Dia: maio 27, 2008
‘Stay positive’ The Hold Steady ****
Entenda o título deste belo, belo álbum como uma grande ironia.
É que, aqui, nada vai bem. Boys and girls in America (o outro disco quatro-estrelas do Hold Steady, quem não ouviu é mulher do padre) era sobre a juventude despedaçada, que bebe muito e dorme tarde. Este Stay positive narra o capítulo seguinte: a festa termina, os remédios não fazem mais efeito, a idade começa a pesar, os sonhos de adolescente evaporam e torna-se inevitável conviver com um batalhão de fantasmas. É um álbum difuso, menos controlado que o anterior e, por isso, menos convidativo. Até a galeria de personagens que costumavam habitar as canções de Craig Finn agora se escondem nas sombras, se perdem no matagal, não ousam revelar nomes.
Nesse contexto, a frase “stay positive” não deve ser interpretada como grito eufórico de guerra ou como filosofia reggae-power – é lema de desesperados, slogan para encontros de ex-dependentes químicos e conselho para gente em perigo (“Meus amigos que não morreram estão quase lá”, avisa a faixa de abertura, também ironicamente intitulada Constructive summer). O quarto trabalho do Hold Steady joga com opostos: as melodias às vezes se inspiram até em power pop (Navy sheets, aliás, poderia estar num álbum do Weezer ou do Fountains of Wayne) e os arranjos se adaptam alegremente a instrumentos pouco convencionais (em One for the cutters, há até cravo, à Joanna Newsom). Mas esse rock setentista e festivo embala tramas duras, de desilusão – não há mais leveza neste retrato da vida interiorana, de rotinas sem-futuro.
É por essas e outras que o Hold Steady continua uma banda de versos, de poesia. As letras são quase tudo. Só depois nos preocuparemos com melodias e ao trabalho de produção (este álbum tenta alguns caminhos novos para o quinteto, mas ainda soa no máximo como um disco do Bruce Springsteen). Não teria como ser diferente. Finn é um dos melhores letristas desta geração (talvez o melhor), com talento gigantesco para desenhar climas e descrever personagens. Em Lord I’m discouraged, ele assume com convicção o papel do homem que não tem mais forças para cuidar da mulher que ama (e escrever com sutileza sobre abuso de drogas é uma das tarefas mais difíceis no rock). Já One for the cutters é praticamente um conto policial dirigido por Gus Van Sant, com mortos na floresta e interrogatório na delegacia. Algo, no mínimo, raro de se ouvir.
Se não tem hinos perfeitos como Stuck between stations, este é um álbum que faz perfeito sentido na trajetória do Hold Steady. Poderia muito bem fechar um arco narrativo, uma saga em tom menor. “Nós fazemos nossos próprios filmes”, avisa a faixa de encerramento, Slapped actress. Sobem os créditos, mas a vida continua.