Dia: janeiro 19, 2008

Paranoid park ***

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Revi Paranoid park como quem retorna a uma canção que ouviu apenas uma vez. Como quem tenta, numa segunda audição, criar intimidade com a melodia, a harmonia o refrão. Azar o meu: não foi ontem à noite que consegui contato imediato com esta nova faixa de Gus Van Sant.

O pior é que sou daqueles sujeitos que não se cansariam de, por horas a fio, cantarolar os acordes de Elefante e Last days, que eu jogaria no repeat do meu aparelho de DVD todas as manhãs. Por isso me surpreendo com a dificuldade que tenho para cair de amores por este filme aqui. Fico até constrangido toda vez que ouço alguém dizer que, enfim, Van Sant teria voltado a um discurso mais acessível, mais afetuoso. Acessível para quem? Para mim, parece uma esfinge.

Fiz questão de revê-lo no cinema (e, infelizmente, em exibição digital), na esperança de ser soterrado pela experiência em surround. Nada. Ou quase nada. Sim, consegui admirar o filme como quem admira, digamos, o álbum do Panda Bear. Beleza que está ali, entendo, mas não consigo alcançá-la. Pelo menos desta vez percebi, finalmente, que, se a trinca Gerry-Elefante-Last days divide um mesmo quarto, este longa habita um cômodo diferente. Fez-se mais clara, por exemplo, como a encenação está mais aberta ao imprevisto – este é um filme que oscila maravilhosamente entre a videoarte, o videoclipe experimental e o cinema narrativo. Com aquela trilha sonora de zumbidos mínimos e melancólicos, as cenas borradas de skatistas em slow motion poderiam estar numa galeria de arte contemporânea. Ninguém reclamaria.

O que acontece, então? Talvez, para mim, o arco dramático do filme ainda pareça um tanto simplório (mesmo que Van Sant faça o possível e o impossível para desviar nossa atenção de uma trama sobre crime e castigo, Dostoiévski em remix dubstep) e a câmera ande em círculos ao redor do protagonista, sem arriscar o abraço. O cineasta ainda trata a adolescência como um grande mistério (e aqui voltamos a Elefante, que lida com essa crise de modo mais explícito), mas agora o distanciamento me soa assumidamente mais improvisado, mais torto – um rascunho de canção, uma fascinante fita-demo.

Algo está errado, porém. E não sei ainda o que é.