Dia: abril 7, 2008

‘Songs in A&E’ Spiritualized **

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sapiritualizedcapinha.jpgO que você fazia em junho de 1997? Todas as segundas e quartas, eu ia ao curso de inglês. Mochila verde da Company e um relógio com um adesivo transparente de Bart Simpson. Cerca de dois meses depois, eu seria assaltado no terreno baldio perto da minha quadra. Levariam o relógio com a mochila e duas notas de R$ 5 que estavam dobradas no bolso da minha calça Levi’s. Lembro que o assaltante ficou indignado com a condição financeira do rapaz. “Só isso?”, ele quis saber. Era tudo. Triste ter 17 anos de idade.

Mas, então: o que você fazia em junho de 1997? Numa tarde de segunda, eu lia o exemplar mais recente da New Musical Express, que chegava quentinho na biblioteca do curso (na época, não existia a versão online). Lembro bem. Quando só se falava em Ok computer, o semanário fez uma ressalva importante: “este mês, não sai apenas um melhor disco do ano, mas dois”. Eles estavam se referindo a Ladies and gentlemen we are floating in space, do Spiritualized.

Com o tempo, a comparação passou a parecer um tanto infeliz. Enquanto o álbum do Radiohead subiu à estratosfera da música pop, o do Spiritualized se contenta com um forte culto indie. Não estourou nenhum hit fora da Inglaterra, mas ainda se sustenta como uma resposta lisérgica, paranóica, ao rock psicodélico dos anos 60. É Pet sounds filtrado pelo olhar de um fã de Velvet Underground. Jason Pierce, o nome do astronauta.

O belíssimo disco, de certa forma, pesou contra o Spiritualized. Enquanto o Radiohead avançou, os concorrentes deram passos para trás. Primeiro, tentaram repetir a fórmula (no bem decente Let it come down, de 2001). Depois investiram num gospel desengonçado, e acabaram soando como um The Verve com mais neurônios (Amazing grace). Este Songs in A&E é anunciado como um “retorno à forma”. É melhor que Amazing grace. Mas sejamos sensatos: se retornar à forma significa compor um álbum tão poderoso quanto Ladies and gentlemen, então Pierce ainda tomar muito energético.

O disco, de certa forma, força a comparação com o álbum de 1997. O desenho da capa é parecido, vocês notarão. Mais que isso, trata-se de um outro “álbum de catarse”, que retrata o período em que Pierce enfrentou uma crise violenta de pneumonia. Toda a primeira parte do disco encara didaticamente essa fadiga. Com climas de velório encenado por Nick Cave, Death take your fiddle é literal. Logo depois, o compositor nos avisa que não se rendeu. Também literalmente. “Baby, nunca diga nunca, tenho um furacão dentro das minhas veias e quero ficar aqui para sempre”, canta, em Soul on fire. Também literalmente.

É uma ressurreição sem sutilezas. A poesia é direta, quase banal. E as melodias, escoradas em violões e cordas, são mais ou menos o que o Primal Scream tenta quando quer compor canções “com alma”. A psicodelia espiritual de Pierce ainda parece travada, simplória. “Há uma velha chama que ainda queima no meu coração”, ele diz, em Sitting on fire. Sério? Uma chama no coração? Mas isso não soa como lado B de Oasis? Ou single do Coldplay?

Felizmente, esse é o primeiro ato do disco. Em um segundo momento, Pierce investe em rock garageiro, lo-fi, e se sai razoavelmente bem. Yeah yeah tem um quê de rockabilly e vocais que puxam para um Bob Dylan endiabrado. No saldo, porém, é um trecho que passará quase em branco. Já que, na terceira fase do jogo, a banda mergulha numa apoteose neo-progressiva que se assemelha às viagens insólitas de um Mercury Rev. Canções como The waves crash in são as melhores do álbum. E as que mais lembram o transe dolorido de Ladies and gentlemen.

Se bem que, no caso, tudo parece a simulação de um passado que Pierce não consegue recriar. Como se o mundo tivesse acabado em junho de 1997, e agora só restasse o buraco no espaço.

PS: Sei que a gente perde o controle sobre essas coisas, mas um site bem bacana chamado Stereopark transcreveu um trecho do meu comentário sobre o disco do Jamie Lidell e, sabe?, ficou bonito na página. Descobri graças às estatísticas do meu blog. Façam a gentileza de visitá-los, ok?

Ainda Portishead

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The degraded signal – whether visual or audio – is interesting. That limited frequency is so much more interesting to your brain. If you take a Sting record that would have been made in some incredible studio with amazing guitar, beautifully recorded with old vintage gear. Well, we’ve got old vintage gear as well. You can make it sound like that. But it’s just not interesting to hear at all. You’ve got to limit all that stuff.

Portishead em entrevista na Pitchfork. Eles ainda falam sobre as trilhas dos filmes de John Carpenter, Madlib e Filhos da esperança (que, segundo Geoff Barrow, é “muito bom, apesar da batalha boba no final”, e eu concordo com ele).

Irina Palm *

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Não sei se acontece também no Rio e em São Paulo, mas este filme mediano (que passou em branco no Mostra de SP e no próprio FicBrasília) está virando um pequeno hit aqui em Brasília, com sessões cheias e falatório nas bombonières. E isso na esteira de A culpa é do Fidel, outro sucesso espontâneo nos multiplexes “alternativos” da capital. A cidade tem todo um histórico de fenômenos decepcionantes do circuitinho, vide Um lugar na platéia e Elsa & Fred. Se seguir essa lógica, este aqui ficará semanas e mais semanas em cartaz.

O que atrai tanta gente? Acho que é a premissa. Premissa é a alma do negócio, não é? A deste filme diz o seguinte: “para pagar o tratamento médico do neto, mulher de meia idade aceita o trabalho em uma casa noturna, onde, por um buraco na parede, masturba londrinos solitários”. É uma situação inusitada. O público sabe que, num determinado momento da trama, a “viúva punheteira” (é assim que ela se define) será desmascarada. E desconfia que a mulher se transformará num sucesso com os homens da cidade. E que a vizinhança conservadora acabará se voltando contra ela. O filme não dribla o script, e contra isso os atores não podem fazer nada. O roteiro submete os personagens aos destinos mais previsíveis, como se essa gente existisse para cumprir nossas expectativas.

Há uma grande parte do público que, parece, gosta é disso mesmo.