Dia: julho 2, 2008

‘Modern guilt’ Beck ***

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Demorou seis anos, mas chegamos lá: Beck Hansen espanou a poeira e finalmente conseguiu gravar um sucessor digno de Sea change. Modern guilt é um álbum à altura de uma carreira que, de 2002 para cá, parecia ter perdido o foco. Estou tão espantado quanto vocês.

O tempo é mesmo cruel: Guero (2005) e The information (2006), hoje fica mais claro, são projetos embaçados que, no máximo, ilustram um período de incertezas para o compositor. O primeiro, uma tentativa desesperada de retomar as colagens sonoras de Odelay (1996). O segundo, obra de transição, apontava uma série de caminhos para um futuro que, enfim, chegou.

O que aproxima discos como Odelay, Midnite vultures, Mutations e Sea change é o rigor com que Beck decide o que, como e com quem vai gravar. São álbuns que, mesmo nos momentos mais confessionais (caso de Sea change) parecem organizados com o distancimento de um curador que seleciona as peças para uma determinada exposição de arte. Pois bem: Modern guilt pertence a essa linhagem. Pop com conceito, à prova de incoerências.

Na discografia de Beck, é o álbum mais enxuto, compacto, e soa como que comprimido numa sala pequena. Tem pouco mais de 30 minutos de duração. Curiosamente (e, em matéria de detalhes irônicos, eis um ídolo que não nos decepciona), este também é um “álbum psicodélico”, que abre com efeitos à Tomorrow never knows (dos Beatles), embarca em viagens floydianas (Chemtrails vai às raias da lisergia) e parece ter sido composto depois de uma overdose de garage rock sessentista. Os versos – Bob Dylan on acid – sugerem imagens surreais, fantasmas, barcos que afundam e casais siderados. “Não sei o que vi. Era tudo uma ilusão?”, ele pergunta, em Volcano.

Não menos importante que tudo isso, Beck investe numa sinfonia em duo com o produtor Danger Mouse. O compositor mais uma vez se reinventa com a ajuda explícita de produtores. Depois de Nigel Godrich e do Dust Brothers, parece ter encontrado um novo parceiro com quem dialogar. São dois homens apaixonados por estúdios. Não ouviremos um álbum tão bem gravado em 2008: Modern guilt parece se emocionar com a tecnologia, que se assume como uma guloseima digital (e até os trechos mais introspectivos como Replica, que remete ao Radiohead de In rainbows, exibem esse prazer do processo de gravação).

Em Danger Mouse, Beck identifica um cúmplice. Para que cada um siga em frente, a parceria terá que ser desfeita – mais cedo ou mais tarde. Mas, como retrato de um feliz encontro de dois perfeccionistas, Modern guilt se sustenta e se impõe (mesmo que sem canções tão inspiradas quanto as de Mutations e Sea change). Ao contrário dos álbuns recentes do músico, este aqui muito possivelmente não será engolido pelo furacão de informações. Não precisaremos ser bonzinhos: é ótimo.

Na Paisá

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Na atualização das resenhas de música da Paisá tem um textinho meu sobre o novo do My Morning Jacket. Mas o destaque mesmo da edição é o textão do Filipe sobre Lil’ Wayne & Coldplay. Apesar de fazer algumas ressalvas à premissa dessa comparação entre os dois discos (no hip hop, quase todo mundo tenta injetar excentricidades no mainstream – isso é praticamente regra), eles realmente acabam se parecendo bastante em vários sentidos. Aliás, um dos álbuns que mais escuto no momento é o do Coldplay (e não o do Lil’ Wayne, por incrível que pareça). Apesar de ouvi-lo com aquela cara emburrada e a falta de paciência de quem está sempre prestes a jogar o iPod da ponte.