma Blair e Doug Jones. 120min. ***

Guillermo del Toro vê beleza no que é estranho.

Uma das grandes seqüências de Hellboy 2 trata exatamente disso: nela, nosso herói monstruoso – vermelho, tosco, louco por doces e tevê – enfrenta um gigantesco deus da floresta. Depois de escalar a fachada de um hotel (com um bebezinho no colo!), ele mata o vilão. Em vez de um desfecho triunfante para o duelo, com o típico jorro de alegria vingativa, a criatura morta se abre numa exótica flor verde, que se desmancha numa bela chuva de pétalas. A trilha sonora chega em tom menor – o som não é de vitória, mas de melancolia mesmo.

Em outra cena, essa mais cômica, o vermelhão freak divide uma cerveja com um monstrengo azul-piscina. Juntos, eles choram as pitangas de relações amorosas mal-resolvidas ao som de uma canção pop romântica. I can’t smile without you. “Eu daria minha vida por ela”, confessa o super-herói bebum. “Mas ela também quer que eu lave a louça.”

Eis o conflito.

Mas é apenas um entre tantos conflitos de Hellboy 2, um filme de ação que Guillermo del Toro dirigiu e escreveu talvez para nos provar que é possível pagar as contas e, no meio-tempo, fazer um tipo bastante pessoal de cinema de entretenimento.

Na primeira hora de duração, a trama parece mera desculpa para que o diretor desenhe as criaturas extraordinárias de sempre. Da metade em diante, o longa assume uma dimensão épica que poderia ter arruinado o playground. Mas não. Del Toro banca o espírito nerd de uma história que se empenha em construir toda uma mitologia em torno de Hellboy – o arruaceiro ganha até mesmo uma perspectiva sombria de futuro que envolve o destino da humanidade.

E aí toca Beautiful freak, do Eels (apelação!).

Muito esparramado no próprio universo, del Toro não se envergonha dessa guinada da trama. Trata o filme com um tipo destemido e desvairado de fantasia, raro no gênero. Taí uma continuação que avança em território desconhecido e prega peças em quem esperava dela apenas mais um capítulo de franquia. O cineasta está brincando, se divertindo, testando uma nova linha de monstrengos – Hellboy 2 não é, não quer ser O labirinto do fauno. Mas del Toro brincando vale (ah sim, vale) por um batalhão de cineastas tão sérios.