Dia: abril 14, 2008
‘Takes’ Adem **
O álbum é irregular e o intérprete não se destaca numa multidão de machos sensíveis. Mas aposto que este Takes acabará se transformando num disquinho cult. Por um motivo: ele mexe com as lembranças de um público que consumiu toneladas de rock durante os anos 90. Eu e você. E alguns de nós.
Não é um álbum de covers convencional como, digamos, o da Cat Power. Ou como a maior parte dos álbuns de covers. Ele carrega a sensibilidade de uma época em que a internet expandiu consideravelmente o repertório do fã de rock. É, por isso, um disco com escolhas muito pessoais e, ao mesmo tempo, tangível ao público que devorava com ansiedade tudo o que lia em sites e revistas especializadas.
O inglês Adem Ilhem sabe que pode, no nosso curto-circuito de playlists, gravar um diário universal. Com canções lançadas entre 1991 e 2001, Takes se apropria de anti-hits do Yo La Tengo (Tears are in your eyes, da fase mais melancólica e delicada do trio), do Smashing Pumpkins (Starla, lado B de single), da PJ Harvey (Oh my lover, de Dry), da Björk (Unrevel) e até do Pinback (Loro, do álbum homônimo).
O músico converte essas e outras faixas num folk esquelético, caseiro, prestes a cair no chão e quebrar. Os arranjos mal se diferenciam uns dos outros, e criam uma massa sonora às vezes entediante. Mas, para um sujeito que arrisca interpretar ao violão faixas de Aphex Twin e Tortoise, as surpresas são inevitáveis. Minha preferida é a adaptação alegre de Invisible man, do Breeders, escondida lá no fim do álbum. Quem tem mais de 25 anos e menos de 30 vai se emocionar terrivelmente. Mesmo conscientes de que o disco não mereça tanta lágrima.
Uma chamada perdida °
Havia uma solução bem prática para este filme: chamar o Takashi Miike, que dirige uns cinco filmes por semana e não se incomodaria em fazer um remake em inglês do One missed call, que ele lançou em 2003. O original era uma das criaturas menos inspiradas do diretor, mas ainda assim a refilmagem teria saído melhor que esta versão higienizada e sem parafusos soltos, cortesia do francês Eric Valette.
Como nos filmes mais vagabundos do repertório de Miike, aquele também usa uma idéia juvenil e absurda (e se um espírito usasse o telefone celular como forma de transitar pelo planeta?) para criar um conceito visual que às vezes soa genial de tão delirante, às vezes resvala no trash deslavado e tolo. De qualquer forma, havia conceito. O diretor deste Uma chamada perdida não tem esse tipo de dor-de-cabeça. Ele vai lá e filma, sem pensar no que está fazendo. Como se estivesse gravando um espisódio de C.S.I. Miami.
E ainda vai ter gente elogiando. Um filme de terror tão limpo, sem aquela violência grotesca, dirão. Mas aí entra a importância de um Miike para nossas vidas. Ele sabe filmar o grotesco. Ele sabe ir às últimas conseqüências, ao fundo da lata de lixo. Os americanos querem fazer horror japonês sem entender essa arte do excesso. Aí dá no que dá: mais um filme sobre fantasminhas acinzentados com bochechas trincadas.