Dia: janeiro 30, 2008

Onde os fracos não têm vez ****

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O Oeste está tomado por traficantes de drogas e assassinos implacáveis. O velho xerife olha para esse nosso mundo caótico e não encontra solução. “Os crimes que vemos hoje são difíceis de compreender”, conclui.

Mais tarde, ele avisa: “A idade simplifica os homens”. O filme é prova de que sim, simplifica, mas às vezes para o bem. Este é o melhor trabalho dos irmãos Coen, e quem diz isso é uma putinha de Fargo e Barton Fink.

Como eles conseguiram? Difícil explicar, mas vou tentar (e tentar sob o impacto provocado pelo filme é, no mínimo, um malabarismo à Cirque du Soleil). Quando optaram por uma adaptação ao pé da letra do romance de Cormac McCarthy, os Coen fizeram uma opção corajosa. Tal como o filme, o livro começa como uma peça de gênero e aos poucos abandona todas as convenções para se perder com os personagens. Seguida à risca, a proposta do livro praticamente obriga os cineastas a explorar em profundidade o humanismo sombrio de Fargo. O que é bom para todo mundo.

O filme, um western moderno, lamenta o ocaso do Oeste. O narrador, deslocado nesse ambiente, poderia ser um colega de Clint Eastwood em Os imperdoáveis. Ele simplesmente desistiu de tentar entender de onde vem essa nova onda violência, que anda em picapes de traficantes de drogas. O mal é personificado no serial killer vivido por Javier Bardem (melhor atuação de 2007, sem concorrentes próximos) – não é à toa que a composição over do personagem (é o demônio com cabelo escovado) destoe da encenação sóbria e silenciosa do filme. Entre o herói e o vilão, existe o espectador, representado pelo “homem comum” vivido Josh Brolin.

De início, os Coen fazem o de sempre: brincam com gêneros, experimentam com humor negro, jogam com uma trama de perseguição. Aos poucos, implodem essas fórmulas e derrubam nossas expectativas. Em um determinado momento, o xerife melancólico se assusta quando o parceiro ri de notícias trágicas. Mais adiante, os Coen suprimem o clímax do filme, transformado em uma elipse construída (como na literatura) apenas na imaginação do espectador. O terço final da narrativa, quando todas as certezas deixam de fazer sentido, é um dos meus momentos favoritos do cinema norte-americano recente.

Lá quase no fim, o assassino joga uma moeda para decidir o destino de uma vítima. A vítima tenta argumentar, e os dois descambam em um debate sobre o acaso e livre-arbítrio. Depois da conversa, o destino entra em ação. Os Coen poderiam ter parado aí, nessa conclusão simétrica, à conto de fadas. A forma como encerram o filme, porém, é bem outra. Daquelas que tiram o sono.